DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA NAS SUAS RELAÇÕES COM A INSTRUCÇÃO PUBLICA PORTUGUEZA POR THEOPHILO BRAGA il TOMO IV 1801 a 1872 LISBOA QUARTA ÉPOCA (SECULO XIX) A TRANSIÇÃO POLITICA DAS CARTAS CAPITULO I A crise politica e pedagogica do seculo XIX O seculo actual é um prolongamento do seculo xviii emquanto á perturbação re volucionaria.- As guerras napoleonicas desviam a Revolução da sua phase reorganisadora.- Prevalecimento da Dictadura militar e sua influencia sobre a constituição dos dois Poderes. - A Universidade de França perde a súa autonomia tradicional, mas concentra em si o monopolio exclusivo da Instrucção publica. Os typos das Escholas Polytechnica e Normal da Convenção franceza definem a phase moderna da organisação do ensino na Europa.—Na reacção contra as invasões napoleonicas as Monarchias absolutas transigem com a liberdade pela outorga de Cartas constitucionaes.--Retrocesso determinado pela Santa Alliança.- Versatilidade politica por falta de uma verdadeira doutrina.— Inanidade pedantocratica : Ideologismo politico de Jornalistas, Advogados e Deputados.- A primeira necessidade do nosso tempo é a reorganisação do Poder espiritual.— Falta de pensamentos geraes nos sabios modernos : incapazes da missão social d'essa re. organisação.- Falta de sentimentos elevados dos artistas manifestada nos delirios estheticos do Ultra-Romantismo.--A falta de um ponto de vista synthetico faz preponderar o regimen da especialidade scientifica.-Constituição incessante de Sciencias concretas separadas de toda a vista de conjuncto.- Depois da queda de Napoleão a Restauração conserva o regimen universitario e chama os Jesuitas ao ensino publico.- A hypocrisia official do espiritualismo na sciencia.- A fórma official do espirito revolucionario sob a apparencia do regimen parlamentar proprio da Inglaterra.- Commissão de Instrucção publica junto do Governo.-- A creação de um Ministerio de Instrucção publica.- Questões de liberdade de ensino e da interven. ção do Estado.- phenomeno do Proletariado e as novas doutrinas do So. cialismo.-As Sciencias especiaes e as applicações immediatas, coincidindo HIST. UN.-Tom. IV. 1 e com o desenvolvimento da evolução industrial.--Rasão do prevalecimento do ensino polytechnico.—As Escholas industriaes ou de Artes e Oficios.Ensino popular superior.-A idéa da suppressão das Universidades.- As idéas da Convenção na organisação pedagogica apresentadas em Portugal por Garção Stockler.— Combatidas em Portugal e renovadas no estabelecimento da Instrucção publica no Brazil.—Fundação de Escholas especiaes. - Mousinho de Albuquerque apresenta ás Côrtes de 1822 um Plano de Instrucção publica, mais ou menos segundo as formas da Convenção.-A re. acção absolutista em 1823: o reitor Furtado de Mendonça reclama a reforma da Universidade.— As idéas de Candido José Xavier sobre as Escholas de Artes só tarde são aproveitadas.- A grande reforma geral de In. strucção publica decretada em 2 de novembro de 1833.-Garrett realisa esse pensamento ainda segundo o espirito da Convenção.- Da mesma cor. rente revolucionaria derivam os planos de uma Universidade portugueza por Guilherme Dias Pegado e por Figueiredo de Almeida.- A Associação dos Amigos das Lettras e a creação do Instituto das Sciencias physicas e mathematicas.—A creação de um Conselho superior de Instrucção publica em Lisboa em 1835.- Luctas da Universidade contra esta absorpção do governo e contra o desenvolvimento das Escholas polytechnicas.- A Revolução de Setembro adopta as formas pedagogicas da Convenção.- Passos Manuel leva á pratica os planos do vice-reitor da Universidade, José Alexandre de Campos.—Venceu a Universidade.- A equiparação das Escholas medicas de Lisboa e Porto com a Faculdade de Medicina. A organisação da Instrucção publica pelo decreto de 20 de setembro de 1844.— A critica das reformas pedagogicas pelo academico Ferreira Campos.-A iniciativa da Academia real das Sciencias em 1857.- A fundação do Curso Superior de Lettras.— A idéa de um Ministerio de Instrucção publica em 1862.Succedem-se os planos pedagogicos e as reformas da Instrucção publica, sempre no espirito de especialidade scientifica, e na suppressão das iniciativas individuaes.-Base essencial para uma reforma definitiva: A Sciencia tornando-se philosophica e a Philosophia fundando-se na Sciencia. A correlação das instituições politicas com as pedagogicas, que se torna patente em todas as épocas de grandes transformações, é em uma forma concreta a expressão dos dois Poderes, o temporal e o espiritual, que mutuamente se influem á medida que avançam para se constituirem de um modo menos empirico e menos ficticio. Vimos no fim do seculo XVIII como essa prolongada crise da desorganisação dos dois Poderes attingiu no momento organico da Revolução franceza a comprehensão clara do seu destino: a proclamação da republica sobre as ruinas do regimen feudal, e o estabelecimento do ensino obrigatorio, gratuito, e de Sciencias applicadas, pela Convenção, diante do esgotamento do regimen theologico. Todo o negativismo que caracterisa a actividade critica d'esse seculo terminara a sua funcção demolidora; |