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sua graça pera conhecerdes & obrardes as cousas de sua vontade & sancto seruiço. E acerca desto crede & day fee a Pedraluarez cabral, fidalgo de nossa casa, & nosso capitão mór em todo o que de nossa parte vos falar, requerer & com vosco tratar. De Lisboa ho primeiro de Março de mil & quinhentos.

Dada esta carta a el rey foylhe logo lida pelo lingoa, & despois lhe deu Pedraluarez bu presente que lhe mandaua el Rey dom Manuel, q era destas peças. Hu bacio de prata dagoa as mãos de bestiaes dourado, & hu agomil & hua copa co sobrecopa. Duas maças de prata. Quatro almofadas destrado, duas de brocado & duas de veludo carmesim. Hu esparauel de borcado broslado de veludo carmesim. Hu tapete muyto fino, & dous panos darmar deras, hû de figuras, outro de verdura. El rey mostrou folgaua muyto coestas peças, & pregûtou de que seruia cada hua. E despois disse a Pedraluares que se fosse pera sua pousada ou pera a frota se quisesse: porq era necessario mandar polos arrefes que estauão no mar pera comere em terra, por seu costume lhe defender ho não fizessem lá. E pedraluares lhe disse que ainda que mandasse pedir os arrefens os não auião de dar porq auião de cuydar qera recado falso. Ao q el rey disse que se tornasse á frota & que lhe madasse os arrefès: & que ao outro dia tornaria pera assentare ho trato que el rey de Portugal queria ter e Calicut. Do que Pedraluarez ficou muyto agastado porque lhe pareceo aquilo desprezo, & teue a el rey por home incos

tante.

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Do que aconteceo a Pedraluarez cabral em Calicut.

Em quanto Pedraluares esteue falando co el rey de Calicut desejado os mouros de auer reuolta âtreles, porq não ouuesse effeito ho trato q Pedraluarez queria assentar em Calicut: fizerão com hu escriuão da fazenda del rey que fosse á frota a pedir os arrefes da parte de Pedraluares: & Ayres correa não os quis dar, porq ele deixara dito que posto q lhos pedisse da sua parte que os não desse. E estando nesta pratica ho escriuão do mar em hua almadia & Ayres correa do bordo da nao, os arrefes polo q lhes ho escriuão disse lançarase ao mar pera se acolherể na almadia & fugire, o que fora se lhe Ayres correa não acodira muyto prestes no esquife da nao com algûs marinheiros que tomarão Araxamenoca & outro, & assi quatro malabares: mas ho catual fugio. E è Pedraluares saindo do çarame soube o q passaua por hů Portugues: & com ho agastamento que trazia del rey, & com o q isto lhe deu não teue acordo pera recolher o fato que tinha na sua pousada, nem A fonso furtado que lá estaua com sete Portugueses, & embarcandose co grande pressa tirou caminho da frota a força de remo, & entrado na capitaina mãdou logo meter Araxamenoca & ho outro debaixo de cuberta, porq não fugissem, & madou fazer queixume a el rey do escriuão pola reuolta q fizera: mandandolhe dizer que lhe não auia de mandar os arrefens se lhe não mandasse os Portugueses & ho fato deixara em terra. E por ser noite quando este recado foy a el rey ficou a cousa assi. Porem el rey não deu nenhu castigo ao escriuão, nem mandou nenhûa desculpa a Pedraluares, se não mandoulhe ho seu fato com os Portugueses. E os que lhos leuauão nunca ousarão de chegar á frota co medo que os tomassem, pelo que ao outro dia mandou Pedraluarez os arrefes por Ai

res correa, que os entregasse aos Malabares afastados da frota, & estando juntos hus, & outros pèra fazere esta êtrega, saltou Araxamenoca nagoa pera fugir, mas não pode, que hu marinheiro ho apanhou pelos cabelos & deu coele no batel, & ho outro fugio nesta volta, & acolheose aos Malabares. E Afonso furtado com cinco Portugueses teue tepo de fugir pera Aires correa que se tornou á capitaina & contou a Pedraluarez ho q passaua, q estaua muy espantado da pouca verdade dos Malabares & mais del rey, a que os mouros não deixauão de matinar com repetire muytas vezes os males que The tinha dito dos Portugueses: & fazendolhe crer que se forão pera paz, q não lhe pedirão arrefes, & se fiarão dele como fazião todos os mercadores, & sem mais cautela fora Pedraluarez a terra & assentara trato, mas por ir de guerra pedia arrefês pera se segurar. E coisto passarão tres dias sem el rey madar nhu recado a Pedraluarez, que auedo dó Daraxamenoca por auer tantos dias que não comia ho mandou a el rey liuremente, & ele lhe mandou os dous Portugueses que ainda estauão em terra, & ho seu fato. E despois co prazme del rey, a deu e arrefes dous mouros honrrados netos dum mouro Guzarate, foy Aires correa a terra pera assentar feytoria, que assentou com licença del rey, a que disse que el rey de Portugal teria sempre nela outras tais mercadorias como os mouros de Meca leuauão a Calicut: & nesta pratica lhe prometeo el rey de lhe fazer carregar as naos em vinte dias, & que a sua carrega seria primeyro a de nenhûs estrageiros, porque deixaria todos por dar auiamêto a el rey de Portugal, & mãdou apousentar Aires correa e huas casas do guzarate auó dos arrefes, a que rogou à fosse lingoa & corretor Daires correa, & ho instruisse no modo de comprar & vender daquela terra, ho q ele não fez, porque logo os mouros de Meca ho fizerão da sua parte co muytas peitas que lhe derão, & lhe fazia cõprar a especiaria mais cara do q se vendia aos mouros, & fazialhe veder a mer

q

cadoria de Portugal por menos do que valia: & quando Aires correa auia de falar a el rey faziaho saber aos mouros pera a fossem presentes, & ho estrouassem no que podessem, & ho q Aires correa queria dizer a el Rey, mudauao ele ao reues, & coisto não podia Aires correa aproueitar a fazenda da feytoria âtes perdia muito: & tudo isto veo Aires correa a saber, per hum mouro chamado Cojebequim, home muyto principal è Calicut, por ser cabeça dos mouros naturaeis da terra, que tinhão bando contra os do Cairo, & do Estreito de Meca, de que era cabeça outro mouro do Cairo q auia nome Coje çamecerim, que gouernaua as cousas do mar de Calicut, & por esta diuisam que auià antre estas duas nações de mouros, & ser Cojebequim cabeça de hû dos bandos, quis ele tomar amizade com os Portugueses pera se fauorecer coeles, & por isso tinha conuersação cỡ Aires correa, & lhe descobrio a treição q ho Guzarate lhe fazia, & mais que Coje çameceri a rogo dos outros mouros de Meca por cuidarem que fazião mal aos Portugueses, não deixaua ir á frota nhu dos que estauão na feytoria: dizendo que assi ho madaua el Rey que ho fizesse, & coessa cor não deixaua tornar á frota nhu dos que dela yão a terra. Ho que sabido por Aires correa ho escreueo a Pedraluarez, affeadolhe muyto ho caso, & dizendo que lhe parecia q os mouros querião fazer algua treição: & cuydando Pedraluarez q seria assi, por se segurar se leuou do porto co toda a frota, & se afastou hu pouco pera ho mar onde surgio, do q se el rey espatou muyto, & sabido Daires correa ho porq ho fazia: disselhe q ele proueria como os mouros não fizessem mais ho que fazião dãtes, porq folgaua muyto de os Portugueses terem trato em sua terra: & segurando Aires correa quanto pode se tornou Pedraluarez ao porto, & el rey tirou de corretor & lingoa Daires correa ho mouro Guzarate polas falsidades q fazia, & deu ho mesmo carrego a Cojebequim, por saber que era amigo Daires correa, a quem pera que vendesse melhor a fa

zenda da feytoria deu huas casas de Cojebequî q estauão junto do mar: & fez delas doação pera sempre a el Rey de Portugal pera ter ali sua feytoria: & a escritura disso foy feyta e hua folha douro batido. E porque todos soubessem q ali era a feytoria del Rey de Portugal, madou a Aires correa que posesse sobrela hua bandeira das armas Reais, & assi se fez: & dali por diante ho fauorecia muyto, & por isso os da terra tinhão grade amor aos Portugueses, & tinhão coeles muyta conuer

saçam.

CAPITOLO XXXVII.

De como Pedraluarez cabral, mãdou tomar húa nao pera el Rey de Calicut.

Durando

urando esta conuersação antre os Portugueses & os Malabares, mãdou el rey dizer a Pedraluarez cabral, q ele mandaua comprar hu Alifate a hû mouro de Cochim chamado Patemarcar, & não lho quisera vender dandolhe por ele tanto quanto outrem lhe podia dar, & afora não lho qrer vender lhe mandara dizer alguas descortesias, & antrelas fora q madaua ho Alifante a Câbaya, & auia de passar a vista de Calicut q lá lho podia mandar tomar polos Portugueses em que confiaua muyto: pedindolhe pois a nao auia de passar a vista de Calicut que ha mandasse tomar, porque compria muyto a sua horra tomarse. Pedraluares como tinha a el rey por incõstate, receaua que não lhe desse a carrega como The tinha prometido, fazia cota de ir carregar a Cochim, & por isso desejaua destar bem co el rey de Cochim, pelo que se lhe fazia graue de tomar a nao, receado de ho anojar nisso, & assi ho disse aos capitães em hu conselho que sobrisso teue: & elles lhe conselharão que com tudo era necessario tomarse a nao, pera el Rey ter credito nos Portugueses. E por isso mandou Pedraluarez fazer prestes a Pero dataide no seu nauio, & deulhe sessenta homes, & mãdou a hû fidalgo chamado Duarte

(

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