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dos darcos, & frechas, laças, terçados, & cofos. E na feytoria estauão setenta Portugueses com os frades, & tinhão suas espadas, & ate oy to bestas, sem mais outras armas defensiuas, nem offensiuas, tamanha era a confiança no seguro del rey de Calicut, & tão pouco ho cuydado do q compria a suas vidas: & co quanto os Portugueses erão tã poucos & tinhão tã poucas armas, defenderäose hu pedaço sem os mouros os poderem entrar, & nele mãdou Aires correa aruorar hua bådeira sobre a feytoria, pera q lhe acodisse darmada como acodirão os bateis que tinhão tomada a nao mas não prestou, porq ja Aires correa & os mais dos Portugueses erão mortos, & os outros fugira per hua porta q saya á praya indo os mouros apos eles onde acabarão de matar algus, & outros que forão ate vinte escaparão muyto feridos lançandose ao mar & tomaranos os bateis, & atrestes foy hu Antonio correa filho Daires correa que seria moço donze anos, que despois em home fez na India cousas muy notaueis, como direy no liuro quinto, & assi escapou frey Anrriq, q despois foy bispo de Ceita. E acabada de fazer esta destruição pelos mouros, saluou Coge bequi dous Portugueses q escodeo e sua casa: hũ auia nome Fernão peixoto natural de Vila franca, & outro Ioão roîz. E el rey de Calicut folgou dos mouros fazere isto aos Portugueses, pera tomar a fazeda que estaua na feytoria que era muyta, & toda a ouue.

CAPITOLO XXXIX..

De como Pedraluarez cabral se vingou do que os mouros fizerão.

Sabida

Dabida por Pedraluarez a morte Daires correa, vio qua mal fizera em mandar tomar a nao dos mouros, & ficou muy agastado de lhe acontecer tamanho desastre a que nã pode fugir vendoho primeyro: & por ser tã tarde, & não ter onde carregar nem onde inuernar se

não em Calicut, não quis logo vingar aquela offensa, mas têporizar co el rey ate ver se lhe mandaua algua disculpa do q os mouros fizerão, porq coisso ficaria satisfeyto por não ficar desauiado, & esperou todo aqle dia por este coprimento, que el rey não fez, porque The não pesou do q os mouros fizerão, ates ho ouue por proueito por amor da fazěda q ouue. E vědo Pedraluarez passar aquele dia, & que el rey não mandaua nhua disculpa, ao outro q fora dezasete de Dezebro, mãdou por seus capitães tomar dez naos de mouros q estauao no porto carregadas de fazenda & de gente, & forão tomadas por força darmas, & forão mortos seiscetos mouros, & outros feridos, sem morrer nhu Portugues. Tomadas as naos foy achada nelas algua especiaria, & outra fazenda, & tres Alifantes q Pedraluarez mandou salgar pera mantimento da gête: & despejadas ficarão nelas os catiuos atados de pés & de mãos, & assi forão queimadas a vista de muyta gente da cidade q estaua na praya pera lhes acodir mas não ousarão co medo da nossa artelharia. E era espantosa cousa de ver arder dez naos todas juntas, & fazerense caruões, & ouuir a grande grita dos mouros q estauão dentro, & nisto se gastou todo aqle dia. E ao outro têdo Pedraluarez chegadas as naos a terra ho mais que pode, mandou desparar a artelbaria q em todo ho dia não fez outra cousa, & fez muyto grade dano por toda a cidade, derribando casas, qbrando aruores, & matando gête sem conto. E a el rey de Calicut lhe foy forçado sairse da cidade, porque jûto dele espedaçou hu pelouro hu Naire seu priuado: & da banda do mar não ficou nhua casa e pé nem a gente ousou desperar, & passouse da banda do sertão, pelo que Pedraluarez não teue ao outro dia em qos danificar: & vendo que ali não tinha remedio, determinou de se ir a Cochi auer se podia fazer amizade co seu rey, de q tinha emformação que era muyto bom homẽ. E estãdo pera partir, vinha duas naos de mouros pera entrar no porto, & ele as seguio ate hû porto

chamado Fundarane, onde vararão em terra, & por isso as não pode tomar.

CAPITOLO XL.

De como Pedraluarez cabral assentou amizade com el Rey de Cochim.

Deste porto de Fundarane, prosseguio Pedraluarez

sua viajem pera Cochim com toda a armada & no caminho tomou duas naos carregadas darroz, que yão pera Calicut & os que yão nelas escaparão deitandose ao mar. E despejadas as naos forão queymadas: & despois disto aos vite quatro de Dezembro chegou a Cochim, que he hua cidade na costa do Malabar dezanoue legoas auante de Calicut pera ho sul: & está em noue graos da banda do norte situada ao longo du rio que se mete no mar cỡ que a cidade fica em ilha, & muyto forte, porque não se pode entrar se não por certos passos. Te bo porto & limpo q se faz na foz deste rio: a terra ao derredor he alagadiça & feyta em ilhas, viçosa & fresca, mas dá poucos mantimentos. A cidade he de casas como as de Calicut, & pouoada de gêtios & de mouros estrangeiros que sam grandes mercadores por amor da muyta pimëta q ha na terra & muyto mais que em Calicut. Seu rey era gentio & tinha os costumes do de Calicut era pobre & senhor de pouca terra & de pouca gente, nem podia laurar moeda, & mais de cada vez que auia rey nouo em Calicut despunha de rey ho de Cochim, & estaua em sua mão darlhe ho reyno ou nã: & mais era el rey de Cochim obrigado dir a seus parás que sam batalhas que dão a outros reys. Chegado pedraluarez cabral ao porto desta cidade, não quis mandar recado a el rey por Gaspar por recear de não tornar mais, & mandouho por hû gêtio que se tornara Christão estando em Calicut, & queria ir coele a Portugal, se chamaua Miguel & por sobre nome Iogue que era

antes de ser christão. E logues sam homes que tem hüa certa religião antre os gentios, & andão polo mundo fazēdo romarias a pagodes & casas doração da sua seyta. Por este Miguel mandou Pedraluarez offerecer a el rey amizade del Rey do Manuel, & rogarlhe da sua parte q The mandasse dar carrega de pimenta & doutra especiaria pera quatro naos a troco de mercadorias ou comprada por dinheiro. O q el rey outorgou, mostrado pesarThe muyto da treição que em Calicut fora feyta aos Portugueses, de que mostrou estar be enformado & estimalos muyto. E pera q Pedraluarez mãdasse a terra quem negociasse a carrega das naos, madou em arrefes dous Naires principais, com codição q se auião de reuezar co outros dous que ficarião em quanto aqueles fossem comer, porque não podião comer no mar. E Pedraluarez mandou logo a terra por feytor da carrega Gonçalo gil barbosa de Santare, & por seu escriuão hu Loureço moreno & por lingoa hu Madeira com quatro degradados que os seruissem, & nã quis q fossem mais porque se perdessem poucos se acôtecesse algu desastre como em Calicut. E ho feytor foy recebido com muyta honrra per muytos Naires que ho leuarão a el rey q estaua nú, saluo q tinha cingido hu pano braco q lhe chegaua ate ho giolho. E assentado e hûs degraos a modo de theatro acompanhado de pouca gête. Ho feytor lhe apresentou da parte de Pedraluarez cabral hu bacio de prata dagoas mãos cheo daçafrão, & hu grande barnegal de prata cheo dagoa rosada & certos ramais de corais, pedindolhe perdão de lhe não mandar mais, porque aquilo lhe ficara do despojo, & que não lho mandaua se não por sinal damizade. O que el rey agardeceo muyto, & despois de falar hum pedaço com Gonçalo gil sobre el Rey de Portugal ho mandou apousentar, & dali por diante ho fauoreceo muyto & lhe deu todo auiamento quanto pode ser pera fazer a carga: a que os gentios da terra ajudauão com tanto amor q parecia permissam diuina a mudança de Calicut a Cochim pera a igreja ca

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tholica multiplicar na India como multiplica, & ho estado del Rey dom Manuel se acrecentar tanto, com proueito de sua fazenda.

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De como Pedraluarez cabral se partio pera Portugal.

Como em Calicut se ouue por muyto estranha a ida

dos portugueses por irem de tão lõge soou muyto por toda a terra, & assi ho rico presente que el Rey de Portugal mandara a el rey de Calicut, & as mercadorias que mandaua pera a feytoria, pelo que não ouue nhữ rey do Malabar que não ouuesse enueja a el rey de Calicut por tal gente ir carregar a seu porto, pelo grande proueyto que sabião que auia dauer, & todos desejauão qué fossem carregar aos seus portos, & estranharão muyto a treição que lhes fez el rey de Calicut, & sabedo que era de lá desauindo, & que estaua em Cochì mandaralhe logo embaixadores el rey de Coulão & el rey de Cananor reys principais do Malabar despois del rey de Calicut: offrecendolhe amizade & carrega em seus portos. E Pedraluarez aceitou a amizade & escusouse de ir lá carregar por quanto tinha começado em Cochi dandolhes esperança que doutra viagem ho faria. Eisto soube el rey de Cochi & ho estimou muyto. E tendo Pedraluarez as naos quasi carregadas, foy auisado por el rey de Cochî que el rey de Calicut mandaua côtrele hua armada de vinte cinco naos grossas & muytos paraós em que vinhão quinze mil homes pera ho tomare porque lhe queimara as naos & lhe destruira a cidade offrecêdolhe gête pera ho ajudar, o q Pedraluarez não quis, porq el rey visse q não tinha necessidade de sua ajuda. E auendo vista da armada q ya contrele, se leuou do porto co toda a frota pera ir pelejar coela no mar afastado da terra: & por vetar a viração na lhe pode chegar, & adou ás voltas ate noite. E os mouros come

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