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«Em consequencia d'esta denuncia, foi pre- | so não só o dicto Vicente Taxji, mas outros alguns comprehendidos nos interrogatorios e autos que ponho na presença de V. A. R. 1.» Poucos mezes depois dos successos que acabamos de relatar chegava ao Tejo lord Byron, vindo de Falmouth em quatro dias e meio. Estava na flor da vida, e era um bello moço, como d'elle escreveu Goethe no Segundo Fausto.

Os cabellos negros, finos, e mais cumpridos do que se usavam então, alteavam-se em graciosos anneis.

A frente vasta; as faces mimosas, se bem que extremamente pallidas; e a barba e os labios modelados á feição da belleza antiga, pela pureza das linhas e a graça do contorno, recebiam da luz de uns olhos pardos, muito limpidos, e tão brilhantes que fascinavam, o seu maior relevo e a sua expressão mais bella. Uma nuvem de tristeza, que não convinha com o seu estado e menos com a verdura de seus annos, toldava-lhe habitualmente o semblante, cujas feições, dotadas de uma mobilidade extrema e rara, podiam dizer com a mesma clareza e facilidade todos os sentimentos e todas as paixões.

Um bigode, quasi imperceptivel, completava essa physionomia de tal modo perfeita, que chegou a ser comparada á esculptura de um bello vaso de alabastro, allumiado por dentro! Por ultimo, a estatura regular, proporcionado de membros e sem defeito apparente, a não ser n'um pé que era torcido (Vej. Walter Scott, Medwin, etc.)

Aquelle moço, tão inspirado como aventureiro, possuia uma alma ardente, apaixonada e viril. Principiava, quando aqui chegou, a sua incessante preregrinação, e trazia nos labios um sorriso amargo, que não era cynico, mas dava ares de o ser, consoante o ideal que teimava em ajustar a si, e que espalha uma luz tão viva sobre os seus poemas mais ousados e famosos. Muitos lances da vida d'elle, e varias passagens das obras que escreveu, mostrariam á evidencia a inanição de tal proposito, se, para confundir os inimigos que elle ainda tem, não fosse bastante apontar-lhes para o poeta-heroe de Missolonghi, sacrificando os bens da fortuna e a propria vida á liberdade da Grecia!

Mui poucos dias se demorou lord Byron em Portugal. Em tão curto espaço não teve modo de examinar bem o estado social do reino e os costumes do povo. Alem de que, não era lá muito dado á canceira de estudos fastidiosos o poeta que em tão alto gráu tinha a paixão do ceterno feminino,» sem embargo de traduzir Anacreonte, Eschylo, Horacio e Catullo e Dante, com a mesma facilidade e elegancia com que escrevia o seu inimitavel

1 Idem ibid.- f. 38 v.- 5 de jan. de 1809.

Beppo, ou impinava os copos nas orgias delirantes de Veneza. Por cá, embevecido na pureza do céu e nas bellezas naturaes d'este uberrimo e formosissimo torrão, o que alcançou ver em tão pouco tempo, quer-me parecer que foi de um relance de olhos. Se viu muito com discrição e acerto, não ha senão que admirar o acume de seu ingenho. Podemos, pois, ter por sem duvida que as rapidas impressões da viagem foi de puro o que levou d'aqui; e o que, decorridos tres annos, arremessou ás disputações do mundo com todo o canto I do Childe-Harold, em que ha estancias que inebriam por uma doçura ineffavel, e direis que ha outras que parece rebentarem do plectro rutilando imprecações tremendas!

Não me accuse o leitor sisudo de me distrahir com dilações impertinentes. A toda a luz se vê que é de maxima importancia para o nosso assumpto o testemunho de um viajante contemporaneo e tão celebre como Byron foi. Bem sei que é voz constante que esse extrangeiro mentiu, pretendendo manchar com torpes calumnias a fama da gente illustre portugueza. Essa atoarda repete-a, ha muitos annos, a nossa imprensa periodica, de sorte que não ha villa ou aldeia em todo Portugal que não saiba que lord Byron descarregou a sua ira sobre os portuguezes, dizendo-lhes opprobrios. E o certo é que anda por ahi tão infamada a sua memoria, que não acerto de achar razão mais cabal do desamor que lhe têm e do muito pouco que é lido entre nós e, á conta d'elle, todos os mais poetas da sua terra,- á excepção d'algumas fallas eloquentes dos anjos e demonios de Milton n'uma traducção que eu conheço, a qual, em boa e leal verdade, tanto póde ser do Paraiso Perdido como do ZendAvesta. Todavia, o confronto da prosa de Lucas José de Seabra com a poesia de Jorge Noël Gordon, lord Byron, isto é, dos regis tos da policia com os versos do Childe-Harold, penso que é mui seguro criterio para uma apreciação imparcial;-com quanto seja certo que o grande poeta se excedeu, proferindo expressões injuriosas contra uma nação amiga.

O seu testemunho consta principalmente de uma breve nota, que diz assim:

«E bem sabido que no anno de 1809 os assassinatos commettidos nas ruas e nas proximidades de Lisboa pelos portuguezes não se limitavam aos seus conterraneos... Fui uma vez atacado deante de uma loja aberta, indo de carruagem para o theatro com um amigo, estando as ruas concorridas como de costume a tal hora. Iamos armados felizmente; pois, se assim não fôra, certo que a esta hora seriamos heroes de um romance, em vez de o contarmos. Não se commette só em Portugal o crime de morte. Em Malta e na Sicilia partem-vos a cabeça uma noite com a maior sem cerimonia. E nunca é punido um siciliano ou um maltez!>>

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Este modo de fallar de um extrangeiro não | agrada lá muito ao sentimento nacional. É certo, porém, que em tempos de paz e de muito maior brandura de costumes, como são os actuaes, ainda nós dizemos e escrevemos cousas muitos peiores! Sirva de exemplo, entre muitos, o Jornal da Noite, redigido pelo Sr. A. A. Teixeira de Vasconcellos, de 6 de fevereiro de 1871, n.° 31, em que se lê isto: «Seja qual for a verdade neste lastimoso successo (um homicidio), bastam os factos já averiguados para nos indicarem a espantosa corrupção de costumes e desenfreamento de paixões em que vivemos. Todos os dias registamos homicidios, ferimentos, suicidios, roubos, furtos, desacatos á auctoridade, despreso das leis divinas e humanas, procedimento regulado pelos mais ferozes instinctos do egoismo e da paixão, e casos que horrorisam os animos menos brandos e sensiveis.

«Parece que nos negocios da vida ninguem se lembra de que ha obrigações a cumprir e leis a respeitar. Cada qual busca na força e no arbitrio proprio a solução de todas as difficuldades, e fere, mata, ou rouba, segundo lh'o pedem a colera, o orgulho, a necessidade ou o appetite.

Não fallamos aqui dos assassinatos feitos pelo povo no Porto e no Minho antes da entrada do marechal Soult naquella cidade, em 29 de março de 1809, porque d'esses tristes acontecimentos se encontra ampla noticia em varias obras, que andam nas mãos de todos, sendo uma das mais notaveis a Memoria Historica do cardeal Saraiva, pelo sr. marquez de Rezende, a qual em a nota 11. (pag. 55 a 59) traz uma Relação summaria dos assassinios feitos em differentes terras da provincia do Minho no anno de 1809.

ALBERTO TELLES.

OS PRIMEIROS SECULOS DA REPUBLICA ROMANA (Continuado de paginas 165) II

Se é verdade, como diz Montesquieu, que, cao nascer das sociedades, são os chefes das republicas que formam a instituição, e é depois a instituição que fórma os chefes das republicas, o mais completo elogio das instituições romanas está nos homens que d'ellas procederam.

Os sentimentos fundamentaes de um Romano eram o amor da liberdade, o amor da justiça, a veneração religiosa para com a divindade e a confiança nos destinos da patria.

Ora, como a cada um d'estes sentimentos corresponde uma virtude, a historia dos primeiros seculos da republica não registra senão grandes exemplos.

O que o senado decidia, e os magistrados ordenavam, era a norma por que todos se dirigiam. Ninguem ousaria substituir o dever da obediencia pela sua vontade pessoal. Este sentimento de disciplina, tão fecundo em resultados excellentes, não é porém, na ordem das virtudes publicas dos Romanos, o que mais sympathias chama. Mais grandiosa é, sem duvida alguma, a constancia e a fortaleza patriotica, que nunca os desamparou.

Estou que succede a muita gente o deixar-se illudir, quando se lhe desenrola diante dos olhos o quadro das conquistas romanas, pelas grandes vantagens que tocaram á cidade, a sua situação, unica na Italia, o espirito bellicoso dos seus habitantes, formado pela guerra e para a guerra, as raras qualidades dos chefes que os guiavam, e a desunião dos povos visinhos, não reconhecendo portanto as difficuldades reaes que tantos tropeços pozeram ao seu progredir, e não tomando na devida conta a situação critica em que ella tantas vezes se encontrou. Comtudo, taes foram essas crises, que é muito para admirar que a republica sahisse d'ellas, como de facto sahiu, sempre victoriosa, e sempre mais forte. A invasão gauleza e a destruição da cidade, a sublevação dos povos submettidos que seguiu immediatamente esta grande catastrophe, as quatro encarniçadas guerras do Samnio, Pyrrho e os seus elephantes, Annibal e os seus mercenarios, são prova cabal do que acabo de dizer.

Quanto mais temeroso era o lance, tanto mais se elevava a tenacidade romana, e tanto mais se exaltavam as virtudes civicas, sem as quaes o valor guerreiro mal basta para defender um paiz. O legionario era valeroso no campo da batalha, arriscava gostosamente a vida pela patria, e, tendo em pouco os despojos, tão vivo desejo de gloria o animava, que, no dizer de Sallustio, «mais vezes eram punidos na guerra os que contra ordem com o inimigo pelejavam, e os que depois da chamada mais tarde sahiam do combate, que os que desamparavam as bandeiras, ou carregados cediam o posto. Porém a sorte das armas é caprichosa; a victoria, que os poetas imaginam alada, nenhum exercito, por denodado e familiar com seus favores, pode contar com ella; e, se o espirito publico não tivesse renovado permanentemente as legiões defensoras, fazendo de cada cidadão um soldado, certo que Roma

1 Quod saepius vindicatum est in eos qui contra imperium in hostem pugnaverant, quique tardius, revocati, praelio excesserant, quam qui signa relinquere, aut, pulsi, loco cedere ausi erant. (Catilina, 9).

se não teria levantado de alguma das gran- perdido o exercito, o não ter desesperado da des invasões.

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III

Esses homens, que o amor da patria improvisava, sempre que as circumstancias o exigiam, soldados, administradores e generaes, são os mesmos que ainda hoje dão ao mundo o exemplo das virtudes humildes, que viviam parcamente do grangeio das suas propriedades rusticas, sem que, alem d'estas, conhecessem outras occupações que não fossem os negocios contenciosos e o serviço do estado, e que de boa vontade dispensavam as commodidades da vida e os prazeres do luxo, pondo a sua ventura em que a republica contasse muitos consulados gloriosos, muitas dictaduras reparadoras e muitos triumphos esplendidos.

Os exemplos são numerosos, e fallam bem alto. Cincinnato é chamado do campo para a dictadura, Attilio Serrano para o consulado. Os Decios dedicam-se pelo exercito. Manlio Torquato e Posthumio Tuberto immolam seus filhos á disciplina. Manio Curio e Fabricio, esses espelhos da inteireza, preparam por suas mãos seus frugaes alimentos. Fabio Rulliano, escolhendo Papirio Cursor para dictador, sacrifica ao interesse da patria porventura a mais ardente das paixões, o odio. Attilio Regulo, triumphante na Africa, roga ao senado que o deixe voltar á Italia para olhar pelos seus bens d'onde lhe tinha fugido o escravo com os bois; e este mesmo homem soffre, por se conservar fiel ao juramento, o mais affrontoso supplicio. E ninguem tome estes exemplos por factos isolados. Pelo contrario. As grandes acções não são aqui, como em outras epochas, o fructo de qualidades generosas desenvolvidas artificialmente. Não é agora o caso dos Phocions e dos Catões. Se ha na historia homens cujo procedimento deve ser em tudo referido á patria, estes são, por

certo.

Quem aprecia a politica do senado não sabe para onde deva inclinar a balança do louvor, se para a grandeza dos planos, se para a inquebrantavel firmeza, de que restam tão claros testemunhos, se para a dignidade, digamos o termo proprio, a majestade do proceder, se para a habilidade com que era aproveitada a victoria.

Com effeito, o senado, que Cineas denominava uma assembleia de reis, respondia durante a guerra de Pyrrho ás offertas de auxilio feitas pelos Carthaginezes que a republica romana não emprehendia guerras com que não podesse, e rejeitava indignado a traiçoeira proposta do medico do rei epirota. Depois da batalha de Cannas, concedia apenas trinta dias de luto á dôr dos cidadãos, ia em corporação agradecer ao inhabil consul plebeu Terencio Varrão, que tinha

republica, e mandava vender em praça o terreno onde estava assente a tenda de Annibal. Quaesquer que fossem as circumstancias, a assembleia de reis não se esquecia nunca de que representava o povo romano.

Mas onde, a meu vêr, mais ha que admirar e aprender é no systema seguido em relação aos vencidos.

Nenhum outro povo da antiguidade pôde conservar as suas conquistas, porque nenhum quiz renunciar aos direitos que lhe cabiam como vencedor. As grandes republicas da Grecia, sobretudo Athenas, que tão digna foi de exercer uma dominação bemfazeja, nunca poderam acabar comsigo que cedessem das suas pretenções municipaes, e aggregassem voluntariamente á cidade os povos que a victoria lhes rendia. O systema dos Romanos foi, neste ponto como em outros muitos, inteiramente opposto, e d'ahi lhes resultou a amplidão e a permanencia do seu imperio.

Em relação aos vencidos a politica dos reis tinha sido, como já indiquei, augmentar com elles a cidade, forçando-os á emigração. A revolução consular não foi favoravel a este systema, e as adjuncções collectivas de cidadãos cessaram immediatamente. Havia nisto calculo aristocratico, mas deve-se reconhecer tambem que, com o progresso da policia, as transfusões voluntarias ou forçadas, cuja execução era extremamente barbara, se tornaram pouco a pouco quasi impracticaveis. Qualquer porém que fosse o motivo, é certo que o antigo systema foi posto de parte, e que o senado se viu obrigado a recorrer a outro.

O novo systema, muito mais habil e de muito mais fecundos resultados, consistia em expandir a cidade, creando cidadãos romanos fóra de Roma e do territorio romano, e fraccionando o direito de cidadão, segundo certas e determinadas regras. A alguns povos couberam todos os direitos derivados do titulo de cidade, a outros sómente a communicação do direito quiritario, sem participação nos actos do governo, e sem capacidade politica. Desde então a cidade possuiu fóra do seu territorio filhos não domiciliados, que eram admittidos no senado, votavam no Campo, e pelejavam nas legiões, e, atraz d'estes, outros menos favorecidos, que com o tempo podiam chegar a conseguir os privilegios dos primeiros.

As cidades aggregadas á sociedade romana tinham o nome de municipios. Havia-os de tres classes. Na primeira, os habitantes gozavam da plenitude do direito de cidade, isto é, do direito quiritario e dos direitos politicas. Os da segunda honravam-se com o titulo de cidadão, e serviam nas legiões, mas não votavam nem eram admittidos como candidatos ás magistraturas. Aos da terceira só era concedido o direito quiritario, sem o apreciado

privilegio de fazer parte do povo romano. Abaixo dos municipios estavam as prefeituras, os povos sujeitos (de todos os menos favorecidos), e os alliados, que se achavam ligados a Roma por tractados em que a igualdade apparente mal disfarçava a sujeição real. O que succedera com o titulo de cidadão succedeu tambem com o titulo de Latino e de Italiano. Constituiu-se um direito abstracto, que, creando Latinos fóra do Lacio, e Italianos fóra da Italia, outorgava, com o direito civil de Roma, maior ou menor capacidade para o conseguimento do titulo de cidadão.

D'esta fórma, exigindo a cada povo e a cada cidade um tractado especial, e prohibindo que communicassem uns com os outros, já formando ligas, já contractando, já unindo-se pelo matrimonio, o senado logrou dividir profundamente os interesses dos, vencidos. Para obstar a que os bons effeitos do systema fossem annullados por successos imprevistos é que foram estabelecidas as colonias. Estas guarnições, formadas originariamente de veteranos e de plebeus pouco favorecidos da fortuna, residentes em territorio que fôra dos seus visinhos, e portanto rodeadas de inimigos que as traziam sempre apercebidas, vigiavam os vencidos, e frustravam as suas revoltas, propagavam a lingua, as leis e os costumes dos Romanos, alliviavam a cidade pelo facto da sua emigração, e defendiam-lhe os postos avançados.

O que valiam as colonias, e qual era a sua importancia no systema geral de defesa de Roma, bem o conheceram Pyrrho e Annibal, quando se viram apertados no circulo de ferro que esses baluartes vivos lhes fecharam na rectaguarda, e que só o seu genio militar conseguiu partir.

Depois da victoria, assim como no mais rijo da peleja, a politica do senado, que consistia sobretudo em transigir imperialmente com os vencidos, e em fazer do titulo de cidadão a mais desejada de todas as concessões, é digna do conselho de um grande povo. O systema que tão habilmente empregou não foi construido artificialmente, mas sahiu da natureza das coisas e dos successos. Aqui, bem como na lucta das ordens, o caminhar vagaroso mas incessante produziu os seus maravilhosos resultados.

Cumpre notar todavia que, se o caracter publico dos Romanos e muitas das suas virtudes privadas têm justo titulo á nossa admiração, nem esse caracter nem essas virtutudes excitam em nós a sympathia que nos attrahe para outros povos, por exemplo, para os Athenienses. Aqui as virtudes, ainda as mais humanas, são todas marcadas com um sello de tão grande austeridade, que a estima vai para ellas primeiro do que a inclinação, e nada se encontra que possa ser comparado ás qualidades amaveis e aos rasgos brilhan

tes dos vencedores de Marathonia e de Salamina. A luz que inunda esplendida a terra abençoada da Grecia passa discretamente através das nuvens severas do ceu italiano. Alem, illumina um povo de heróes e de artistas. Aqui, allumia um povo de cidadãos.

A gloria civica é porém a maior de todas, e, neste seculo, em que, mau grado da generosidade com que elle acolhe tudo o que é grande, a idéa de liberdade anda exposta a tão singulares aventuras, não creio que haja espectaculo mais fortalecedor do que os quatro seculos de constituição livre de um povo que nasceu num couto, e acabou por conquistar o mundo. LUIZ GARRIDO.

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Cada um dos seis capitulos do livro são indicados por cada um d'estes nomes: Cesar, Augusto, Prosper Mérimée,- Beulé,— Napoleão III,- Luciano.

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Os leitores do Instituto conhecem de sobra o merito litterario do nosso collaborador; e d'esse conhecimento poderão inferir um juizo mais ou menos exacto sobre o merito dos Ensaios. Se na parte critica do seu trabalho nem sempre commungamos nas idéas do auctor, especialmente no que diz respeito ao Germanicus de Beulé, nem por isso calaremos que a sua dicção é sempre correcta e agradavel, os seus conhecimentos historicos variados e meditados, e as suas apreciações acompanhadas de uma cousa que não é muito vulgar entre escriptores noveis o bom senso.

ERNESTO RODOLPHO HINTZE RIBEIRO, Os fideicommissos no direito civil moderno, commentario aos artigos 1866 e 1874 do Codigo civil,- Coimbra, 1872.

Nesta obra occupa-se o dr. Hintze Ribeiro da natureza e caracteres da substituição fideicommissaria; dos fideicommissos prohibidos,

e dos permittidos, no Codigo civil; da consti- | da nossa litteratura, publicados na Ilustracion tuição d'elles; dos direitos e obrigações dos fi- de Madrid, e noutras folhas periodicas da duciarios e do fideicommissario; de algumas nação visinha.. anomalias legaes; de umas bases de reforma, e conclue o seu trabalho com um projecto de reforma.

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Trabalhos d'este tomo não se apreciam em duas linhas. Deixamos a outros, e para outros logares, essa tarefa, certos de que, quem sobre si a tomar, facilmente demonstrará que auctor conhece de perto e critíca com perspicacia a legislação romana e a legislação patria, e argumenta com rigor e clareza.

- EDUARDO DALLY ALVES DE SÁ, Dos direitos da Egreja e do Estado, a respeito da erecção, suppressão, união, divisão e circumscripção das dioceses e metropoles,- Coimbra, 1872.

Na primeira parte do livro occupa-se o auctor da legislação ecclesiastica, relativa ao assumpto; e, na segunda, da legislação portugueza. O fecho da obra é um excellente capitulo, corollario rigoroso de bem dirigidas demonstrações. O auctor, filiado sem duvida no partido democratico, que não sacrifica as necessidades do presente e do futuro aos factos do passado, advoga energicamente a separação da Egreja e do Estado, e pugna pela abolição do beneplacito e da dotação clerical. Neste ponto temos de limitar-nos á exclamação predilecta dos parlamentares ociosos: apoiado!

-D. ANTONIO DA COSTA, José de Castilho, o heróe do Mondego,- Lisboa, 1871. A proposito d'este livro já noutro logar dissémos:

«O José de Castilho não é simplesmente uma biographia: é tambem um romance que, para deleitar e commover, não precisa de lances imaginarios, porque os ha, tocantes e affectuosos, na vida real do protogonista, lances que movem a lagrimas e lances que prendem a phantasia ao delicado da descripção e aos cambiantes da paizagem.»

- LUIZ VIDART, La filosofía española, indicaciones bibliográficas,- Madrid, 1866.

Abrem esta obra uns apuntes sobre a historia da philosophia na peninsula iberica, e seguem umas valiosas indicações sobre o estado actual da philosophia em Hespanha, acompanhada de um erudito appendice.

Luiz Vidart, sem accentuar as suas crenças philosophicas, nem penetrar no amago dos mais levantados problemas que agitam hoje o mundo da intelligencia, revela todavia conhecimentos geraes da philosophia antiga e moderna, e escreve com facilidade, senão até, com certa elegancia.

Incidentemente diremos que a este escriptor somos devedores, nós os portuguezes, de varios trabalhos bibliographicos e criticos ácerca

-JULIO M. DE VILHENA, As segundas nupcias no direito civil moderno, commentario aos artigos 1233 a 1239 do Codigo civil tuguez,- Coimbra, 1872.

Este livro, depois de uma erudita introducção historica, em que o assumpto é estudado em face da revolução christã, das heresias, do direito canonico e do romano, das Partidas e da legislação portugueza, é dividido em duas partes, uma das quaes se inscreve- Direitos e deveres da mulher binuba; e a outra-Direitos e deveres do homem e da mulher binuba.

Os que não são extranhos á sciencia juridica avaliarão de relance a importancia do assumpto, e facilmente comprehenderão que é mister trabalho e intelligencia para que um livro sobre tal materia obtenha a acceitação que as Segundas Nupcias merecidamente conseguiram.

Cremos que o Instituto está provando, sem contestação possivel, que o doutor Julio de Vilhena florêa dextramente a penna, não só nos labores juridicos senão tambem historicos e criticos.

MAGALHÃES LIMA, Miniaturas romanticas, Coimbra, 1871.

Já em tempo nos occupámos, em pouco mais de espaço, d'esta collecção de romancinhos; e, pois que não variamos de convicções a este proposito, reproduziremos uma parte da nossa alludida apreciação:

«Sente-se neste livro o que quer que é de vacillante e mal distincto: o autor, ao gizar um plano, vacilla, e o passo sái-lhe a revezes desegual e pouco firme. Não obsta isso, porem, a que a sua formosa imaginação de vinte annos se não desate em flores de um perfume que enleia e de um viço que enamora; nem obsta a que deixem de relampaguear a espaços uns assomos d'essa luz que aureóla os fiÍhos do seculo, os titans da intelligencia, empenhados em escalar futuro e devassar os segredos do invisivel; e, se no moço escriptor nos é dado confrontar a intelligencia e o sentimento, antolha-se-nos que este cederá áquella, e que o pensador poderá equilibrar-se um dia por cima da atmosphera em que se nutre a vida melindrosa e desambiciosa do coração humano.» C. DE F.

(Continúa)

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