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Siguen luego su camino
Todo ricamente ornado,
De hal embras Persianas,
Paños de seda y brocado,
Y de pueblo innumerable
Por ver á su Rey juntado.

Buelven todos al camino
Al palacio adereçado
Con mil fiestas y invenciones
De juegos acompañado.
Las calles y las ventanas
Y quanto del Rey es mirado,
Todo es lleno de ornamento
De plata y oro entallado:

Y de triumphales arcos
Y colunas de alto grado,
Y de misticas figuras

De esculpido y debuxado.

Falcão de Resende termina o romance com a saudação:

Buena sea su venida,
Para bien sea llegado,
Sea su corona y ceptro
Para siempre prosperado,

Y acrescentada su vida
Por bien de su pueblo amado;
Y Dios, dador de los bienes,
Para siempre sea loado.1

O reitor D. Nuno de Noronha regressou a Coimbra, trazendo uma carta de Filippe II, para a Universidade, datada de Elvas em 25 de fevereiro de 1581, manifestando o contentamento que lhe causara a prompta homenagem de obediencia que lhe era prestada, e a satisfa

1 Este romance ficou inedito, porque a edição das Obras de Falcão de Resende, começada em Coimbra, não chegou á parte escripta em castelhano. Acha-se hoje publicada no Diccionario de Escriptores portuguezes que escreveram em casteThano, pelo Dr. Garcia Peres, p. 174 a 179.-Falcão de Resende viera para a Universidade de Coimbra em 1548; fez exame de bacharel em direito canonico em 20 de julho de 1569, formatura em 19 de novembro de 1570; por alvará de 11 de dezembro de 1577 D. Sebastião concedeu-lhe como Juiz de Fóra de Torres Vedras 58$640 réis de mantimentos e aposentadorias para si e seus homens. (Instituto, de Coimbra, vol. xxvIII, 2. serie, p. 90.)

ção com que se declarava seu Protector. A Universidade facilmente acreditou n'aquellas palavras, desmentidas por tragicos successos ulteriores, e ordenou um prestito solemne a Nossa Senhora da Graça. O reitor teve de ser substituido em 17 de abril, para ir tomar parte nas côrtes de Thomar, onde o invasor legitimou a occupação de Portugal pelo simulado voto nacional dos procuradores a su modo.

Nas côrtes de Thomar não faltaram partidarios de Filippe II, mais exaltados do que o proprio monarcha, protestando contra a Universidade de Coimbra, por ter sido um dos mais poderosos sustentaculos das pretenções rebeldes de D. Antonio, e mesmo da Casa de Bragança, e até de espalhar as doutrinas revolucionarias da Soberania nacional, que por sediciosas eram um perigo para a estabilidade do throno e um germen de corrupção no espirito da mocidade. É natural que, segundo o genio manhoso de Filippe II, se espalhasse entre os procuradores ás côrtes de Thomar que se proporia a extincção da Universidade de Coimbra e a sua annexação á Universidade de Salamanca; não appareceu a proposta nos capitulos geraes, produzindo todo o seu effeito o reconhecimento de todos os privilegios da Universidade por Filippe II; perdoou aos doutores compromettidos pelas allegações juridicas, por serem a favor da Casa de Bragança, com quem se entendera pela desistencia promovida pelos Jesuitas; mas assentou a mão sanguinaria sobre aquelles que se manifestaram a favor do Prior do Crato. Sabese pelas notas de Figueirôa que o Doutor Pedro de Alpoim, collegial de S. Pedro e lente de Codigo, fôra degolado por ter seguido o partido de D. Antonio. Frei Luiz de Souto Mayor, da ordem dos Prégadores, foi demittido da cadeira grande de Escriptura por decreto passado em Badajoz a 26 de setembro de 1580; e Frei Agostinho da Trindade, agostiniano, demittido em egual data da cadeira de Scotto, tendo de emigrar para França, onde veiu a ensinar theologia na Universidade de Tolosa. O portador da carta de D. Antonio á Universidade, em que participava a sua acclamação, João Rodrigues de Vasconcellos, morreu no carcere.1 Frei Luiz de Souto Mayor foi restituido á sua

1 No odio cego dos auctores do Compendio historico não se separam os interesses de Filippe I do dos Jesuitas, attribuindo a estes todas essas perseguições: «Tomando os ditos Jesuitas o pretexto de que os referidos Doutores sentiam mal do direito del rei D. Philippe 11, fizeram matar occultamente e afogar no mar mais de dois mil Ecclesiasticos, Regulares e homens de Lettras, e fizeram com que muitos outros das mesmas boas qualidades fossem buscar refugios nos Paizes estrangeiros, fugindo, como de inimiga, da sua propria patria; etc.» (Pag. 14, § 4.)

cadeira, por ser protegido por D. Jorge de Athayde e por D. Fernão Martins Mascarenhas. Vejamos alguns dados biographicos seus.

Em carta de Lourenço Pires de Tavora, de 26 de setembro de 1561, lembrava-se a conveniencia de ser nomeado como letrado ao concilio Frey Luiz de Souto Mayor, escrevendo-se as seguintes linhas: «Frey Luis de Souto Mayor, irmão de Antonio de Souto Mayor, estudou em Lovaina muitos annos, veo aqui ter em companhia do padre frey Pedro de Souto que foi confessor do emperador que esté em gloria, he homem de muito boas letras e sabe bem as lingoas, he estimado de letrados... já andou em Inglaterra... e por outras vias tenho tambem boa informação delle; pareceo me muito sufficiente pera na conta dos letrados que Vossa Alteza manda ao concilio ir tambem este padre e portanto o persuadi a hirse a Trento, e a pousar com Dom Jorge de Atayde da maneira que vinha o padre frei João Pinheiro, aceitou o conselho de muito boa vontade até ver mandamento de Vossa Alteza.»1 Tornamos a vêr citado o seu nome em carta de 17 de fevereiro de 1562, de D. Fernão Martins Mascarenhas, embaixador de Portugal em Trento: «Com dom Jorge de Taide esta hum frade de Sam Dominguos que ha nome frei Luis de Souto Mayor, filho de Fernando Anes de Souto Mayor, que pelejou muitas vezes com os mouros por serviço de Deus e del Rei voso avo, seus yrmãos cativaram os mouros e matarão em seu serviço, deseja pera seu credito estar neste concilio em nome dos de Vossa Alteza, com qualquer merce que lhe faça se contentara. Tem letras e boa vida... »2 Este companheiro de Frei Luiz de Souto Mayor era o bispo de Vizeu, D. Jorge de Athayde, que Filippe II comprou pela promessa do barrete de cardeal; em um seu Memorial lêemse estas vergonhosas palavras: «Sua Magestade escreveu a D. Christovam de Moura, antes que fosse Rei de Portugal, que me promettesse um Capello; e disto teve elle carta particular... Depois que Sua Magestade entrou em Portugal, nunca tive outro requerimento com Sua Magestade, senão que me fizesse esta mercê, porque não pretendia ou tra d'elle; etc. » 3 D. Fernão Martins Mascarenhas era nomeado reitor da Universidade em provisão de 15 de maio de 1586, em que Filippe II o confirmava. Não nos admira pois a reintegração de Frei Luiz de Souto

1 Corpo diplomatico portuguez, t. ix, p. 358.

2 Ibidem, p. 453.

3 Este curioso Memorial, onde se vê quanto Filippe п sabia ludibriar os infames que o serviam, acha-se transcripto no Compendio historico, p. 22 a 37. Bem merecia ser tirado d'aquella opaca dissertação official.

Mayor, que significa o valimento dos seus protectores junto do monarcha invasor, e a preponderancia dos Jesuitas na Universidade.

A má vontade de Filippe II contra a Universidade era latente, e sob qualquer motivo revelar-se-ia; por provisão de 9 de março de 1583 fôra Manuel de Quadros nomeado visitador e reformador da Universidade, e, além do encargo da reforma dos estatutos, vinha tratar da edificação de novas escholas no bairro de S. Pedro, para se estabelecerem ali as aulas, segundo antigo plano. Orçadas as obras, conheceuse que a Universidade não tinha recursos para emprehendel-as; em janeiro de 1584 o visitador foi chamado a Lisboa, e em novembro d'esse anno uma carta régia estabeleceu que os negocios da Universidade se não tratassem n'ella, mas em Lisboa, em um conselho presidido pelo cardeal archiduque, com a assistencia de dois adjuntos. Apresentou-se o pedido a Filippe II para a cedencia do paço real, onde havia mais de quarenta annos estavam as aulas da Universidade. Filippe II mandou responder: «que ainda que desejava fazer muitas mercês á Universidade, não lhe era conveniente dar-lhe os Paços, antes pelo contrario, estava resolvido a mandal-os concertar para seu uso, logo que a Universidade os desoccupasse.» 1 Pouco depois extorquia-lhe um emprestimo forçado de 15:000 cruzados. E como a occasião de usar os paços reaes de Coimbra nunca chegava, Filippe I lembrou-se reduzil-os a dinheiro, propondo a venda d'elles á Universidade, pela quantia de 30:000 cruzados, juntamente com as regalias de paços reaes, e sem que em tempo algum se pudesse allegar lesão da sua parte. A venda effectuou-se em 16 de setembro de 1597, sendo o titulo d'esse contracto uma gloriosa pagina de tão digno Protector da Universidade. 2 A

1 Apud Villa Maior, Exposição succinta, p. 90.

2 Transcrevemos em seguida essa carta de venda: «ElRey Nosso sur por a Vniuersidade atee aguora não ter casas proprias, é eschollas como conuem, é por sua coroa, fazenda, é patrimonio real ter pouca necessidade dos passos em q. per merce sua, é dos reis passados se lem as faculdades maiores. Os quaes se a Vniuersidade nao sostentára, é repairara co muitas bemfeitorias é grandes despezas q. á sua custa nelles fez esteuerao arruinados, é caidos como os mais deste Reyno, é por ser mais conueniente com o preço, é ualia dos ditos passos accudir a alguas necesidades geraes, é importantes ao bem commu, é por outros justos respeitos q. a isso o mouerao depois de muita deliberaçao é conselhos q. sobre, isto precederaõ assi neste Reyno como em Madrid; ouue por bem mandar uender os ditos passos a Vniuersidade pera o q. mandou passar sua prouisao q. se tresladaraa no fim da escriptura. Em comprimento da qual prouisão os señores Veadores da fazenda de S. Magde em seu nome, é de seus successores uendem os ditos passos a Vnde, é em

má vontade de Filippe II reappareceu em Filippe III, que planeara acabar com as principaes Escholas e Collegios em Portugal, nos principios do seculo XVII, e exigia á Universidade de Coimbra o pagamento das propinas de doces dos doutoramentos, mudando depois esse encargo em uma contribuição annual de substancias cheirosas.

O pensamento das missões rapidamente se transformou no animo do lucro mercantil, nas regiões descobertas pelos grandes navegadores dos seculos XV e XVI; o geral Aquaviva obteve de Gregorio XIII a faculdade de poder a Companhia de Jesus commerciar nas Indias, e o privilegio exclusivo das missões no Japão. E não se contentando essa

nome della a seus procuradores per virtude da procuraçao q. iraa tresladada, assi como estao entrando pello terreiro com todas as casas, é cousas a elles pertencentes, annexas, é juntas como sao as casas em q. ora estao os collegiaes de sao Pedro, quintaes, estrebarias, cozinhas, açougues co todas as mais pertenças, direitos, seruentias, logradouros, preeminençias, é prerrogatiuas de passos reaes pera que a dita Vniuersidade d'hoje em diante aja tudo, logre, é possua como cousa sua propria mudando, é alterando em tudo, é em parte como lhe parecer.

«O preço sao trinta mil cruzados sem mais outro algu direito, nem tributo pagos pello modo q. a prouisão relata: quinze mil q. a Vniuersidade ja tem dado de q. os papeis, é conhecimentos se entregarao logo ao tempo q. se assinar o contrato, é os outros quinze mil em dinheiro de contado se entregarao no mesmo tempo, é de todos se dará a quitação na propria escriptura.

«Em caso q. os ditos passos possao ualer, é de feito ualhaõ mais q. os ditos trinta mil cruzados S. Mag de faz a Vniuersidade merçe de tudo o q. mais for tendo respeito a ser de sua immediata proteição, é ao grande proueito q. della reçebem estes seus Reinos.

«Que S. Mag de é seus successores auerao sempre por boa esta uenda, e sendo caso que o procurador da sua Coroa, ou de sua fazenda, ou qualqr'outra pessoa, ou ministro em nome de S. Mag de ou de seus successores por algua via ordinaria, ou extraordinaria pretenda uir, ou dizer contra este contracto nao seraa ouuido, sem primeiro entreguar em mao do Reitor e deputados da Vniuersidade q. ao tal tempo forem todo o dito preço de trinta mil cruzados, é mais o ualor das benfeitorias.

«Sendo caso q. a Vniuersidade em algu tempo çesse, ou se mude por algua uia, os ditos passos, é mais pertenças sobreditas no estado, é forma em que esteuerem lhe pertençerao como os mais bens, é propriedades q. tem pera delles dispor, é fazer o q. lhe bem uier como cousa propria segundo seus statutos. Que os ditos passos em todo o estado, é forma q. estiuerem conseruarao, é reteraõ (emquanto for proueito da Vniuersidade é ella quizer) as preeminençias, é qualidades, é prerrogativas de passos reaes dos quaes em todo tempo poderá uzar, assi contra todas as pesoas, communidades, moesteiros, ou collegios q. per qualqr' uia quizerem aleuantar, ou atee agora ajaõ aleuantado algus edificios, é que ao diante fezerem, ou ajao atee agora feito algua obra em prejuizo da uista, seruentias, é liberdades dos ditos passos, é mais pertenças sobre ditas, como pera todos os outros effeitos que forem em proueito da dita Vniuersidade.

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