Imagens das páginas
PDF
ePub

· A virgem pálida e triste,
De branda melancolia,
Que as penas nos alivia,
Que nos mitiga a paixão!

«Tens ao teu lado a saudade
Falando-te em voz dolente,
Duma memória recente,
Duma luz que se apagou...
Luz que tomaste por guia
Para termo de viagem;

Mas que o sôpro duma aragem,
Branda, apenas, apagou.»

Estamos chegados quási ao fim da digressão através das cartas em verso que anualmente Júlio Denis dirigia a seu primo José Joaquim Pinto Coelho. O que delas colhemos para o estudo íntimo do poeta e romancista tem um incontestável valor documental. Além disso, pudemos dar aos leitores, nas pequenas transcrições feitas, o regalo da leitura de páginas inéditas, algumas delas cheias de relêvo literário. Júlio Denis não deixou sempre, em cada um dêsses documentos, as impressões do ano decorrido. Por vezes, traduz apenas o estado transitório e de momento da sua afectividade atingida pelos pezares próprios e da família de seu primo, com quem vivia na intimidade de irmão.

São expansões em que não há sombra de constrangimento; pedaços da sua vida que registou com uma sinceridade que rivaliza com

a sua bondade e tranquilidade íntimas. Olhando para o passado, êle o diz, não tem motivos para remorsos. Poucos o poderão dizer, mesmo nessa idade!

Em 1866 escreve êle a sua última carta ri

mada. É curta, dá mesmo a impressão de que é um pouco forçada. O hábito estava contraído; era preciso honrá-lo.

Nestas poucas estâncias transparece, porém, a dolorosa impressão que o progredimento do mal lhe trazia. São as ilusões que começam a emigrar. É a realidade a despertá-lo com a crueldade de um carrasco. E, contudo, é nesse ano que o seu primeiro romance publicado, as Pupilas, lhe faz alcançar, num momento, um nome de relêvo nas letras pátrias. O triunfo e a glória chegam; mas Júlio Denis fica indiferente.

Fechamos êste capítulo com a publicação, na integra, dessa pequena carta:

«Veste-se a planta de flores
Quando a primavera assoma;
E a espessura de verdores
Perfuma com seu aroma.

«Mas nem sempre a mesma vida
Transluz nas flores abertas;
Uma seiva empobrecida

Só lhes dá côres incertas.

«Todos os anos floresce, Ao despertar êste dia,

A planta que, ignota, cresce, Da minha pobre poesia.

«Porém, desta vez, roçada
Do mal, pela mão funesta,
Uma flor só, desmaiada,
Abriu para a tua festa.

«Mas seja o tributo pago, Embora com pobre oferta; Essa mesma aí a trago, Desbotada e mal aberta.>>

XIII

O ROMANCISTA

S romances de Júlio Denis são a mais alta expressão do seu talento. Nunca os produziu de afogadilho. No seu valioso espólio literário encontram-se, quer entre os Inéditos já publicados, quer em outros ignora dos do público, resumos e duplicações dos seus trabalhos definitivos.

Por vezes tracejava o plano geral; e é assim que possuimos o escôrço de alguns capítulos de um romance histórico cuja acção se devia passar nas côrtes de D. João II e de D. Manuel I e que foi dado à estampa nos Inéditos e Esparsos (1).

(1) Júlio Denis, Inéditos e Esparsos, ed. cit., vol. I, pág. 70.

« AnteriorContinuar »