Imagens das páginas
PDF
ePub

DO CANTO SEXTO

Sahe Vasco da Gama de Melinde, e cm quanto navega prosperamente, desce Baccho ao mar: descripção do Palacio de Neptuno: convcea o mesmo Baccho os deoses maritimos, e lhes persuade destruão aes navegantes: em quanto isto se passa, refere Velloso, per entreter aos seus con panheiros, a historia dos deze de Inglaterra: levanta-se horrorosa tormenta: he aplacada por Venus, e pelas Nymphas com honança chegão finalmente a Calecut, ultimo, e desejado termo desta navegação.

OUTRO ARGUMENTO

Parte-se de Milinde o illustre Gama,
Com Pilotes da terra, e mantimento:
Desce Lyeo ao mar, Neptuno chama
Todos os deoses do humido elemento:
Conta Velloso aos seus dardo honra, e fama,
Dos (deze de Inglateria o vencimente:
Soccorre Verus a fligida armada,
E á India chega tanto desejada.

OS LUSIADAS

CANTO SEXTO

Não sabia em que modo festejasse

O Rei pagão os fortes navegantes,
Para que as amizades alcançasse
Do Rei Christão das gentes tão possantes;
Peza-lhe que tão longe o aposenlasse
Das Europeas terras abundantes
A ventura, que não no fez visinho
Donde Hercules ao mar abrio o caminho.

II

Com jogos, danças, e outras alegrias,
A segundo a policia Melindana,
Com usadas e ledas pescarias,
Com que a Lageia Antonio alegra, e engana,
Este famoso Rei, todos os dias,
Festeja a companhia Lusitana,
Com banquetes, manjares desusados,
Com fructas, aves, carnes, e pescados.

III

Mas vendo o Capitão que se detinha
Ja mais do que devia, e o fresco vento
O convida que parta, e tome asinha
Os pilotos da terra, e mantimento,
Não se quer mais deter, que ainda tinha
Muito para cortar do salso argento;
Já do Pagão benigno se despede,
Que a todos amizade longa pede.

IV

Pede-lhe mais, que aquelle porto seja
Sempre com suas frotas visitado:
Que nenhum outro bem maior deseja,
Que dar a taes barões seu reino e estado:
E que em quanto o seu corpo e espirito reja,
Estará de contino apparelhado

A pôr a vida, e reino totalmente,
Por tão bom Rei, por tão sublime gente.

V

Outras palavras taes the respondia
O Capitão, e logo, as velas dando,
Para as terras da Aurora se partia,
Que tanto tempo ha já que vai buscando,
No piloto que leva não havia
Falsidade, mas antes vai mostrando
A navegação certa, e assi caminha
Já mais seguro do que d'antes vinha,

VI

As ondas navegam do Oriente

Já nos mares da India, e enxergavam
Os thalamos do Sol. que nasce ardente;
Ja quasi seus desejos se acabavam,
Mas o mao de Thyoneo, que na alma seate
As venturas, que então se apparelhavam
A' gente Lusitana, dellas dina..
Arde, morre, blasphema, e desatina.

VII

Via estar todo o Ceo determinado
De fazer de Lisboa nova Roma:
Não no pode estorvar, que destinado
Está d'outro poder que tudo doma.
Do Olympo desce em fim desesperado.
Novo remedio em terra busca, e toma:
Entra no humido reino, e vai-se à corte
Daquelle a quein o mar cahio ein sorte

-VIII

No mais interno fundo das profandas
Cavernas altas, onde o mar se esconde,
Lá donde as ondas sahem furibundas,
Quando ás iras do vento o mar responde,
Neptuno mora, e moram as jucundas
Nereidas, e outros deoses do mar, onde
As aguas campo deixam ás cidades.
Que habitam estas humidas deidades.

IX

Descobre o fundo nunca descoberto
As areas alli de prata fina;
Torres altas se vêm no campo aberto
Di transparente massa crystallina:
Quando se chegam mais os olhos perto,
Tanto menos a vista determina
Se he crystal o que vê, se diamante,
Que assi se mostra claro e radiante.

X

As portas d'ouro fino, e marchetadas
Do rico aljofar que nas conchas nace,
De escultura formosa estão lavradas,
Na qual do irado Baccho a vista pace:
E vê primeiro em cores variadas
Do velho chaos a tão confusa face;
Vem-se os quatro elementos trasladados,
Em diversos officios occupados.

XI

Alli sublime o Fogo estava em cima,
Que em nenhuma materia se sostinha;
Daqui as cousas vivas sempre anima,
Despois que Prometheo furtado o tinha.
Logo apos elle leve se sublima
O invisibil Ar, que mais asinha
Tomou lugar, e nem por quente, ou frio,
Algum deixa no mundo estar vazio.

« AnteriorContinuar »