D'est'arte se esclarece o intendimento, Que experiencias fazem repousado; E fica vendo, como de alto assento, O baixo tracto humano embaraçado: Este, onde tiver força o regimento Direito, e não de affeitos occupado, Subirá (como deve) a illustre mando, Contra vontade sua, e não rogando.
Ja se viam chegados juncto á terra, Que desejada ja de tantos fora, Que entre as correntes indicas se encerra, E o Ganges, que no ceo terreno mora. Ora sus! gente forte, que na guerra Quereis levar a palma vencedora, Ja sois chegados, ja tendes diante A terra de riquezas abundante.
A vós, o' geração de Luso (digo) Que tam pequena parte sois no mundo; Não digo inda no mundo, mas no amigo Curral, de quem governa o ceo rotundo: Vós, a quem não somente algum perigo Estorva conquistar o povo immundo; Mas nem cubiça, ou pouca obediencia Da Madre, que nos ceos stá em essencia:
Vós, Portuguezes poucos, quanto fortes, Que o fraco poder vosso não pesais ; Vós, que á custa de vossas varias mortes
A lei da vida eterna dilatais:
Assi do ceo deitadas são as sortes, Que vós, por muito poucos que sejais, Muito façais na sancta christandade: Que tanto, o' Christo, exaltas a humildade!
Vêdel-os Alemães, suberbo gado;
Que per tam largos campos se apascenta Do successor de Pedro, rebellado
Novo pastor, e nova seita inventa: Vêdel-o em feas guerras occupado, (Que inda co'o cego error se não contenta!) Não contra o suberbissimo Othomano, Mas por sair do jugo soberano.
Vêdel-o duro Inglez, que se nomea Rei da velha e sanctissima cidade, Que o torpe Ismaelita senhorea, (Quem viu honra tam longe da verdade!) Entre as boreaes neves se recrea ;
Nova maneira faz de christandade: Pera os de Christo tem a espada nua, Não por tomar a terra, que era sua.
Guarda-lhe por emtanto um falso rei A cidade Hierosólyma terreste; Em quanto elle não guarda a sancta lei Da cidade Hierosólyma celeste. Pois de ti, Gallo indino, que direi ? Que o nome Christianissimo quizeste, Não pera defendel-o, nem guardal-o; Mas pera ser contra elle, e derribal-o!
Achas que tens direito em senhorios De christãos, sendo o teu tam largo e tanto; E não contra o Cinypho, e Nilo, rios Inimigos do antiguo nome santo? Alli se hão de provar da espada os fios Em quem quer reprovar da igreja o canto. De Carlos, de Luis, o nome e a terra Herdaste, e as causas não da justa guerra?
Pois que direi d'aquelles, que em delicias, Que o vil ocio no mundo traz comsigo, Gastam as vidas, logram as divicias, Esquecidos de seu valor antigo? Nascem da tyrannia inimicicias, Que o povo forte tem, de si imigo: Comtigo, Italia, fallo, ja sumersa Em vicios mil, e de ti mesma adversa.
O'miseros christãos! pela ventura, Sois os dentes de Cádmo desparzidos, Que uns aos outros se dão a morte dura, Sendo todos de um ventre produzidos? Não vêdes a divina sepultura Possuída de cães, que sempre unidos Vos véem tomar a vossa antigua terra, Fazendo-se famosos pela guerra?
X.
Vêdes que teem por uso, e por decreto, (Do qual são tam inteiros observantes) Ajunctarem o exército inquieto
Contra os povos, que são de Christo amantes: Entre vós nunca deixa a fera Aleto De semear cizânias repugnantes : Olhai se estais seguros de perigos, Que elles e vós sois vossos inimigos.
Se cubica de grandes senhorios Vos faz ir conquistar terras alheias,
Não vêdes que Pactólo, e Hermo rios, Ambos volvem auríferas areias?
Em Lydia, Assyria, lavram de ouro os fios; Africa esconde em si luzentes veias: Mova-vos ja sequer riqueza tanta, Pois mover-vos não pode a Casa-santa.
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