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« Olha as portas do estreito, que fenece
No reino da secca A'dem, que confina
Com a serra d' Arzira, pedra viva,

Onde chuva dos ceos se não deriva.

«Esta cidade está edificada nas baixas raízes de uma serra mais notavel, e conhecida de todas estas praias. A'dem jaz em 12 graus e. » D. JOÃO DE CASTRO, Roteiro, pag. 28 e 29.

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EST. CI.

Quando as galės do Turco, e fera armada

Virem de Castel-Branco nua a espada.

Elle destruiu, juncto a Ormuz, uma grossa armada de Mouros, Turcos e Persas.

EST. CII.

« Olha o cabo Asabóro, que chamado
Agora é Moçandão dos navegantes :
Per aqui entra o lago que è fechado

De Arábia, e persias terras abundantes.

« É boa e simples descripção do Seio-Persico. O termo lago está sem accidente algum, e com razão, visto não haver circumstancia notavel que o distinga. Aqui significa lago propriamente mar. A phrase é corrente e harmoniosa. >>

FRANCISCO DIAS GOMES, Analyse, pag. 239.

EST. CIII.

"Mas ve a ilha Gerúm, etc.

Assim chamam os Persas a ilha de Ormuz.

EST. CIV.

«< Aqui de dom Philippe de Menezes
Se mostrará a virtude em armas clara,
Quando com muito poucos Portuguezes
Os muitos Párseus vencerá de Lara.

D. Philippe, com poucos soldados, rompeu uma numerosa hoste, que abalara de Laristan, provincia persica, em auxilio d'Ormuz. A cidade Lar ou Lahar, denominada Lara per Camões, é vultosa, em razão de suas manufacturas e estofos de seda.

EST. CVIII.

<< Um reino mahometa, outro gentio,
A quem tem o Demonio leis escritas.

Os Vedes ou Vedas, e o Alcorão ou Corão. Os primeiros são os livros sagrados das nações do Indostão. O Alcorão contem a lei de Mafoma. Al é o artigo arabe, corão significa leitura «a leitura excellentissima.»

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Do corpo de Thomẻ, varão sagrado,

Que a Jesu-Christo teve a mão no lado.

Eis o que se achou escripto acerca de san' Thomé n'uma pedra antiquissima :

" Despois que appareceu a lei dos christãos no mundo, d'alli a trinta annos, a vinte um de dezembro, morreu o Apostolo san' Thomé em Meliapor, onde houve conhecimento de Deus, e mudança de lei, e destruição do demonio. Este Deus ensinou a doze Apostolos, e um d'elles veio a Meliapor com um bordão na mão, onde fez um templo; e el-rei do Malabar, Choromandel, e Pandi, e outros de diversas nações, e seitas, se sujeitaram voluntariamente á lei de Thomé. Veio tempo em que o sancto foi morto per mãos de um Bramane, e com seu sangue fez esta cruz. »

JACINTO FREIRE DE ANDRADA, Vida de D. João de Castro.

N'esta oitava lê-se varão e n'outras barão: de ambos os modos corre impresso em as numerosas edições dos Lusiadas. A quem devemos attribuir esta irregularidade orthographica, ao Poeta ou aos typographos ?

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Segundo um escriptor moderno, Meliapor, em idioma malabar, significa pavão.

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EST. CX.

Forças d'homens, de ingenhos, de alifantes.

Alifantes, e não elefantes é como escreveram e pronunciaram os coevos a Camões. Exemplo:

« Olha o grande poder de armas, e gente,

De espantosos e armados alifantes.

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JERONIMO CORTE REAL, Cerco de Diu, cant. 21.

EST. CXIII.

<< O principal, que ao peito traz os fios.

Os fios, insignia dos Bramanes : consiste n'uma linha dobrada em tres fios, lançada a tiracollo dês o hombro esquerdo para o lado direito.

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« Te nemus Anguitiæ, vitred te Fucinus undá,
Te liquidi flevere lacus. ..... »

Eneida, liv. VII. v. 759, etc.

« Illum etiam lauri, illum etiam flevére myricæ,
Pinifer illum etiam sold sub rupe jacentem
Mænalus et gelidi fleverunt saxa Lycæi. »

Ecloga x.

« Onde é que se pode achar uma força de pathetico tam cheia de interesse tam amavel e enternecido como n'esses a todos os olhos maravilhosos versos de Camões? Este artificio de expressado é logar commum summamente nobre e ingenhoso, usado de todos os poetas antiguos e modernos, e em especial do mesmo Camões. >>

FRANCISCO DIAS GOMES, Analyse, pag. 266.

EST. CXXIV.

« Dizem, que d'esta terra, co' as possantes
Ondas o mar entrando, dividiu

A nobre ilha Samátra, que ja d'antes
Junctas ambas a gente antigua viu.

A' similhança do que da Sicilia narra Virgilio na Eneida, liv. III, v. 414, etc.

EST. CXXVI.

<< Que Gueos se chamam de selvages vidas.

Os nossos bons escriptores costumavam n'este e outros vocabulos de igual desinencia, supprimir o m no singular e o n no plural. Como o comprova o seguinte exemplo:

>> Nubios, e Garamantes, e os selvages

Trogloditas, etc.»

JERONIMO CORTE REAL, Naufragio de Sepulveda, cant. 2.

EST. CXXVIII.

<< Este receberá placido e brando

No seu regaço o canto, que molhado

Vem do naufragio triste e miserando,

Dos procellosos baixos escapado.

« Em logar de cantos que molhados no segundo verso, e de escapados no quarto, como lêem as duas edições de 1572, e muitas das que se fizeram depois (não assim a de 1651), corrigimos como vai no texto; por assim o pedir a rhyma, e o são juizo. E é para se notar, tenham hesitado em fazer uma tal correcção, e tam palpavel, editores que se julgaram auctorisados para fazerem outras muito mais substanciaes. » (Nota do atilado editor da edição Rollandiana.)

<< Das fomes, dos perigos grandes, quando

Será o injusto mando executado

N' aquelle, cuja lyra sonorosa

Será mais afamada, que ditosa.

«O grande Camões; isto é, o maior homem de Portugal, viveu sempre

na maior miseria, do fundo da qual se fez notavel pelo seu ingenho; e jazendo os Crassos do seu tempo (que tanto o desprezaram) no mais profundo esquecimento, o seu nome é pronunciado no mundo com admiração e respeito.>>

FRANCISCO DIAS GOMES, Obras poeticas, pag. 44.

EST. CXXX.

« Olha o muro, e edificio nunca crido,

Que entre um imperio, e o outro se edifica.

«Este muro vi eu algumas vezes, e o medi, que é per todo geralmente de seis braças de alto, e quarenta palmos de largo no mociço da parede; mas das quaes braças pera baixo corre um entulho a modo de terrapleno alamborado da face de fóra de um betume como argamassa de mais largura que o mesmo muro, per onde fica sendo tam forte que vem mil basiliscos o poderão derrubar e em logar de tôrres ou baluartes, tem umas guaritas de dous sobrados armados sobre esteios de pau preto, a que elles chamam Caubesy, que quer dizer, pau-ferro, de grossura de uma pipa cadaum, e muito altos: por onde estas guaritas parece que ficam sendo muito mais fortes que se foram de pedra e cal. Este muro, ou chanfacau, como elles (Chins) lhe chamam, que quer dizer resistencia forte, corre todo o fio igualmente até entestar nos agros das serras, que no caminho se lhe offerecem ; as quaes pera poderem tambem servir de muro vão todas chanfradas ao picão; com que esta obra fica sendo muito mais forte que o mesmo muro em si. E assi se ha de intender que em toda esta distancia de terra não ha mais muro que o que toma os espaços que ha entre serra: no mais as mesmas serras servem de muro. E em todas estas trezentas e quinze leguas não ha mais entradas que so cinco, que os rios da Tartaria fazem per estas partes; pelos quaes descendo com impetuosa corrente, com que cortam per este sertão espaço de mais de quinhentas leguas, se vão metter no mar da China, e da Cauchenchina.» FERNAN' MENDES PINTO, Peregrinações, cap. 95.

"

EST. CXXXII.

Aqui ha as aureas aves que não decem

Nunca á tarra, e so mortas apparecem.

Allude o Poeta n'esses dous versos ás aves chamadas do Paraíso.

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Do cheiroso liquor, que o tronco chora.

É o beijoim, especie de gomma ou de rezina aromatica.

EST. CXXXVI.

"Nas ilhas de Maldiva nasce a planta,

No profundo das aguas soberana,

Cujo pomo contra o veneno urgente

É tido por antidoto excellente.

É o coqueiro das Maldivas.

EST. CXXXVII.

« Aonde sahe do cheiro mais perfeito

A massa, ao mundo occulta e preciosa.

Falla Camões do ambar, o qual apparece arrojado pelo mar nas costas orientaes de Africa, e ilhas circumvisinhas.

EST. CXXXVIII.

«Eis-aquí as novas partes do Oriente
Que vós outros agora ao mundo dais,
Abrindo a porta ao vasto mar patente,
Que com tam forte peito novegais.

«Quadro sublime, proprio da magestade epica. O exemplo está no terceiro verso, do qual tudo quanto se disser em seu louvor é diminuto; e bem mostra ser producção do maior alento poetico que em toda a Hespanha se tem visto até aos nossos dias. Sublimidade, e harmonia são as graças de tam bella poesia.>>

FRANCISCO DIAS GOMES, Analyse, pag. 292.

EST. CXXXIX.

« Vêdes a grande terra,

que contina

Vai de Callisto ao seu contrario pollo,
Que suberba a fará a luzente mina

Do metal, que a côr tem do louro Apollo.

Camões allude á America.

EST. CXL.

<< Ao longo d'esta costa, que tereis,
Irá buscando a parte mais remota
O Magalhães, no feito com verdade
Portuguez, porém não na lealdade.

Fernan' de Magalhães Portuguez, aggravado d'el rei D. Manuel, se passou a Castella, d'onde partiu com cinco vélas para as ilhas de Maluco, em cuja viajem descobriu o Estreito, que de seu nome se chama de Magalhães.

EST. CXLI.

« D'uma estatura quasi gigantea

Homens verá, da terra alli visinha.

Cognominam-se os habitantes d'essa região Patagões. Os primeiros viajores que la arribaram, avaliaram-os gigantes.

EST. CXLV.

O favor com que mais se accende o ingenho,
Não o dá a patria, não, que está meltida
No gosto da cubiça, e na rudeza

D'uma austera, apagada e vil tristeza.

« O sentido d'estes versos moralisa altamente. Nas terras onde as artes não florescem, onde a cubiça, e a riqueza valem por todas as virtudes, em logar d'um nobre orgulho, e alegria sublime nascida da cultura das

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