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artes, que so podem dar elevação ao espiritu, e verdadeiro contentamento, somente se mostra a seccura da tristeza de uma alma hydropica de cubiça e abrasada da sêde de ouro que a devora. Esta enfermidade moral é muito conhecida, e onde mais reina a ignorancia. »

FRANCISCO DIAS GOMES, Analyse, pag. 112 e 113.

EST. CXLVI.

E não sei per que influxo do destino, etc.

Outras edições trazem:

E não sei per que influxo de destino, etc.

EST. CXLVII.

A perigos incógnitos do mundo,

A naufragios, a peixes, ao profundo.

«< Esta pintura representa o sugeito pela sua qualidade : é uma construcção á maneira dos Latinos, na qual se suppre o substantivo intellectualmente per ellipse. »

FRANCISCO DIAS GOMES, Analyse, pag. 242.

EST. CXLVIII.

Por vos servir a tudo apparelhados,
De vós tam longe, sempre obedientes
A quaesquer vossos ásperos mandados,
Sem dar resposta, promptos e contentes.
So com saber que são de vós olhados,
Demonios infernaes, negros e ardentes
Commetterão comvosco; e não duvido
Que vencedor vos façam, não vencido.

« A lealdade dos Portuguezes, afamados per todo o mundo, alem de se mostrar em muitas cousas, se ve claramente na conquista de Africa, e Asia, que tendo elles conquistadas muitas cidades e grandes reinos, e ganhadas as Indias, até o cabo do mundo, aonde fizeram em armas façanhas tam espantosas que excederam as dos Gregos e Romanos, e alcancaram pera si perpetua memoria, nunca la houve Portuguez que se levantasse ou rebeliasse a seu rei: o que nunca me lembra que lêsse de nenhuma outra nação. »>

FREI HEITOR PINTO, Imagem da vida christâ, pag. 200.

EST. CL.

Todos favorecei em seus officios,

Segundo teem das vidas o talento.

« Os premios movem as vontades, e estas fazem os artificios, os quaes despois o amor da profissão convida a fructificar em beneficio commum. » GASPAR ESTAÇO, Antiguidades de Portugal.

«Uma das virtudes de que foi louvado o grande Constantino foi, que aos homens baixos, a quem quiz bem, antes que fosse imperador, despois d'alcançado o imperio, lhe fez mercê de dinheiro, mas não de officio da

republica, salvo aos que pera isso tinham habilidade e merecimento: «< porque (dizia elle) que os cargos publicos, e magistrados, não se ha viam de dar per affeição, mas per razão. »

FREI HEITOR PINTO, Imagem da vida christã.

EST. CLIV.

Nem me falta na vida honesto estudo,
Com longa experiencia misturado,
Nem ingenho; que aqui vereis presente,
Cousas que junctas se acham raramente.

« A grande e altissima epopea do divino Camões é para a nação portugueza de tanta ou de maior gloria, que o assumpto da mesma. >> FRANCISCO DIAS GOMES, Obras poeticas, pag. 293. EST. CLV.

So me fallece ser a vós acceito.

Outras edições trazem:

So me fallece ser de vós acceito.

EST. CLVI.

Os muros de Marrocos, e Trudante.

Em algumas edições lê-se:

Os Mouros de Marrocos, e Trudante.

Adoptei esta segunda lição, por me parecer mais exacta que a primeira. De sorte que Alexandro em vós se veja,

Sem á dita de Achilles ter inveja.

«Todos esses bellos conselhos foram baldios; por quanto as grandes victorias que se alcançaram na India, e outras similhantes, que cada dia se ouviam de Africa, e o animo, e inclinação natural d'el-rei D. Sebastião, The involviam o pensamento em grandes empresas, crendo que pois a seus capitães eram possiveis de alcançar as que o mundo celebrava por estranhas, lhe ficava a elle obrigação de emprender outras tam differentes d'aquellas, como elle o era de quem as alcançava.

Pera este fim mandou alistar gente de guerra per todo o reino, repartir armas, eleger capitães, e officiaes de milicia, que exercitassem a gente, e fazer todas as mais cousas convenientes a seus intentos.

A esta inclinação d'el-rei se ajunctou a ordinaria invenção dos privados, que buscando modo de o contentar conformando-se com ella, e vendo n'elle a de armas, e guerra, lhe engrandeciam sua potencia, e fingiam, em discursos militares, abatidas a seus pés as bandeiras africanas, e posta sobre sua cabeça a coroa de Marrocos.

Levado das quaes persuasões fez uma jornada aos logares de Africa tam desacompanhado de soldados, e mais cousas necessarias pera fazer cousa de importancia, que com nome de visitar aquellas fronteiras, se tornou ao reino não arrependido de seu intento, mas com dobrada vontade de o executar.

Ao que lhe abriu caminho Mulei Mahameth, rei de Marrocos que, havia pouco, fôra lançado de seu estado per Mulei Abdelmelech, e se veio valer de seu soccorro, promettendo-lhe vassallagem.

Ordenou-se a partida com grande repugnancia dos fidalgos antiguos, que tinham experiencia das cousas da guerra, e muito applauso dos que viam agradar-se el-rei de suas confianças, e abonações; mas ja se faziam de modo, que se deixava ver n'elles uma tristeza manifesta; porque nunca se persuadiram que a jornada viesse a effeito, nem se executassem seus conselhos: mas quando ja viram o fruito d'elles, dissimulavam com sua magoa, não se atrevendo a reprovar o que elles proprios tinham ordenado. Concluiu-se emfim a jornada com tam pouca ordem, e tam grandes despesas, que as pessoas experimentadas na guerra adivinhavam d'estes principios o successo que veio a ter.

Levou quasi onze mil Portuguezes, e os mais d'elles pouco exercitados na guerra, e alguns Alemães, e Flamengos, e outras nações estrangeiras, que por todos seriam seis mil: e com este pequeno exercito passou em Africa, onde em poucos dias, cahiu el-rei no engano, com que alguns privados seus lhe engrandeciam as forças, e riquezas de seu reino; porque começaram a faltar pagas pera os soldados.

Mas como era de animo grande, e se via entre dous extremos taes, como eram aventurar-se a uma batalha dada com vantagem notoria do inimigo, ou tornar-se a seu reino, necessitado da falta de dinheiro, e mantimentos, sem outro effeito de tam grande apparato, escolheu o mais arriscado, e menos affrontoso, e foi demandar o inimigo pelo sertão dentro pelejando com as calmas da Africa, com a terrivel sêde, e falta de refresco, e despois com um dos copiosos exercitos, que se viram n'aquellas partes, em que haveria bem dés Mouros pera um christão.

Deu-se a batalha do modo que vinham marchando, sem se entrincheirar o campo, nem fazer as fortificações costumadas. E como a mais da gente era bisonha (despois de mortos os soldados velhos que tiveram a victoria em dúvida per muito espaço, e a vanguarda inimiga desbaratada, se deixaram romper da furia dos barbaros, em quatro dias do mez de agosto do anno do Senhor de mil e quinhentos e setenta e oito.

Na qual se perdeu a nobreza, e reputação dos Portuguezes conservada per tanto numero de annos; e o que foi mais lamentavel, um rei de vinte e quatro annos, que (fóra de n'este caso acceitar poucos conselhos) era em tudo o mais ornado de virtudes, e dons naturaes convenientes a um justo e virtuoso principe.

Accrescentou a magoa d'esta perda ficar o reino sem successor, e serem os que alcançaram tammanha gloria os proprios que sempre foram tributarios aos rêis portuguezes.

Foi memoravel este recontro, por morrerem n'elle tantos rêis em menos de tres horas, que foram Mulei Abdelmelech, de sua doença (inda que outros me affirmaram que de uma bala de mosquete). Mulei Mahameth afogado em um rio, indo-se retirando; c D. Sebastião (dizem) que de feridas mortaes com que acharam o corpo atravessado, despois da batalha, e houve quem o reconhecesse, e venerasse por tal.

N'este fim vieram a parar aquellas grandes esperanças, que os Portu

guezes tinham em seu rei, e aquelles bons intentos que o moveram a emprender esta jornada contra os inimigos da fe catholica: tudo por seguir conselhos de quem os dava encaminhados mais a seus proprios interesses, que ao bem commum. Foi sua perda no dia e anno, que ja disse, aos 24 de sua idade, de que reinou vinte e um.

O corpo (assim como se achou na batalha) foi depositado em Alcacere; e d'ahi levado a Ceita; e ultimamente ao mosteiro de Belem, onde ao presente está.»

FREI BERNARDO DE BRITO, Elogios historicos dos réis de Portugal. Todas as pessoas admiradoras do homem de genio, podem (depois de haver lido os Lusiadas ) applicar a Camões as mesmas vozes que Francisco Dias Gomes applicou a Torcato Tasso ao ler estes bellissimos versos na invocação da Jerusalem:

O Musa, tu che di caduchi allori
Non circondi la fronte in Elicona,
Ma su nel cielo infra i beati cori

Hai di stelle immortali aurea corona, etc.

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« Venturoso d'aquelle que tem a felicidade de conceber partos tam admiraveis! Venham todos os trabalhos, todos os flagellos, com que a vida, sem amparo, nem protecção alguma costuma ser agitada, que para quem for d'este modo favorecido da natureza, não poderá haver calamidade que o consterne. >>

De algumas palavras que, por vindas do latim, ou por antiquadas, não
estão ao alcance de todos; precedidas de suas competentes explicações,
quaes se acham no diccionario da lingua portugueza, composto per
Antonio de Moraes e Silva.

CANTO PRIMEIRO.

Est. III. v. 5. Que eu canto o peito illustre lusitano (i. é, o animo, o valor).
Est. IV. v. 6. Um estylo grandiloquo e corrente (i, é, de grande eloquencia,
sublime, epico).

Est. IX. v. 3. Que ja se mostra, qual na inteira idade (i é, perfeita, com-
pleta).

Est. IX. v. 8. Em versos divulgado numerosos (i. è, em que se observa o
numero poetico).

Est. X. v. 4. Per um pregão do ninho meu paterno (i. é, patria, morada).
Est. X. v. 6. D'aquelles de quem sois senhor superno (i. é, excellente, so-
berano).

Est. XVI. v. 1. Em vós os olhos tem o Mouro frio (i. é, assustado, medroso).
Est. XVI. v. 2. Em quem ve seu exicio afigurado (i. é, ruina, fim, perdição
total).

Est. XVIII. v. 5. E vereis ir cortando o salso argento (i. é, o mar).

Est. XXII. v. 7. Com uma coroa, e sceptro rutilante (i. é, que reflecte luz
mui viva).

Est. XXIV. v. 2. Estellifero pólo, e claro assento (i. é, estrellado).
Est. XXXIV. v. 4. Onde a gente belligera se estende (i. é, guerreira).
Est. XXXVI. v. 6. Merencorio no gesto parecia (i. é, melancolico ou enfa
dado, carregado).

Est. XXXIX. v. 6. Porque emfim vem de estamago damnado (i. é, de animo).
Est. XLII. v. 2. Casa etherea do Olympo omnipotente (i. é, celeste).

Est. XLVII. v. 4. Outros, em modo airoso, sobraçados (i. é, mettidos de-
baixo do braço, para ahi segural-os).

Est. LVIII. v. 6. Pelas covas escuras peregrinas (i. é, estranhas, reconditas).
Est. LXVII. v. 7. Arcos, e sagittiferas aljavas (i. é, que levam settas).
Est. LXXII. v. 7. Na terra do obsequente ajunctamento (i. é, que obsequeia).
Est. LXXXVI. v. 3. Um d'escudo embraçado, e de azagaia (i. é, mettido o
braço pela embraçadeira do dito escudo).

Est. LXXXIX. v. 3. A plumbea péla mata, o brado espanta (i. é, a bala de
chumbo).

CANTO SEGUNDO.

Est. I. v. 7. Quando as infidas gentes se chegaram (i. é, não fieis, desleaes).
Est. II. v. 2. O mortifero engano, etc. (i. é, que traz ou causa a morte).
Est. IV. v. 2..... o aurifero Levante (i. é, que traz ouro ou o tem em suas
veias).

Est. IV. v. 4..... droga salutifera e prestante (i. é, que faz saude, saudavel).
Est. XII. v. 6..... Panchaia odorifera (i. é, que exhala vapor cheiroso, aro-
matico).

Est. XIII. v. 7....... rubido horisonte (i. é vermelho, arroxeado, ardente).
Est. XIV. v. 8. Dentro no salso rio entrar queria (i. é, salgado).

Est. XX. v. 2....... argenteas caudas (i. é, da côr de prata).

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