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ber a que ontem lhe escrevi. O correio fecha a mala às 4 horas da tarde e depois dêsse tempo é que eu a subscritei.

«Estou bom; ontem tive muito frio, mas o dia aparece hoje com melhor cara e pede-me desculpa de não me ter recebido amavelmente.

«Estou convencido que é uma imprudência confiar em S. Pedro para fazer viagens. O velho porteiro do céu não entende dessas coisas e, a-pesar de ter sido pescador, dá vento e chuva à gente, como se fôssem coisas muito. cómodas.

«Tu deves achar-me razão, se te lembrares daquela manhã passada em Ovar.

«Acabei agora de almoçar e não almocei mal. Ontem dormi de-véras e acho-me por isso melhor. Daqui a pouco vou passear. Não te posso dizer se já principiei a engordar, mas julgo que sim; contudo por emquanto ainda a roupa que

trouxe me serve.

«Escreve-me brevemente, dando-me notícias tuas, da mamã e dos manos. A todos me recomendo. Dize-me se o Guilherme já fèz exame e o que o Alberto faz por aí.

«E adeus que esperam por mim. Torno a repetir, escreve-me e não te esqueças do

«Felgueiras, 1/7/1865

«teu tio e muito teu amigo Joaquim»,

Anitas tinha nesta época 15 anos. A carta de Júlio Denis é já redigida em tam diferente daquelas que lhe escreveu em 1863. Carta ligeira, em que graceja com S. Pedro e com o tempo e em que lhe dá conta do seu estado de saúde, que já devia preocupar sua sobrinha, por ter ouvido, na sua roda familiar, opiniões desencontradas a tal respeito.

Devia ser resposta às preguntas e cuidados da Anitas nas cartas que lhe dirigia. Começava a ver na criança de ontem a mulherzinha de hoje, e essa nota reproduz-se constantemente daí em diante.

Assim, ocupa-se dos dois irmãozitos mais novos. Não o fazia nas cartas anteriores. Como que queria chamar a Anitas a desempenhar o lugar de protectora junto dêles, o que mais se acentua nas duas cartas seguintes.

Era essa trindade a sua preocupação máxima a dentro da família. Para ela iam os seus melhores disvelos e atenções.

X

«Anitas

«Principio a escrever-te esta carta sem saber ao certo se a mandarei hoje para o correio. A razão é porque tenho de saír e não sei se, quando voltar, ainda irei a tempo de a remeter.

Agora não o faço porque nem vagar tenho para a completar já. Estou de chapéu na cabeça e em ordem de marcha. Há dias escrevi ao Guilherme uma carta à qual êle ainda não respondeu. Não estou decidido a perdoar-lhe essa tão grave falta de cuidado. Espero que lho faças sentir.

«Agradeço-te o abraço que me mandaste e hoje, quando voltar do meu passeio, espero trazer-te um de igual natureza em paga do teu (1).

«Na tua última carta falavas-me em uma visita que ias fazer; quero saber os pormenores dessa visita.

«Manda-me também dizer se tens ido às terças-feiras lá por casa e se aos domingos tens ido à missa aos Congregados.

«Conta-me a vida do Alberto, a quem deve ter feito alguma falta o escritório de S. João Novo. ¿ Ele vai ainda ao Figueiredo? Dize-lhe que quando quiser vá lá pelo meu quarto e leve os livros que lhe parecer, que eu já dei ordem ao meu bibliotecário, para se não opor.

«<Sábado e domingo não estou provavelmente em Felgueiras; conto ir a Guimarães e às Caldas (2). Se me escreveres, podes contudo fa

(1) Junto a esta carta, e dentro dum envelope, está cuidadosamente guardado um abraço de vidé que o tempo tem poupado.

(2) Devem ser as Caldas de Vizela.

zê-lo para aqui, porque às vezes é provável que haja mudança...

«Eu para o fim do mês provavelmente volto para o Pôrto; em antes não, a não haver alguma razão mais forte que me obrigue a fazê-lo.

«Agradece por mim as recomendações que me mandaram, e a todos me recomendo também. «Quando puderes, escreve ao teu tio e muito amigo

«Felgueiras, 20 de Julho de 1865.

«P. S. Aí vai o abraço.»>

Joaquim.»

XI

«Anitas

«Recebi a meia carta que me escreveste, inspirada por um pouco de mau humor imperdoável. Eu por aqui tenho andado e passeado com o fim de me curar como um presunto.

«O certo é que, graças ao vento, sol e ar do mar, que tenho apanhado, estou negro, vermelho e feio de meter dó. Quando aí chegar ninguém me há de conhecer.

«Ao prazer que a tua carta me deu, podia muito bem reunir-se o de receber directamente

notícias tuas; mas julgaste desnecessário dizer-me se passavas bem, se não tinhas dor de cabeça, de dentes, sono, preguiça ou outra coisa assim.

«É verdade que se algum dêsses males que afligem a humanidade pesasse sôbre ti, não terias coragem de encher a terceira página daquela carta que tu e o papá me enviaram; mas emfim sempre é bom dizeres as coisas.

«Como vai a mamã? E como vão os teus irmãos? Aqui estão dois assuntos para meia página pelo menos.

«Agradeço-te a saúde que me fizeste e que eu espero pagar-te de hoje a vinte dias. Dize ao Guilherme que, se ainda fôr a tempo, lhe mando de cá os meus emboras pelos seus (?) anos; e ao Alberto que não me conserve nenhum vestígio de tosse quando eu voltar ao Pôrto.

«<Adeus; vou almoçar. Quando quiseres e poderes faze por escreveres que nisso me dás muito prazer. Se te guardares para quinta-feira é provável que já não me escrevas para Aveiro.

«Visitas para todos e acredita na sincera amizade do

«Aveiro, 17/9/66.

«teu velho tio

Joaquim.»

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