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que dissemos na est. 23 d'este canto, pag, 76 e nota 1);= Os formosos cabellos espalhou, espalhou os formosos cabellos ordem inversa (anastr.). Os formosos cabellos, os raios do sol (metaph.).

lim

a roxa entra

Vs. 3 e 4)-No ceu sereno, pelo ceu sereno. Sereno, pido, sem nuvens; abrindo, com o abrir; da, as portas do Oriente, como acima se disse. A mesma expressão veio já empregada na est. 28 do presente canto, pag. 87. Ao claro Hyperionio. Claro, brilhante, resplandecente; Hyperionio, (myth.) um dos nomes do Sol; -que acordou, que despertou, que acabou de nascer (metaph.).

Vs. 5 e 6) Começa, por começou (enallage). O presente do indicativo pode empregar-se em vez do preterito do indicativo em narrações animadas e seguidas (presente historico»). O verbo começar empregado como auxiliar d'um verbo no infinito (conjug. periphrastica), usa-se com a prep. de e mais geralmente com a prep. a. Exemplos do primeiro

caso:

Começaram de subir a um mesmo tempo.

Se começaram de recolher.

(Jac. Freire d'Andrade)

(Damião de Goes)

Exemplos do segundo caso, alem do da presente estancia do

poema:

Começou a explorar o campo.

(Jac. Freire d'Andrade)

Desde os peitos das amas...começaram a executar a

abstinencia.

(Fr. Luiz de Souza)

A embandeirar-se, cobrir-se de bandeiras, pendentes dos mas tros e das cordas dos navios. O prefixo em (bem como en

ou in) do verbo, designa guarnecimento, provimento, revestimento. E de toldos, etc. A prep. de, n'este logar, pode substituir-se por com, designando materia de que alguma cousa (a armada) é ornada. Toldos, peças de lona, que servem para abrigar do sol o convez dos navios;-alegres, de cores, vistosas, que alegram, agradam á vista (metonymia, o effei40 pela causa);--se adornou, se enfeitou, se ornamentou.

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Vs. 7 e 8) Por receber. Por, aqui, designa causa, motivo, fim; está por a fim de. Receber, acolher; e alegria e com mostras de satisfação, de jubilo. O Regedor, o mes mo que já dissemos no verso 6. da est. 55 d'este canto pag. 153; que partia, que ia embarcar na praia para se dirigir aos navios.

ESTANCIA LX

Partia alegremente navegando,

a ver as naus ligeiras Lusitanas, spele
com refresco da terra, em si cuidando
que são aquellas gentes inhumanas,
que, os aposentos Caspios habitando,
a conquistar as terras Asianas
vieram, e, por ordem do destino,
o Imperio tomaram a Constantino.

LX

Partia alegremente navegando a ver as ligeiras naus Lusitanas, com refresco da terra, pensando em si, comsigo, que são aquellas inhumanas gentes, que, habitando os aposentos Caspios, vieram a conquistar as terras Asianas, e, por ordem do destino, tomaram a Constantino o Imperio.

Vs. 1 e 2) Partia, é a continuação da anadiplose do verso anterior; - alegremente, com apparencia alegre, satisfeita; a ver, com o fim de ver; a prep. a, designa fim; naus; nau significa embarcação de guerra de alto bordo, de duas e meia a tres baterias com sessenta peças de artilharia pelo menos e tres mastros, ou tambem embarcação mercante de grande lotação; na poesia, porem, pode signifi car qualquer navio ou embarcação. Aqui, a referencia é aos navios da armada de Vasco da Gama;-ligeiras, porque não eram grandes e iam sem carga (F. e Souza); Lusitanas, dos lusitanos (dos portuguezes).

Vs. 3 e 4)-Com refresco da terra. Com, prep., designa o contheudo; refresco, veja-se o explicado na est. 55, verso 6.; da terra, a prep. de, aqui, indica proveniencia ;- em si cuidando, pensando comsigo mesmo, suppondo de si para

si;= Que são aquellas gentes inhumanas, que os navegantes são aquellas inhumanas gentes (ellipse), etc.; que, conj. integr., rege a oração que são aquellas gentes inhumanas; aquellas gentes, tinha para si o Regedor que os navegadores eram Turcos, como abaixo se explica; inhumanas, deshumanas, crueis; prefixo in designa o contrario do segundo elemento da palavra composta e junta-se unicamente a adjectivos e substantivos abstractos.

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Vs. 5, 6 e 7 Que.os aposentos Caspios habitando, etc., que (as quaes gentes) habitando os aposentos Caspios; aposentos, significa moradas, mas aqui é empregado no sentido de regiões; Caspios, adj., do mar Caspio (1); por regiões do mar Caspio se deve entender os banhados por esse mar e d'onde vieram os turcos, povos que eram de costumes ferozes (isto é inhumanos, como o Poeta diz acima). Os paizes banhados pelo Caspio formavam a antiga Scythia, vasta região que se estendia da India á Germania (2);-habitando, oriundos, provenientes. A conquistar as terras Asianas vieram, vieram a conquistar as terras Asianas. Vieram a conquistar (conjug. periphrastica): a combinação do verbo vir com o infinito de certos verbos precedido da prep. a tem quasi o mesmo valor que esses verbos empregados sós; vieram a conquistar, por conquistaram; as terras Asianas, as terras da Asia, uma parte da Asia (syned., o todo pela parte);-ė; por ordem do destino; partidario como era do fatalismo (3), assim como todos os musulmanos (4), á ordem do destino attribuia

(1) Mar Caspio, mar interior, de forma alongada, entre a Europa e a Asia. Banha a Russia europeia, as possessões russas da Asia e a Persia. Está situado a 26 metros abaixo do nivel do Mar Negro e parece em via de diminuição, apezar do importante tributo d'aguas que lhe traz o seu grande affluente, o rio Volga.

(2 Germania, antiga região da Europa, correspondendo á Allemanha

actual.

(3) Fatalismo, doutrina dos que attribuem todos os acontecimentos ao destino, considerando este como unico principio de todos os factos

ou successos.

(4) Musulmanos, o mesmo que mahomatanos, os que seguem a religião de Mahomet.

o Regedor das ilhas, em seu juizo, a tomada de Constantinopla pelos turcos.

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Vs. 8) O Imperio tomaram a Constantino. Constantino, era Constantino Magno (274-337), imperador romano; em 306, transferiu a séde do imperio para Byzancio, que tomou o nome de Constantinopla e estabeleceu o Christianismo como a religião official do imperio. Annos depois da sua morte. em 395, o Imperio Romano dividiu-se em Imperio Romano do Occidente, que conservou Roma çomo capital e que succumbiu em 476 com a grande invasão dos barbaros do norte, e o Imperio Romano do Oriente, mais tarde chamado Baixo-Imperio, Imperio grego ou de Constantinopla, que teve esta cidade por capital e que foi conquistado pelos turcos em 1453. Os turcos não tomaram, pois, o Imperio (o do Oriente) a Constantino, como diz o verso, mas ao ultimo imperador do Oriente, seu successor, e que foi Constantino XII Dracosés Paleologo (1448-1453) (metonymia). Sobre este ultimo verso ha que notar que, da fórma como apparece geralmente escripto, está errado, pois tem uma syllaba a mais:

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O Im-pe-rio to-má-ram a Cons-tan-ti-no

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11

Alguns commentadores entendem que não ha erro; que verbo tomaram, se deve pronunciar tomaro, que foi a forma primitiva, ainda hoje conservada na região de Entre-Douro e Minho, e, desnasalisando-se a vogal final o, em virtude da fig. ecthlipse, tantas vezes usada em co'o, co'a por com 0, com a, faz-se a ellisão d'essa vogal desnasalisada com a da palavra seguinte, dando assim o verso certo na recitação: O Im-pe rio to-ma-ro a Cons-tan-ti-no.

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10

E' uma maneira de explicar e corrigir o erro apparente. Gomes d'Amorim (1), fundado, segundo diz, em successivas

(1) «Os Lusíadas de Luiz de Camões», tomo I, pag. 222, ed. 1889.

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