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verdadeiro sentimento da pessoa; grande, profunda, rasgada, exagerada; cortezia, por cortezias (syned., sing. pelo plural), cumprimentos, reverencias, mesuras. A prep. com designa concomitancia; com gesto ledo a todos e fingido, com ledo e fingido gesto a todos; com gesto ledo, com rosto prazenteiro; e fingido, mas enganoso, hypocrita; assim tambem na est. 8 do C. II:

Foram com gestos ledos e fingidos,

os dois da frota em terra recebidos.

a todos, para todos, para com todos (os portuguezes ali presentes).

Vs. 5 e 6)- Cortaram os bateis a curta via. Cortaram, atravessaram, sulcaram (metaph.); os bateis, os pequenos barcos, as canoas (dos mouros); a curta via, o pequeno espaço de mar que separava as naus do littoral;= das aguas de Neptuno, periphrase de mar; a prep. de, ligando um subst. (ou equivalente do subst.) a outro subst., serve de designar a pessoa ou cousa a quem um objecto pertence (por parentesco, posse, origem, etc. ou como acção, propriedade, dependencia, etc.); n'este logar indica posse ;--e recebido, e acolhido.

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Vs. 7 e 8) Na terra, em terra, na praia; do obsequen te ajuntamento, pelo obsequente ajuntamento; a prep. de está aqui pela prep. por, indicando o agente da passiva, isto é, a pessoa ou cousa que na oração feita pela voz activa é sujeito (voz passiva, recebido do obsequente ajuntamento, subentendendo-se sendo, sendo recebido do obseqnente ajuntamento; na voz activa, recebendo-o o obsequeute ajuntamento). Esta substituição da prep. de pela prep. por pode dar-se com grandissimo numero de verbos, e em particular com todos os que exprimem sentimentos e manifestações de sentimentos (ser amado de todos; ser reprehendido dos nescios); -obsequente (do latim obsequens), obediente e respeitoso, de quem com obediencia era seguido o Mouro; - ajuntamento, reunião de gente, a companhia, o povo que o aguardava.

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Na est. seguinte encontramos tambem, referindo-se aos portuguezes,

Olhando o ajuntamento Lusitano

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Se foi, se encaminhou, se dirigiu; ao cognito; cognito (ant.) conhecido; ao cognito aposento, para a sua conhecid residencia. Já na est. 41 d'este canto diz o Poeta:

Logo cada um dos deuses se partiu,
fazendo seus reaes acatamentos,
para os determinados aposentas.

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BACCHO INTENTA DESTRUIR

A ARMADA

ESTANCIA LXXIII

Do claro assento ethereo o grão Thebano,
que da paternal coxa foi nascido,
olhando o ajuntamento Lusitano
ao Mouro ser molesto e aborrecido,

no pensamento cuida um falso engano,
com que seja todo destruido;

e, emquanto isto só na alma imaginava.
comsigo estas palavras praticava:

LXXIII

O grão Thebano, que foi nascido da paternal coxa, olhando do claro assento ethereo ser o Lusitano ajuntamento já molesto e aborrecido ao Mouro, trama no pensamento um falso engano com que aquelle de todo seja destruido, e, emquanto isto imaginava só na alma, comsigo praticava estas pala

vras:

Vs. 1 a 4) - Do claro assento ethereo o grão Thebano etc. Os quatro primeiros versos da est. teem de ser ordenados da seguinte forma: O grão Thebano, que foi nascido da paternal coxa, olhando do claro assento ethereo ser o Lusitano ajuntamento já molesto e aborrecido ao Mouro...A ordem é transposta (vid. pag. 126), não chegando, porem, a produzir synchyse (1). Do claro assento ethereo. Já na est. 42, v.

(1) «Figs. d'estylo», pag. 14

2.o, disse o Poeta

Casa etherea do Olympo Omnipotente

Ethereo, significa da natureza do ether (1); mas, empregado como termo poet. e em sentido figurado, como n'aquella est. e na presente, está no sentido de celeste; claro, transparente, limpido, puro; assento, residencia, morada. A prep. de designa logar d'onde. O grão Thebano, fig. antonomasia (o nome commum pelo nome proprio), Baccho, porque, segundo a mythologia, sua mãe Semele (pag. 20) era natural de Thebas, cidade da Beocia (Grecia). O grão Thebano, que du paternal coxa foi nascido, é a fig. periphrase, e, por ella, se conhece logo que se trata de Baccho, porquanto só pela designação de grão Thebano poderia confundir-se com Hercules (pag. 69) que era tambem de Thebas. Na est. 91 do C. IX diz, referindo-se a ambos, os dois Thebanos. Que da pa ternal coxa foi nascido, que nasceu da coxa paterna. Conta a myth. que Juno, sempre agastada contra as concubinas de Jupiter, afim de se vingar, aconselhou a Semele, quando esta se achava gravida de Baccho, que pedisse instantemente a Jupiter se lhe mostrasse em toda a sua gloria, o que o poderoso deus lhe concedeu difficultosamente. A majestade de Jupiter pegando fogo á casa, Semele pereceu nas chammas; foi então que, por temor de que Baccho, que ella trazia no ventre, não fosse abrazado juntamente com a mãe, Jupiter o recolheu na barriga da perna, onde o guardou o resto dos nove mezes da gestação. Outra versão diz que havia junto de Nysa, na India (pag. 95), um um monte chamado Meros, vocabulo grego que significava «coxa», onde Baccho, quando andou pelo Oriente, se refugiára, em occasião d'uma terrivel peste, e, como escapasse, se dizia que elle resusci tára ou nascêra outra vez (S. de Lencastre). Parece, porém,

Ether, materia subtillissima ou atmosphera extremamente rarefeita, que segundo alguns physicos e astronomos occupa o espaço em que se movem os corpus celestes. Em sentido figurado, os espaços celestes.

que o nosso Poeta se funda na primeira interpretação da fabula, como claramente se vê da estancia 10 do C. II:

Mas aquelle que sempre a mocidade

tem no rosto perpetua, e foi nascido
de duas mães;

De duas mães, isto é, de Semele e da coxa de Jupiter (da paternal coxa, segundo a presente est.). A prep. de na expressão da paternal coxa, designa origem, proveniencia. Olhando o ajuntamento Lusitano. Olhando liga-se a ser do verso seguinte, olhando ser etc., isto é, comprehendendo, percebendo que era; o ajuntamento Lusitano, a gente portugueza; na est. anterior diz tambem o obsequente ajuntamento para designar a gente que estava em terra, na praia, á espera do Xeque. Ser, infinito, valendo por uma oração que era; a deslocação d'este termo do logar proprio para se intercalar entre outros que entre si teem relação é a figura hyperbaton (1); — molesto, prejudicial, nocivo ; aborrecido, odioso. Este dois adjs. funccionam como nomes predicativos de «ajuntamento» sujeito do verbo sêr.

Vs. 5 e 6)-No pensamento cuida etc., trama, premedita no pensamento; a prep. em designa aqui, figuradamente, o logar onde; -falso engano; falso, astuto, perfido, injusto; engano, insidia, como na est. 28 do C. II

Crendo que seu engano estava noto,

tambem foge, saltando na agua amara.

de

-Com que seja de todo destruido, com que seja destruido de todo. Com, prep., designa meio, por meio do qual; todo, inteiramente, completamente, de vez.

Vs. 7 e 8)-E emquanto isto só na alma imaginava, quer dizer, ao mesmo tempo que pensava isto intimamente, em seu intimo. A mesma ideia na est. 85 do C. II

(1) «Figs. d'estylo», pag. 13.

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