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E tambem nas antigas cartas e sentenças que terminavam do seguinte modo: Dada em Coimbra...;- Dada em boa...;ou Dante em Coimbra...; Dante em Lisboa...(1)

Proposito, intento, designio, tenção.

Lis

Vs. 5 e 6)-Lhe diz que, pois as aguas discorrendo. Discurso indirecto;-que, conj. integr;--pois, pois que, já que; -as aguas discorrendo, a corrente (2); força por diante. Gomes d'Amorim entende (3) que deveria os levaram por sêr: os levaram á força por diante, pois Camões não poria os dois por um ao pé do outro; entretanto evitou a correcção. Os levaram; os, aos portuguezes; levaram, arrastaram;- por força, á força, contra vontade;--por diante, para diante, para além do ponto onde tencionavam parar.

em

Vs. 7 e 8)-Que outra ilha teem perto, cuja gente etc.,Que é pleonasmo, repetição do que do v. 5.o; usa-se certos casos para ligar mais claramente o sentido, interrompido por qualquer inserção, quando extensa. O mesmo vimos na est. 83 d'este canto, v. 7.o, sendo ali a redundancia por necessidade da contagem das syllabas;-outra ilha teem perto, estão (os navegantes) a pouca distancia de outra ilha; -cuju gente, cujos habitantes, cujos naturaes;=eram Christãos com Mouros juntamente. O piloto, não tendo podido encaminhar a armada para Quiloa, indica agora Mombaça a Vasco da Gama como sendo porto seguro, e onde os habitantes eram em parte Christãos, o que era falso, como vê já na est. immediata. Com, esta prep., aqui, designa ajuntamento e pode substituir-se pela conj. copulativa e.

se

(1) Nova Grammatica portugueza, por A. A. Cortezão, 7a. ed,. 1907,

pag. 47.

(2) Corrente maritima, movimento de uma grande massa de aguas de temperatura (Dicc. cont.) certa direcção, devido principalmente á differença

do mar em uma

(3) Os «Lusiadas de Luiz de Camões », Tomo I. pag. 249, ed. de

1889.

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ESTANCIA CII

Tambem n'estas palavras lhe mentia,
como por regimento emfim levava;
que aqui gente de Christo não havia,
mas a que a Mafamede celebrava.
O Capitão, que em tudo o Mouro cria,
virando as velas, a ilha demandava;
mas, não querendo a Deusa guardadora,
não entra pela barra e surge fára.

CII

Tambem n'isto mentia o Piloto, segundo levava por ins trucções, porque em Mombaça não havia Christãos mas ape nas Mouros. O Capitão, dando-lhe credito a tudo, ia para entrar na ilha, mas impedindo-lhe isso a protectora Deusa, não poude a armada entrar o porto, e surgiu fóra.

Vs. 1 e 2) Tambem n'estas palavras, tambem n'isso que

o Piloto diz ao Gama e vem referido nos ultimos quatro versos da est. anterior;-lhe mentia, lhe faltava á verdade, o en ganava; como por regimento emfim levava, como emfim levava por regimento; por regimento, por instrucções. O Piloto is cumprindo á risca o que lhe fôra recommendado, não o tendo dissuadido d'esse mau proposito os açoutes referidos (vid.

pag. 235 e 285).

Vs. 3 e 4) Que aqui gente de Christo não havia, que (pois que) aqui (n'este logar, n'estas paragens) não havia ligião de Christo, christãos;mas a que a Mafamede cele gente de Christo; gente de Christo, gente que seguisse a rebrava, mas (havia apenas, figs. zeugma e ellipse) a (gente,fig. zeugma) que celebrava a Mafamede (anastr., ordem inversa);

celebrava, venerava, exaltava, glorificava; a Mafamede, a Mahomet, tambem chamado Mohamed, Mafamede e Mafoma, vid. pags. 146 e 147; Mafamede, compl. obj. de celebrava, aqui precedido da preposição a, como pode levar quando seja nome de pessoa (Ex.: amar a seus paes), de cousa personificada (Ex.: pintaram os antigos ao amor menino), ou quando, não sendo nome de pessoa ou de cousa personificada possa, todavia, offerecer ambiguidade de sentido (Ex.: combate ao fraco espirito a dôr antiga). Mas a que a Mafamede celebrava; quasi o mesmo verso que o 4.° da est. 99 deste

canto:

Gente, que segue o torpe Mafamede

Vs. 5 e 6) 0 Capitão que em tudo o Mouro cria, o Capitão (o Gama, fig. antonomasia) que cria em tudo o Mouro; que em tudo o Mouro cria, dando credito a tudo, acreditando em tudo que o Mouro lhe dizia. Já na est. 96, vimos que

e na est. 97

O Capitão que não cahia em nada
do enganoso ardil que o Mouro urdia

que havendo por verdade o que dizia
de nada a forte gente se temia.

O Mouro, o Piloto mouro (syned., o gen. pelo esp.); — virando as velas, a ilha demandava. Na leitura d'este verso o artigo a tem de se juntar ao i de ilha para que a contagem das syllabas seja exacta, isto é para que o verso não exceda dez syllabas; virando as velas, mandando, dando ordem para se virarem as velas. Virar as velas, dar outra direcção ás velas para mudança de rumo, com o fim de aproar á ilha indicada pelo Mouro-a ilha demandava, demandava a ilha (anastr.) dirigia o rumo para.

Vs. 7 e 8)-Mas não querendo a Deusa guardadora, mas a Deusa guardadora não querendo (anastr., ordem inversa); não querendo, subentende-se o pron. demonstr. invariavel o

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sobre es

equivalente a isso: não o querendo, não o permittindo, não deixando que isso acontecesse; - a Deusa guardadora, periphrase e antonomasia de Venus, deusa do Olympo mytholo gico, a qual, como vimos, guardava (protegia, favorecia) aos Portuguezes. Vasco da Gama pretendia entrar em Mombaça com a armada, e Venus obstou a que o fizesse, e, te ponto da navegação, se deu o que veremos no C. II até à est. 28, em que o Poeta segue a João de Barros desde o cap. 5. das suas Decadas. Não entra pela barra e surge fóra. Em Barros, no logar citado, vem: «Não consentiu «Vasco da Gama ao Piloto que mettesse os navios dentro ce surgiu fóra».-Pela barra; barra, entrada estreita de um porto (sahir a barra, entrar a barra); pela, a prep. por, aqui, designa ologar por onde uma cousa entra (assim tambem: entrar pela porta); não entra, não poude entrar, por motivo de Venus o obstar;-e surge fóra, e surgiu fora. Surgir (term. naut.), verbo intrans., lançar ferro, ancorar, fóra, no C. II,

est. 5, dirá o Poeta

=

Ao mensageiro o Capitão responde,

as palavras do Rei agradecendo,

e diz que, porque o Sol no mar se esconde não entra para dentro, obedecendo;

Como era sol posto não entraram, como costumavam fazer.

Chegaram as náus defronte de Mombaça

a

7 de abril d'a

quelle anno de 1498.

ESTANCIA CIII

Estava a ilha á terra tão chegada,
que um estreito pequeno a dividia;
uma cidade, n'ella situada,

que na fronte do mar apparecia,
de nobres edificios fabricada,
como por fóra ao longe descobria:

regida por um Rei de antiga edade:
Mombaça é o nome da ilha e da cidade.

CIII

Estava a ilha tão chegada á terra firme que a dividia d'ella um pequeno estreito. Apparecia em frente uma cidade fabricada de nobres edificios, conforme apparentava de longe; regia-a um Rei edoso, e o nome da ilha e da cidade era Mombaça.

Vs. 1 e 2)-Estava a ilha á terra tão chegada, a ilha estava (ou era) situada tão perto de terra;-terra, a terra firme, o continente fronteiro;-que um estreito pequeno a dividia; que, conj. consecutiva, correlativa a tão do

rior; mar;

firme).

verso ante

estreito pequeno, um delgado, um apertado braço de a dividia, a separava (subentende-se d'ella, da terra

0

Vs. 3 e 4)-Uma cidade n'ella situada, subentende-se verbo auxiliar estava: n'ella (na ilha) estava situada uma cidade. Gomes d'Amorim, para ligar melhor este verso aos dois primeiros, adopta esta forma: co'uma cidade n'ella situada. Que na fronte do mar apparecia; na fronte de, em frente de (loc. prep.), defronte de, com a frente voltada para (que apparecia com a frente voltada para o mar).

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