Ioan.c.1. 1.21. f reftauraçam do Reyno,fala portes de graça, & o alto conheci Da muyta tinha. etceteras,& por certos termos; mento das coufas futuras, foy a 8 Nem faça duvida dizer efte notavel fervo de Deos,quado denuciava estas coufas, q elle nam era propheta,nem Deos lhas comunicara,porque efte he o custume dos Sanctos,& dos q tem efte alto efpirito,encubrire com humildade femelhantes graças,como fez S.Ioám Bautifta, que diffe,que nam era propheta,fendo elle mais que pro pheta; & como fez o propheta Amos, falando co o Rey Ama fum pro- zias, negandolhe fer propheta, pheta, ne quando com mayor efpirito lhe phetæ, fed eftava prophetizado: porque os armentarius Sactos cuftumam avaliarfe pelo pouco q tem de ly, & nam pelo muy to que receberam de Deos. Muyto puderamos descurfar fo- || bre efte notavel dito; & muyto mais pudéra contar defte fapateyro fancto, sò direy, que a fõte aonde recebia as enchen Amos ca.7. n. 14. Non filins pro ego fum. 9 Meditava co grade pro- como fen veyto de fua alma nos myfterios tio em fy da fagrada payxàm do Senhor, os effeytos & na cofideraçam delles gafta' da payxan vafete horas cadia, paffandoa de Chrifto. em pè,sem le assentar, nem arris mar,em memoria da postura d filho de Deos na cruz,& andãd pelo pateo da Vniversidadeo enlevado nefte sãcto exercicio, fen Rr 3 Evora. fentia tantos jubilos em fua al-panhado com luzes, & refplan- ze annos. ΤΟ Perto de quatorze anQuanto tempo ef-nos continuou Simam Gomes teve em em Evora,& vivia fatisfeyto co a occupaçam de corrector, até que o Infante Cardeal,que era Governador do Reyno, ordenou ao Padre Leâm Heriques,q nomeaffe pera effe effeyto hum irmám,que tinha o mefmo Simám Gomes, a quem ordenou que mudaffe cafa pera Lisboa, porque o queria ter mais perto de fy,pera communicar co elle algumas coufas. Tomou o fervo de Deos confelho com feu confeffor, & foy forçado obedecer a elle,que o aconfelhava, & ao mandado de Sua Alteza, que lho mandava. Em Lisboa viveo com o melmo exemplo de vida fancta, fempre junto à cafa de S.Roque, & finalmente defcançou em o Senhor, aos 18.de Outubro de 1576. aco II 11 Efte foy o primeyro goarda, & eftes foram os primeyros Lentes,que teve a Vniverfidade de Evora; & nam foy menor a gloria que de outros muytos ao diante lhe recreceo, como em feu lugar fe contarâ. Houve tambem outros muy infignes Doutores, aos quaes a mefma Vniverfidade autorizou com os graos que lhes communicou,& com as borlas que lhe deo,entre os quaes o principa foy o Padre Doutor Francifco Soares da nofla Companhia,varám admiravel no mundo por fuas letras,& por fuas virtudes, o qual depois de ter infinado em muytas Vniversidades, & lendo jà de Prima de Theologia na de Coimbra; veyo a esta tomar o grao de Doutor em 4. de Iunho de 1579, como a feu tem tempo fe dirà; deyxãdo em duvida fe foy mayor a honra, que recebeo nesta Vniversidade na borla de Doutor, que ally lhe deram,fe a que elle lhe comunicou com a aceytar della, em rezàm de poder contar a hum tal mestre por feu alumno. CAPITVLO XXXXVII. Da grande virtude do Padre Dom Francifco Henriques de Navarra, que foy nos principios daquelle Collegio feu me tre de noviços: de bum cafo notavel que lhe focedea em fua morte. Ι Am føy so ditofo o Collegio de Evora nos primeyros mestres de Theologia,que nelle houve,como já diffemos, mas tambenïteve a mefma felicidade nos primeyros mestres de espirito, co P. Frácif mo agora veremos; deftes foy code Na-a Padre Dom Francifco Henrivarra que ques de Navarra, o qual foy foy. meftre de efpirito, dos primey ros mestres de Theologia d'a quella Vniverfidade. Era de muy nobre geraçamp fobrinho da celebre Doutor Martim de Afpilcueta, & tambem foy pa rente do gloriofo Padre Sam Độ Francifco de Xavier,de que ja tinha o nome, & defejava ter a virtude; feu pay fe chamou Đó Antonio Henriques, fua nay Dona Violante Gracia, eram naturaes de huma villa chamada Ablites,no Bispado de Tarracona:veyo Dom Francifco a Lisboa, depois de refidir maytos annos na Vniverfidade de Paris,& agraduado com a borla de Doutor no direyto Canonico,& civil,eftado no melhor de fuas efperanças pera poder alcançar muyto do que o m do pode dar fe abraçou, de me lhor vontade,com a humilda da cruz de Chrifto, nefta fu Companhia; entrando na ca fa de Sam Roque, em Lif boa,em onze de Setembro de 1556. procedendo logo com grande exemplo, da maneyra q o tinha feyto em Coimbra, ou tro feu primo, fobrinho do mefmo Doutor Navarro, chamado Ioàm de Afpilcoeta,que entrou na Companhia, como diffemos 1.p.l.3.c.9. na primeyra parte, & ambos elles fe affinalaram na religiàm em virtude,& exemplo, o Padre Ioàm de Afpilcoeta no Brafil, o Padre Francifco de Navarra em Portugal: hum enfinando gentios, outro doutrinada noviços. a 2 Teve efta boa graça o Padre Francifco de Navarra, que chegou a fer meftre no ef pirito dos que lhe enfinavam a Theo Rr 4 Era meftre, & ju. tamente difcipulo. Theologia, porque teve por noviços,& por difcipulos na religiâm a dous infignes Doutores, de quem tenho falado nos capitulos paffados, que foram os Padres Pedro Paulo Ferrer, & Fernam Peres; os quaes entrâram na Companhia, sendo homens muy doutos na fagrada Theologia, & porque esta faltava ao Padre Frãcifco de Navarra (pofto que era Doutor em ambos os direytos) começou áprender Theologia, fendo jà tam provecto na virtude, que a enfinava a feus mefmos meftres: que efta diftinçam tem a Theologia efcholaftica, da Theologia mystica,que pòde hum homem fer contemplativo, & póde alcãçar myfterios altiffimos, dos mais profundos fegredos do creador, & das creaturas, ainda que nam conheça os termos das efcholas, & pofto que nam fayba a forma dos argumentos;& d'aqui vem, que ordinariamente mais fe commanica Deos a hum fancto idiota, que a hum Theologo vaidofo: era o Padre Francifco de Navarra juntamente meftre, & jutamente difcipulo;aprendia dos mefmos que enfinava : & bem enfinava: & bem lhes fatisfazia o trabalho da poftila, que lhe ditavam, com a boa doutrina que lhes praticava,porque fe aprendia Theologia, lhes enfinava virtude. 3 Notavel foy a delica- De fua deza de efpiriro com que pro- graac decedia efte devoto mestre,& hu- vaçam. milde difcipulo;em quantas acçoens ordinarias fazia,perà todas tinha particulares orações, com que preparava fua alma,& offerecia a Deos fuas obras, repartindoas de tal maneyra, que as hia offerecendo a Deos, por diverfos paffos da payxam de Chrifto, em que hia meditando;de forte, q as mesmas obras The ferviam de efpertadores, co que vinha a andar o dia todo emòraçam, & na prefença de Deos,eftes eram feus cuydados, & efta fua principal occupa çam. 4 Tinha especial deva- Devaçam çam à Sanctiffima Trindade, que tinha diante de cujo divino acatamé- a Sanctif. fimaTrin to tres vezes no dia, poftrado da de. em terra,com profunda humildade, fazia larga òraçam ; & no principio de qualquer obra, âle da ôraçam preparatoria,de que diffemos, glorificava as tres divinas peffoas,dizendolhe, com grande reverencia o verfo de Gloria Patri, &c. Era fua muy ef- Devaçam pecial avogada a Virgem Maria á Virgem mãy de Deos,Rainha dos An-N.S. jos,& fenhora noffa, á qual cadadia refava o Rofario inteyro, & parecendolhe ainda pouco (porque quem tem amor a efta Senhora,gofta muyto de a faudar muytas vezes) tambem lhe refava lua coroa, dando gra-l ças ças ao Senhor muy em particular por cada huma das virtudes, & prefeyçoens, de que dotou a fua fantifsima mãy, & 20 Sabbado fempre,àlem do officio divino,refava tambem o da melma Senhora, tendoa em todas fuas obras, & emprezas por guia, por may,& por avogada. 5. O dia todo era pequeno a efte devoto Padre pera fazer devaçoens,& raro era o Sancto Sanctos de pera quem nam tiveffe particu quem era lar òraçam; & em efpecial fe devoto. moftrava devotifsimo de Sam loam Bautista, & de Sam Ioam Evangelifta, Sam Pedro, Sam Francifco, Sam Iofeph, Sancto Thomas de Aquino,& entre as Sanctas,à gloriofa,may da Virgem Senhora San&ta Anna: todas eftas devaçoens, & òraçoes fazia com tanta continuaçam, & perfeverança,que na verdade era efpanto ver hum homem tam occupado,com obrigaçam de estudo,& de officio, ter bal tante tempo pera cumprir com tantas miudezas de devaçoens, quantas todos os dias infallivelmente fazia; porém affim como tudo fica facil a quem muyto ama,aísim nunca falta tempo a quem he muyto devoto. 6 Na obediencia era punDe fua o tualiffimo,deyxandole todo gobediencia. vernar por feus Superiores, aos quaes, pera com mayor luz, & melhor noticia de fua alma o poderem encaminhar na via ef piritual,cada dia dava conta do que paffava em fua alma, tam meuda,& pontualmente, com o le ainda fora novico,& nam como meftre de novices. Defte concerto,& armonia interior, nefta devota alma caulava a continua presença do Senhor, the nacia a maravilhola compoficam,& ordem tam apontada em fuas palavras, que nunca nelle fe achou falar de zombaria,nem tratar de nòvas,ou cou las de negoceos feculares; pezando fempre fuas palavras na balança da confideraçam : nenhuma coufa mais abominava. que o pouco tento, & precipi taçam no falar, a que elle com razàm chamava rio de defordens : & nisto particularmente fazia muyta força aos Irmãos com quem tratava, intimandolhes a grande cautella que deviam ter em fuas palavras, a qual em particular advertia q goardaffem, em nam contarem tudo o que ouviffem, ainda de boca de homes prudétes,& virtuofos, pois effes tambem,como homens fe podiam enganar, & exceder em palavras, & por iffo era muyto neceffario ter nellas muyta ponderaçam, conforme o confelho, que S. Hieronymo Hier. Epift. dava, Lingua officuum animi libra ad Calant. difpenfet, encomendando o San&to á virgem Célancia,que primeyro que fálaffe pezaffe as palavras da lingoa cō a balãça da b |