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1

Anno de pal,& tabe veremos o fim q te-
Chrifto de
ve esta missàm tam desejada, &
1555. hum Patriarcha tam efperado.
3 Sinco annos gastou efte fer-
vorofo ministro do Evagelho o
P.Ioám Nunez Barretto, fervin-
do nas mafmorras de Tituàm,
aosChriftãos,q ally estavam ca

1.p. lib.

Como acu

dia aos feus cativos

16.

do com q os fervia nas mais vis Anno da
occupaçoes,porý nenhuas tinha Copanhia
por abatidas, que nellas defco-
bria tam fanctos merecimētos,
como largamete jà apotamos.b1.p.1.3.c.1.
4 Eftado o Padre tam cõtete
coefta, q elle tinha por muyto Occafiam
qelle
boa forte, houve occafiam pera que teve

& 2.

b

a Portu

gal.

tivos (conforme contey na-pri-mudar pensamenros antigos, & pera ira-
tratar de fazer novos ferviços a tar de vir
méyra parte, * aõde també dey
larga noticia de feus pays,& de Deos noffo Senhor,q lhe fobre-
fua entrada na Cōpanhia.) Nam vieram pelo fuceflo feguinte.
perdeo elle ocafiam em todo ef- Paffou elRey de Argel co hum
te tépo de acodir a efta mifera- poderofo exercito contra o de
vel géte,tratado de feu refgate, Fez,& depois de o vencer,& so-
confefsadoos, & doutrinando a
geytar por força de armas, o
todos, & fazēdoos viver co tan-privou do Reyno: & recolhedo-
ta conformidade, & cổ tam no- fe vitoriofo co grades delpojos,
tavel uniam, & piedade, q mais trouxe configo muyta parte
dos
pareciam aquellas malmorras cativos,q achou em fuas terras,
cōvětos de homes reformados, q tabe estes se contam entre as
q carceres de cativos tyranni- principaes riquezas d'aquelles
zados; reprefentando de algua Reys infieis: cotavase no nume-
maneyra aquelles lugares fub- ro deftes cativos 200.Chriftãos.
terraneos,as còvas da Suria, & & muytos delles muy nobres:os
da Thebayda, que fendo d'ates quaes todos, dizia o Rey Barba-
frequentadas por féras,fe trocà-ro,qdaria a que lhos compraffe,
ram em cellas habitadas de Sã-
ctos. Tam cotente andava o Pa-
dre cõesta vida, q tratava de a
gaftar toda neftes caritativos
exercicios, eftimando mais efte
cativeyro de Berberia,q a liber-
dade em Portugal, confoladofe
muyto de fe ver por amor de
Deos feyto cativo, entre cati-
vos;ou pera melhor dizer,efcra-
vo cativo de cativos, porq ver-
dadeyramete affim lhe podemos
chamar,fupofto o grade cuyda-

cada hu a rezàm de cem cruza-
dos.Vio efte bom laço a grande
charidade do P. Ioàm Nunez
Barreto, & nam queredo perder
tam boa occafiam de comprar
tam barato a tãtos Chriftãos jū-
tos,defejado elle dar a vida,ain-
dag foffe por hũ fó;& fabedo de
certo,q em Tituàm, aõde estava,
nam poderia ajūtar aquella co-
tia de dinheyro;determinouse a
deyxar naquella occafiam hun
cativos, por acudir aos outross

até

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Anne de ate poder levar remedio a todos. Chrifto de SU Refolueofe emfim em 15551 dar huma chegada a Portugal, em rezâm de levar refgate pera

Trata de os

remedio dentos Chriftãos, a quem

deyxava Upreço aberto,& proaos cati cutar remedio pera os mais cal

vos.

Cafo lafti mofo.

tivos de Tituam, de quem lhe cultava tanto apartarle, como cufta ao que vay cativo a fahida de fua liberdade; & ao defterrado o apartamento de fua patria amada E ainda muyto mais inftimulava ao fervo de Deos a fazer esta jornada, & a fe vir laçar aos pès do Rey clementiffimo,o cuydado de açudir ao remedio das almas, & confciencias daquelles pobres cativos, cujos perigos eram mais de temer, porque nam ha duui da,que em Berberia mayor he o cativeiro das almas, que o rif co dos corpos. Apreffou fua vinda o cafo feguinte, que lhe focedeo, & lhe atraveffou a al ma com fentimento. Aprefentoufelhe diante dos olhos huma donzella Christa, gravemente ferida por feu melmo patrám, por ella nam querer co a liberdade,perder juntamente a ho neftidade; refolvendole antes em padecer a morte, que fofrer tal afronta; enfureceofe com if to o Barbaro, vendofe defpre fado de huma fua cativa, & metendo mam ao alfange deo hua grande cutillada na esforçada donzella,& fem duvida a matà

ra, enam temèra levar de hum Anno da melmo golpe coa vida da don-Copanha zella,que aborrecia, a esperan- 16 : <ça do refgate,que delejava(que affim acontece, que tal vez os vicios de encontram, & hu impede a outro,como neste caso a cobiça do dinheyro do refgate poz freo á crueldade do fefual.) 6. Veyo brádando a pobre emfe bua donzella, com a ferida aberta, pobre ca. tiva valer bufcando remedio no Padre de Padre. loàm Nunez,misturando com o fangue,que vertia da ferida, abundantes lagrimas, que derramava dos olhos espectaculo baftãte perá abrädar qualquer peyto de ferro, quanto mais a hum coraçam de cera. Bem fe deyxa ver quam cortado de dor,& ferido de fentimento ficaria o Padre,à vifta das dores, & da ferida d'aquella innocente. E porque já o coraçam lhe nam fofria mais ver taes defemparos,fem os poder remedias, se refolveo logo na partida, pesa vir bufcar remedio àquelles pobres,& defemparados Chriftãos: porêm, porque por huma parte puxavam por elle os cativos, q ficavam em Tituam, & por outra defejava a liberdade aos que vieram de Fez:& porque fenam podia repartir a fy melmo, ficădo com hus cativos, quando vinha buscar reigate pera todos, fe dividio desta maneira, ficando lá com o amor, & vindole a Portugal com o corpo. EtamVv 3 bem

Anno de bem pera que tiveffem os feus
Chrifto de cativos baftantes prendas, de

1555.

Tra: con

\cativos.

tam grade affecto, lhe deyxou,

como em refens defte seu amor,
a feu mefmo companheyro, no

qual afiaçava todos os bonsfer-
viços, que com sua ausencia fal-
tallem da fua parte aos feus a-
mados prifioneyros.

Le

CAPITVLO II

Da pratica que fez o Padre
loam Nunez Barretto a clRey
Dom Ioam a Terceyro fobre os
cativos de Africa,& como
elRey tratou de o man-
dar a Ethiopia.

Anto que o Padre
chegou diante de
Sua Alteza, lan-
çãdose a leus pés,
depois de lhe beyjar a mam, &
the pedir licença, dizem, que
lhe falou desta maneyra.

7 E pera que de todo nam Jigo algus vieffe delacompanhado dos q tanto eftimava, trouxe configo atè trinta & tantos cativos, rel- I gatados por fua agencia, á cõta de feus grandes trabalhos, & efmolas,que houve com fua fan&a industria. Com elles entrou pela cidade de Ceita,aonde foy, muy festejado, como fe vieffe triunfando da tyrannia de Africa. Delembarcou finalmente em Lisboa, & logo foy de caminho a beijar a mam ao fereniffimo Rey, levando em fua companhia aquelles defpojos la crueldade Mauritana, ale grandole muyto Sua Alteza de ver hum tam bom paftor, que com tanta diligencia foube tirar aquellas de empara las ovelhas quafi da boca do lobo infernal.

(·?.)

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nez Bar

2 Rey clementifsimo, aos reaes Fala o P. pès de tam foberana grandefa, & de loám Nuclemencia tam conhecida no mudo, po- retto a elnho os defpojos de Berberia,& offere Rey. ço as riquezas que trago de Africa, que fam eftes pobres Christãos,reftituidos dos perigos da morte á liberdade da vida: pezarofo venho, fenhor, de vos nam poder aqui offerecer quantos ca· tivos tem Tutuam, & quantos vivem morrendo nas masmorras de Argel, &nas prifoens de Marrocos.Grandes fam,fenhor,os trabalhos, & miferias, que aquelles cativos ally padecem nos corpos,mas muyto mais finto ver as almas de muytos, que tem perdida a liberdade de que Chrifto os dotou. Anda o demonio como tyranno intruzo por aquelles Reynos Africanos, já fenam contenta com os Mouros,que como por direito the rendem vaẞallagem, quer!

meter

Anno de

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Inquirid.

cativeyro, entre os Mouros tam desku Anno ila mana, que chegam os miferaveis cativos a perder por aperto, o privilegio da 16. Copankia liberdade, que tinham por natureza: pois com rezam dizia o Sabio Grego, Epictet in que nam havia nenhum homem cativo no corpo,que ficasse livre na alma, & esta verdade mais certa he hoje em Berberia, do que foy antigamente em Grecia. Acuda U. Magestade à eftes dobrados cativeyros,& acodindo aos corpos,livrarà tambem as almas : ba

refgatam a hum Christam, que custou
a Christo preço infinito;à vifia defte Se

meter debaixo de feu cruel fenhorio os Christo de que pelo bautismo eftam izentos delle, 1555. vivem debaixo do fuave jugo do Evangelho; querfe valer da necefsida de temporal de huns pera que arrifquem os bens verdadeiros, eternos, prometendolhe os falfos, & teporaes: reprefenta a muytos a eftreyteza das || covas, em que vivem, pera lhe fazer tiro com a largueza das dilicias, que lhes offerece: reprefenta a outros a dureza da fervidam, que nam podem fofrer, pera que de todo percam a fé, que de-rata está a feyra,por cem cruzados nos viam guardar.... 3 Agora com a entrada que teve o foberbo Rey de Argel em oRey-nhor derramado sague por libertar ca nó de Fez, tirando o fceptro áquelle tivos,nam averà que a recee derrama› Rey; quizse o diabo ajudar defte feu in- dinheyro pera remirChriftãos. Eu mes fernal miniftro. Està muy ufano com mo me hey de vender a mim, quando a vitoria,levou diante do carro de fua nam tiver co que refgatar aos outros: Soberba,como em triufo,duzentos Chri- nem averá cousa desta vida, que me ti ftaos cativos fendo os pobres obrigados re de acabar feyto cativo por amor de a reconhecer novos fenhores, & a ex- Christo, entre os meus cativos de Tiperimentar novas crueldades. Strafe tuàm; darlheshey minha liberdade, Voẞa Alteza de lhe querer dar me- quando lhes nam poffa tirar seu càtiIhor fenhor, & de contar entre feus veyro: nam quero viver na patria quãvaffallos os que eftam cativos do Rey do deyxo a tantos Irmãos no defterro: de Argel,pera que gozem da paz, que Moyfes beftimou mais o cativeyro de Ad Hebr.c. neftes ditofos tempos logramos Reynos, Egypto entre feus irmãos cativos, què Senhorios de Portugal. liberdade de filho de hum Princepe 4 Nam ha coufa, fenhor, nefta entre os cortefaos de Faraò: nam duvida, que mais fe eftime, que a liberda-vidou o Conful Romano, a quem made,muytos querem antes verfe com a daram a Roma a tratar do refgate bere iucufazenda perdida, que com a liberda- dos foldados carivos, trocar os prados dicatem. de arriscada,& alguns nam querem Venafranos de Italia pela morte que An. Vrbis vida fe a ham de pasar em cativey- em Africa tinha certa estimado mais ro:pois, fenhor, muyto mais perigofo he a honra,qué a vida, & querendo an- officij lib. o cativeyro da alma, a prisão do cor- tès morrer cativo,& honrado, que vi- Max li.. n. po; as almas dos homens,por Juanatu- ver livre, & afrontado: ifto fez hum 1+ reza, fam livres, mas he a dureza do Gentio,mais fe efpera de hum Christam, √ √ 4

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a

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b

T1.num.25.

gens affligi Magis elicum poputemporalis

lo Dei, qua

peccati ha

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DIIÍ. Vide

Cicer. de

3. Et Val

Anno de & muyto mais de hum religiofo da
Christo de Companhia, a quem Deos trouxe ao

foy tal a opiniam,que delle cō- Anno da cebeo, affim pela pratica que Copankia

the

1555. mundo pera acodir ao bem do proxi-lhe ouvio, como pelo que 16.

mo.

5 Nas covas faterraneas de Argel, & nas profundas mafmorras delituam morrereycofolado co os meus cativos; & com a exemplo do mesmo Deos, que nam duvidou (como diz a Sap.1.n.13. Efcriptura) decer a huma cova de

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defcenditq;

inuinculis

tinham contado de feus proce
dimentos em Africa, que nem
as lagrimas do proprio Padre,
nem as petiçoens do Provèdor,
& Irmãos da Sancta‹ Mifericor-
dia de Lisboa, foram baftantes
perao Sereniffimo Rey querer

nez Barreto tornaffe á fua. n il

cancello in Egypto, com o feu cativo Iofeph. Acu-permitir,que o Padre loam Nu-
foueam, & da U. Alteza a esta extrema necessi-.
non derelidade daquelles pobres Christãos, &
quit eum. defpacheme logo pera que poffa voltar
aos meus cativos, entre os quaes deyxey
meu companheyro por refens, & mi-
nha mesma alma empenhada.

Como elRey deferio ao Padre fobre o

remedio dos cati

vos.

sàm,julgando, que tan grandes
talentos nam deviam eftar ef-
condidos nas apertadas covas

de Tituâm.

Rey de ma dar o Pa

dre a E

thiopia.

7 E porque o Padre infta-Trata elIva apertadamente, folicitando a icença, lhe refpondeo hum dia Sua Alteza, que eftiveffe defcaelle fe lembraria de lhe comprir feus delejos, & o mãdaria a parte aonde nam sò achaffe os duzentos cativos, q deyxava em Argel, mas muytos milhares de almas, que o diabo tinha em peor cativeyro: ifto diffe o Sereniffimo Rey,porque tratava em feu pensamento de mandar o Padre Ioâm Nunez Barretto á Ethiopia fuperior, co dignidade de Patriarcha; & pera ifto efcreveo logo ao Padre Ieronymo Nadal,que ainda naquelle anno de 1555. era Cômiffario de Hefpanha, dãdolhe conta defte feu penfamento, & pera que logo apontafle outro Padre pera tornar ao resgate dos cativos em Africa, & aju

6 Com grande attençam
ouvio o Rey humaniffimo hua||
pratica tam sancta, mostrando
na applicaçam com que lhe al-çado,que elle
fiftia, a boa vontade com que
aceytava,& animava ao Padre
a continuar com efte feu arre-
zoado, ficãdo Sua Alteza igual-
mente edificado da propofta, &
fatisfeyto do requerente; o que
moftrou be nas palavras co que
The refpondeo,& nas boas obras
com que o despachou; porque
em breve mandou entregar ao
Padre vinte mil cruzados pera
o refgate dos cativos, fobre que
viera a Portugal, mas com ef-
ta condiçam,que lhe ordenou,
que ele déffe as ordens pera os
refgates,que d'aquelle dinhey-
ro le haviam de fazer em Afri-
ca,porém que elle nam fahiffe
por ntam de Portugal; porque

daffe

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