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CAPITVLO XXVIII.

Chega a Angola o P. Balthe
zar Barreyra, aonde fez muyto
ferviço a Deos, contafe parti

1.

cularmente bum bau

tifmo.

2 Com elta boa occaliam.
começou logo o Padre Balthe-
zar Barreyra a doutrinar aquel-
les barbaros, aprendendo em
breve a fua lingoa, porq a muy que traba-
ta charidade o fazia muy dil- thou em
gente: fez levantar hua Igreja Angola.

da invocaçam de Sam Paulo
(havendo refpeyto ao nome do
Governador) no mefimo lugar
aonde primeyro efteve o Col-

Omado o affentolegio da Companhía. Seria aqui

muy larga hiftoria, que deyxo pera feu tempo, fe houveffe de referir as muytas terras, que correo efte novo Apoftolo de Angola,os Reynos, em que en trou,os mâres, que venced, os rios,que atraveffou, as terras,po: onde paflou,confinantes com o Reyno de Angola, os innumeraveis bautifmos, que fez, os | muytos Regulos, que coverteo; hum sò contarey aqui,por fer o primeyro,& deyxarey os outros porque foram innumeraveis.

A

no confelho real, fobre as coufas de Angola, da maneyra,que tenho dito, fe embarcaram na melina nao, có o Go vernador, alguns religiofos, da Companhia,dos quaes hia por superior o Padre Balthezar Barreyra; chegaram ao porto de Em que Loanda da banda de dentro da anno che-enfeada, no anno de 1 575 . où gou a Ancomo acho escrito pelo mefmo gola o P. Balther r Padre Balthezar Barreyra, no Barreyra. fim do anno de 1574. & acha do o Governador,que era já falecido Dambi Angola, & que|| reynava Angola Quiloanje,lke mandou feus embayxadores, & hum prefente da parte del Rey Dom Sebaltiam,feu fenhor. Ao principio festejou muyteo Rey aquelle prefente que até os barbaros fe fabem alegrar,com dadivas que nam the cuftam dinheyro) & madou logo apre goar por todo o feu Reyno,que fe tiveffe amizade, & boa correfpōdencia co os Portuguefes.que desejava fer Christan, logo

Do muyto

cular hum

bautismo.

3 Entre outros may cos So- Apontafe bas, havia hum tido entre to- em partidos, pelo mais prudéte, defejava muyto o Padre de o converter, pera com feu exemplo mover a outros muytos. Foy Deos nof fo fenhor assim fervido, que alfim lhe facedeo,porque pallando hum dia pela fua banza(que affin chamam ao lugar da ha bitaçam do fenhor da terra) pondofe co elle às praticas, lhe declarou o Soba como avia dias

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o Pa

o Padre com grande alegria,
por nam perder tam boa occa-
Gam, lhe declarou os myfterios
de noffa fancta Fè, os quaes elle
repetia com tanta certefa aos
de fua cafa,como fe foffe Chrif-
tam já muyto antigo.

4 Logo ally madou fazer,
& arvorar huma fermofa cruz,

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ta do melmo Padre Balthezar
Barreyra,efcrita em trinta & hū
de Ianeyro de mil quinhentos.
oytenta,& dous. O filho do Sanga
(diz elle,que affim fe chamava
efte fidalgo) levava huns imperiaes
vermelhos,comfuas boras laranjadas,
hua roupeta,& gorra de damafco
branco,que fe lhe fez de nóvo, & hum
farregoulo luftrofo; ao qual respondiam
outros ao feu modo: o dia do bamif-
mo, que foyo do gloriofo S.Thome, fahi-
ram todos em prociçam, com a cruz
diante,de cafa de hum homem devpro,
dos principaes desta povoaçam, acom-

&

os

fe aqui acháram;traziam fuas palmas
nas mãos,em final da victoria, que al.
cançàram.

que se alevantou com grande
fefta, & alegria, entoando a la-
dainha, á qual todos os de fua
cala refpondiam a feu modo:
feyto ifto felveyoo Padre pera
Loanda,trazendo em fua com-
panhia hum feu filho mòrga-panhados de todos os Portugueses, que
do,hum feu irmâm, & algus pa-
rentes,pera os inftruir em noffa
cafa nas coufas de fua falva-
çam, & deyxando hum Portu-
guez antigo, & devoto com o
mefmo Soba, que lhe foffe dan-
do mais larga noticia de nofla
fancta Fé,em quanto fe prepa-
rava o neceffario, pera o dia
do bautismo: festejando tanto
eftes bons principios o Gover-
nador Paulos Dias de Novaes,
que chorava de alegria.

de

6 Foram feftejados com repiques,& outros tangeres, que na terra havia; pozemos por nome ao filho Sanga, Dom Conftantino,&ao irmam, Dom Thomé, a hum por fer o primeyro fidalgo, que fe bautizava em Angola, & ao outro pelo Sanito,em cujo dia fe bautizava,depois de os bautizar, & lhes dizer miffa, lhes fizemos a fefta dentro de cafa, pera a qual tinhamos 5 Chegado finalmente o convidados todos os feus padrinhos, & nias com dia do bautifmo, procurou o P. o fenhor de Loanda, com outros fidalque fe fex Balthezar Barreyra,que fe fizef-gos vaßallos delRey de Congo: elles cofe com toda a folemnidade poffivel, dandolhes por padrinhos os mais ricos Portuguefes da terra,pera que os podeffem veftir mais ticamente, o que fizeram com muyto gosto, & particular confolaçam,como melhor fe verâ das palavras de hua car

Ceremo

efte bautifmo.

méram no cham, como he (cu costume,
aßentados fobre efteyras,& os Portu
guefes em outra mefa apartada, com a
modeftia,que entre os noßos fe foc
goardar,mas com muyta ale-
gria de todos.

Feftas á quelles bautifmos.

СА

Victoria ad

miravel por fua in

tercecam.

CAPITVLO XXVIIII.

tou de lhes fazer guerra decla

rada.

2 Tambem entre os Pcr

Contafe bua admiravel victo-tuguefes havia muytas caufas

con

ria,que alcançou o Governador
Paulos Dias de Novaes,
tra os negros, por óraçoes (como
mo parece)do P.Balthezar
Barreyra.

I.

pera procurarem a vingança, & deftruiçam daquelle barbaro, affim pelos enganos, com que nos tratava, como pelo odio, q nos mostrava:mas como eramos tam poucos,nam ouzavamos hir demãdar efte bravo touro:trouxenos porém Deos hũa ocasiam em que vindo pera nos deftruir, podéra cótar muy- ficou deftruido: quiznos huma tos,& de outras in- vez acometer com todo o leu numeraveis cover-poder, ajuntou hum exercito

Eftes bautismos,

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Exèrcito

tam innumeravel, que os que de innume
the dam menos dizem,que poz raveis bar
em campo(como nos cofta por baros.
carta do Padre Balthezar Bar-
reyra) hum conto & duzentos

exageraçam, porque àlem do
teftimunho do Padre Balthe-
zar Barreyra, me assegura desta
verdade o Padre Ieronymo Vo-

foes de gentios,que o Padre fez
nos quatorze annos,q fe deteve
em Angola, que deyxo pera que
efcrever a hiftoria daquelles te-
pos: agora quero brevemente
contar,entre as obras prodigio-mil homens. Nem pareça ifto
fas,que lhe focedèram, a princi-
pal,que foy hua admiravel vi-
&toria, que parece excede á fê
humana,a qual alcançou o Go-
vernador Paulos dias de No-gado Provincial que hoje he da
vaes,como elle mefmo cofeffa-
va, por òraçoes do P. Balthezar
Barreyra, cuja ocafiam foy a fe-
guinte. Levava muyto malo
Rey Angola Quiloanje ver as
forças dos Portuguefes naquel-
las terras,& ver em quam breve
tempo tinham florecido noffas
armas,& arreceando vir a per-
der feu Imperio, & vendo que
jà nam podia por traças, & in-
vençoens maquinar a total def-
truiçam dos Portugueses, tra-

Companhia,em Portugal, peffoa de muyta virtude,& grande verdade,& que efteve em Angola vinte & tres annos, fazendo grandes ferviços a Deos, & diz que era tal a immenfidade de gente, que, no principio daquella conquifta,havia em Angola, que nam duvida poderse entam ajuntar efte, & outro mayor numero.

3 Era tam grade esta inūdaçam de barbaros, é cobriam Ggg muycas

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muytas legoas daquellas vaftif-
fimas campinas, & largas mon-
tanhas,de forte que parecia,que
a terra toda com hum novo, &
efpantofo parto (como antiga
mente fingiam,que lançâra de
ly gigantes, pera conquistar os
ceos)afsin agora fe transformâ-
ra toda em negros, pera deftrui-
çam daquelles poucos, mas ef-
forçados Portugueses, os quaes
nam paffavam de trezentos ; &

por

hua parte estavam cercados do rio Coanza, & por outra tinham diante aquella immēfidade de gentes,q sô cō feus descōpoftos clamores, & barbaros alaGrande aridos, atroavam os áres, porêm Bethezar nam metiam medo algũ ao P. Barreyra. Balthezar Barreyra, ne ao muy

nimo do P.

esforçado Governador Paulos Dias de Novaes,a quem o Paffegurava ý teria hua celeftial vi&toria,fe dèfle a batalha confiado no favor do céo, & em efpecial na Virge Sactiffima da Victoria fua muy fingular avogada,em cujo dia, acertou de fer ie fua fanctiffima Purificaçam, efperavam aquelle feliciffimo fuceffo.O mesmo dizia o Paco repetidas,& alegres vozes a todos os Portugueses, affeguradoThes, quelle lhes prometia de, os ajudar,q fenam foffe peleyjado com armas nas mãos, feria brâdando com òraçoes ao céo.

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4 Era cổ tudo muy defigoal o partido de parte a parte,porq qs Portugueses nam paffavam

de trezētos,& foy tam grande
pavor, q entrou no animo dos
Regulos,noffos amigos ( & q jâ
eram christãos) â vifta do grade
poder do inimigo,q nam houve
quem quizeffe acodir aonde el-
tava o Governador,mais q hum
Soba,por nome D. Paulo co fuas
getes,q feriam coufa de 30. mil
negros, pore vinha tam armade
de efperaças efteRegulo,q dizia
fer impoffivel nam acodir Deos
pelos chriftãos.Etam jà tres ho-
ras depois domeyo dia,estavam
os dous exercitos à vifta, ficado
os noffos em hũa cấpina, & oc-
cupado os negros huas grandes,
& altas montanhas, co q nos fi-
cavam quafi fobre as cabeças.
Vendo o animofo christam Dō
Paulo, os inimigos nam que-
riam defcer dos montes, temeo,
co muyto fundamneto, q podia
fer ardil (q nam faltam a eftes
os nof-
barbaros) pera acometer
fos de noyte, &os tomar às
mãos, opprimidos da immensa
multidam da gente,q traziam.

5 Co efta fofpeyta fe veyo
aõde eftava o P. com o Gover-
nador, os quaes the estimâram
muyto fua advertĕcia, & logo o
Governador deo final de aco-
meter,põdofe no mesmo tepo o
P. em óraçam â vista de todos,
co as mãos levantadas ao ceo.
Serraram os noflos, & começá-
|| ram a batalha,apellidãdo o no-
me da Virge Señora da Victoria
(como fe logo começassé vecẽ-

do,

Como fe

começou a

batalha.

do, & entraram na batalha triufando)hia diate de todos o animofo chriftam Dom Paulo, co titulo de Capitam mór do exercito,& mereceo elle muy bem, naquelle dia,efta hōra; começáram os barbaros a abalar pelas montanhas abayxo,defpedindo fobre os noffos hum immenfo chuveyro de infinitas sèras, as quaes,porq(como parece) hiam governadas por outra mâm mais As armas acertada, atraveflavam aos mefdos inimi- mos,que as atiravam, fem fazer gos torna mal a nenhum dos noffos, cahindo milhares de inimigos (q quando Deos quer, & a fortuna favorece, as mefmas armas do inimigo nos fervem de inftrumentos de victoria!)

vam cotra

elles mef

mos.

ao céo as mãos delarmadas, pe
de com muytas lagrimas ao Se-
nhor q favoreça aquelles chrif-
tãos,& renove fuas maravilhas.
Cafo admiravel, & do qual ain-
da a memoria eftâ muy frefca:
de repente, sem fè faber a caula
de tal novidade, fe com-çâram
os barbaros a perturbar entre
ly(final manifefto de hua gran-
de perdiçam) hiafe jà nefte te po
pondo o fol (que parece també
queria repartir com as eftrellas
a boa forte de verem o esforço
dos Portuguefes, fenam he que
com as trêvas da noyte queria
acrefcentar o horror da morte
aos negros) os quaes amedron-
tados com o eftrodo das armas,
com os golpes repetidos, com
os efpantofos brados, & gritos
dos vencedores, com os ays, &
gemidos dos q morriam, acref-
centando o medo âs caufas de
fua perdiçam, voltáram as cof-
tas, & fe matavam huns aos ou-
tros,por ferem os primeyros na
fugida;fenam era que a muytos barbaras
delles o medo,que coftuma dar fugiram,
ázas pera voar,lhe tirava o ani-

6 Havia muyto que durava
a peleyja,& pelas boas novas,
por momentos traziam ao Pa-
dre Balthezar Barreyra, fe per-
fuadio,que a batalha eftava aca-
bada, & a victoria acclamada,
por efta caufa,deyxando a òra-
çam, vinha dar ao Governador
o parabem.Eys que de repente,
começam os Portuguefes afrou-
ar,perdem os primeyros brios,mo, até pera fugir, achando a
inftam os barbaros, con novos morte mais ao perto, fer a hire
alentos, matamnos fete Portu-bufcar ao longe.
guefes, brada ao Padre o Go-

xar.

hirẽ

Hindo aflim os barbaros

vernador,que fe torne a reco-fugindo defapoderadamēte, por lher em òraçam, porque sò nel-aquellas montanhas, jâ de noyla tinham libradas as elperaças: Torna oP. affim o fez o Padre a toda a a porfe em préffa(porque o temponam era pera vagares) levanta outra vez

oraçam.

te(que atè efta fe armou contra
elles) foram dar em hūa profū-
diffima barroca,dōde defpenhã
dole os primeyros; fe precipitá-
Ggg 2

ram,

Como os

& fe def

penháram.

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