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Quâto flo

recèram as letras

bra.

religiofa, o mesmo fizeffe na das letras,que nam sòméte dam luftre aos Reynos, mas ornam as Religioens, & ajudam a confervar a huns,& outros, na policia da virtude, & a nam cahire em Coim- em bayxos de ignorancia. Nem me espanto (aonde o favor real era tam grande) florecere tanto, & em tam breve tempo as letras em Portugal, que logo da Vniverfidade de Coimbra fahiram Doutores eminentes em todas as faculdades,de que nam somete fe proveo o Reyno,mas outras antigas, & celebres Vniverfidades; pois dos filhos defta teve aquella tam infigne Salamanca muytos Lentes de Prima,do direy to civil, continuando algus delles por fuceffam de hum a outro,os quaes com algus outros Doutores de grande fama, acrefcétâram o nome de letras em Portugal, que até entam mais o teve de armas de forte,que affim como dos GreOui.Græcia gos dfe dizia em Roma, que malè forte eram doutos,mas.covardes; afgenus. fim dos Portugueses corria, que

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facüdü,fed

Como foy amigo da paz.

ainda que eram muy valentes, nam eram muyto fabios; pore elRey Dom loam moftrou ao mundo, que os Portuguefes ti nham braço pera peleyjar, & tinham engenho pera eftudar. Com fua grande prudecia foube temperar as cousas de forte, qardendo naquelle tepo Hespanha, França, & Italia, em

3

guerras, entre Princepes chriftãos,tal meyo de prudencia tomou efte pacifico Salamàm,que com todos foube confervar a boa amizade, fem faltar, nem no que devia ao fangue,& liança, que com o Emperador Carlos Quinto tinha, nem com a boa amizade dos outros Princepes cotrarios ao Emperador: o feu gosto era fer terceyro entre elles,mandando a huma, & outra parte feus embayxadores, procedendo com huns, & outros,com tanta cautella, & avifo,que a nenhum deyxou agravado, & a todos tinha obrigados.

Era admiravel feu faber na escolha.que fazia de homes, pera as occupaçoens, como logo moftrarey gosGovernadores, que mandou á India; nam fe fervindo fenam de peffoas muy judiciofas,de grande luz, & expediente nas coufas, pelo que todos os de feu confelho, & os validos, acerca de fua peffoa, eram homes de conhecida prudencia,& grandes partes, & os confelheyros taes,quaes o Efpi rito Sancto e manda efcolher, Hum entre mil:& dos milhares o unico foy o fereniffimo, & prudentiffimo Infante D. Luis feu irmàm,de cujo parecer sẽpre fez muyta conta, por afsim o merecer nam fó fua grande virtude,& prudencia, mas o fingular modo, que em feu proce

dimento

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f

Ouid. 1. Me

vos fervir, & nam vos fey pedir, foyfeme da memoria tudo o que trazia pera dizer. Fazey por vos lembrar, refpondeo elRey, até a menhã, ou o outro dia, & esquecendovos vós, eu me lembrarey. Affim focedeo, porque ambos ao outro dia fe lembrâram, o fidalgo pedindo, & o Rey concedendo.Nam fe defcuydou menos o Conde do Prado cheyo de cans, vindo huma vez diante de fua Alteza, fem faber falar em fua prefença,no que queria pedir,chegou a lhe cahir da màm hum memorial, que trazia fem dar diffo fè: ido o Conde mandou

dimento fempre teve. Nem he o menor dos louvores d'efte muy louvado Rey ver a grande paz, & fingular conformidade, que fempre goardou com eke efclarecido Infante, & com os mais Infantes feus irmãos, cousa que no mundo,como o outro diffe, be muy rara, porque entre irmãos aonde os empenhos da natural amizade deviam ler mayores,os odios tal vez coftuAmizade q mam fer mais entranhaveis; goardou to affim começou logo o mundo Jeus ir nos primeyros dous irmãos; 8 & affim começou Roma, em feus Luc.1.Phar. primeyros fundadores; porèm mi m adue- entre eftes fereniffimos irmãoselRey levantar o papel, & venrút fangui- os primores da benevolecia,vedo que era de petiçoens do Co

tam. Fratru quoque gra

tia rara eft.

mãos.

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Frater no pri

ne muri,

0 que be

focedeo co

hi fidalgo, que the fa lava.

ciam as falhas da natureza

de, pofto que nelle fe conti-
nham algumas de importancia,
de todas lhe mandou logo pro-
visam affinada, fem o Conde
mais niffo intrevir, como se

Com ifton cobrou tam
fingular reputaçam com todos,
que junto com a mageftade
de fua peffoa verdadeyramente
real, todos reconheciam nellera elle foflem efcufadas as pe-
tal eminencia de prudencia,que tiçoens, quando lhe conftava
muytos ainda grandes fidalgos, dos ferviços.

aos quaes o fangue, & autorida

pe

6. Além da fingular madu

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de davam mais confiança,& fareza de juizo, & luz de enten- Sua gråde

cil entrada, vindo diante delle
a lhe falar, fe perturbavam fem
atinar como que haviam de
dizer: & hum fidalgo de muy
tos ferviços, diante delle fenencia de fabidoria, nafcida
embaraçou & perdeo o tino, de dous principios, praticados,
de forte, que de todas as cou- mais na efchola da religiam,q
fas que levava cuydadas, pera no paço da corte. O primeyto
reprefentar a fua Alteza, nem eta o da oraçam, có a qual re
huma sò lhe lembrou; antes corria aDeos,&co mayor fervor
levantandofe diffes Senhor, fey quando os negocios eram mais
graves,

dimento, que neste Rey era fabiduria
muy grande, & álem do ref-
peyto,& veneraçam de fua
pelloa, fe via nelle outra emi-

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h

!

Ambr.lib.i.

Offic.ca. 35 Nunqua nifi cófulto Do

graves,como bem se notou em
Almeyrim, nam fem efpanto
dos que cuydavam retirarfe
fua Alteza àquelle lugar de
fuas coutadas, por caufa da
recreaçam da caça, por fugir
a negoceos, pois ahi o viam
tam metido no defpacho del-
les, & no trato.com Deos, que a
mòr parte do dia dava aos ne
goceos,& antes de cear hu gra-
de efpaço a Deos, fazendo ora-
çam,só em hua capella, pera os
defpachos virem mais acerta-
dos,& melhor regulados com a
boa rezàm, & com a vontade
divina,conforme o bom eftylo
do Sancto Rey David, do qual
diz S. Ambrofio, que primey-
ro negoceava com Deos, o que
havia de ordenar aos homes; &
por iffo fempre vencia: & con-

h

K

fe,& foubeffe tudo o que nelle
fe notava, acerca do governo,
& de fua peffoa, pera que o avi-
zaffe, o que fe o tal homem fa-
zia de boa võtade pelo ganho,
que dahi lhe refultava, de me
lhor o recebia elRey, pelo pro-
veyto que dahi lhe nafcia;acey-
tando tudo com a boa docili- К
dade, que Sancto Ambrofio Ambr.deo-
louva no Emperador Valenti
niano, o qual em fabendo que bant al qui
feu povo the notava alguma venationi-
coufa,
coufa, ainda que
foffe muyto pari,&c.
licita,& de feu gofto, como era
caça,logo a deyxava, porque
ordinariamente melhor julgam
os eftranhos nas coufas alheias,
que os intereçados em materias
propriasam 22

a

& Efendotam curiofo em faber o que delle fe dizia, pera

&

mino bellu forme o bom coftume goar-fe emmendar, nam goftava na-
adorfus eft davam os capitaens do povo de
omnibus vi- Deos,que nam começavam em-
&or prælijs preza de cofideraçam, fem pri-
meyro a confultar com Deos,
diante do feu tabernaculo.
7 O fegundo principio

vafaber o que delle diziam.

i

Mat. ca. 18.

dicut

da de ouvir murmuradores,
maldizentes, que nos paços, &
em cafas grandes tem por vida
propria andar roendo nas vidas
alheyas, & por efta rezám ha-
via entam em Portugal, & na

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Procura donde lhe nafcia tanta pruden-corte delRey Dom loam Ter-
cia, foy o bom uzo d'aquelle
exemplo de Chrifto. Senhor
noffo, que perguntava no Eva-
n.23. Quem gelho a feus difcipulos, que o-
chompiniam fe tinha delle o que
nam sò fazia elRey Dom Loâm,||
enformandose com peffoas de
confiança; mas tambem dava
por officio a hum homem de
virtude conhecida,que inquirif-

hominis?

ceyro, poucos desta má casta
de gente,a quem o outro cha
mou inimigos da paz, & per
turbadores da concordia os
quaes crefcem muyto, fe acham
hum Princeps fofpeytofo. E co-
mo era tam prudêtejera també
muy difficultofo em crer novi
dades;& hia muyto attento em
ouvir faltas alheyas, & accufa

çoens

biru Valentiniani. Aie

ferarum eu

bus occu

Nam dava credito a gente ma. levola.

Martial.li.. uis paci,placida que ini &c.

Turba gra

mica quiet,

m

Xenoph. in 1uo Cyro.

çoes de emulos,cu fofpeytas de competidores ; q nam ha coufa que peça mais maduro exame que femelhantes informaçoes de gente apayxonada. Com eftas heroicas obras, & excellétes virtudes, nascidas de fua grade prudécia,& exercitadas na paz, alcançou mayor nome no mudo el Rey D.Ioam III. do q outros muytos Princepes, que fizeram grades façanhas na guerra,porque como judiciofamete diffe Xenophonte, mais honram a hum Rey os beneficios, que obrou,que os tropheos, que dependurou.

CAPITVLO LVIIII.

Do bom fuceffo, que tiveram as armas no tempo delRey D. Ioam, nas conquistas defte Reyno,especialmente na India.

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fas da paz, applicandose todo a dilatar a fé, promover o culto divino, reformar Religioens, & engrandecer letras, podia dar fofpeyta,que sò a ifto attendia.

2

Com tudo (àlem de ser igoal façanha,por voto dos prudentes,conquistar de novo, & confervar o alcăçado)nam deyxava de reynar em feu animo o esforço militar,& a generofidade de efpirito,que de feus antepaffados,como por heraça propria,lhe pertencia. He verdade, que fe nam achava em peffoa nas guerras,& batalhas, como nem feu pay se achou, por nam ter nestas partes inimigos, contra os quaes pudeffe guerrear, fenam em Africa, & pera eftes tinha infignes capitaens, & valerofos fronteyros, que fem ser neceffaria fua presença, lhes punham o freo, alcançando cada dia illuftres victorias. Nem fe deve ter por pouco esforço, o q foy julgado por grande governo,& prudencia, largar algumas das praças,& lugares, que eftavam ganhados em Africa,como foram Safim, Azamor, Alcacere,& Arzilla, pois em rezâm de eftado, & regra de milicia, he averiguado,que nam convě em terras, froteyras a gete inimiga, guerreyra,& poderofa,como he Portugal aos Mouros Africanos, dividirle hum Rey em fuftetar muytas praças pequenas, que

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Rezám teve per a lugares de largar os Africa.

&

que jà tinham dado moltras de
feu valor em varias fahidas,
encotros,em especial no afama-
do cerco de Safim,q elRey Xa-
rife cotra nòs fuftetou,por elpa-

tavel de

Safim.

nam fe podem bem defender,
fem arrifcar a reputaçam: deve-
do sò acudir a poucas de im-
portancia,& be fortalecidas em
q fe conferve o q le tem ganha-
do,& em q fe rebatam as entra-ço de 6. mefes,co ce mil homes Cerco no-
das do inimigo: como hoje o de pé,&de cavalo,dãdo terriveis
użam,& uzâram antigamete os aflaltos,&batarias co artelharia,
Monarcas, & Princepes bem a-q affeftava, fobre machinas de
confelhados na guerra.
eftranho ardil; fendo os Portu-
guefes tam poucos,q cada hu ti-
nha dos Mouros â fua conta,
muytos centos,& avendose tam
honrada,& valerofamete, que o
Xarife de corrido, por mais
naõ fer vifto,levātou o cerco,&
fe foy, cöfefsado q hu sò Portu-
gues, valia por muytos Mouros.
No mesmo tepo mãdou fua Al-

3 Principalmente que as
Outra re- terras de Africa, que reynando
zám pera elRey D.Manoel,eftavam divi-
Je deyare didas por varios Reys,& Senho-
aquellas
res,reynando elRey D.Ioám ef-
praças.
tavam já unidas em hum cétro,
& Monarchia delRey Xarife,&
por iffo mais facilmête fe uniam
os Mouros em nos offender, &
eram neceffarias mayores for-teza fazer a fortaleza de Maza-
ças pera nos defendermos. Ta- gám,junto ao mâr, tam forte, &
bem a experiêcia tinha moftra- inexpugnavel, q fe póde contar
do, que mayores ganhos eram entre as famofas do mudo,como
os que nos vinham do trató da depois be experimentou elRey
India,que das guerras em Afri-Xarife,quãdo metedo o réfto de
ca; & com tudo co difficuldade
viera elRey D. Ioâm em largar
as ditas praças,senam fora effe o
parecer,nam sò do Sumo Pōti-
fice,mas de toda a boa milicia
de Italia,& do mesmo Empera-
dor Carlos V. Princepe tam ex-
ercitado em guerras, & famofo
em victorias. Acrefcetandofe 4
pera exercicio das armas,& da-
no dos inimigos, baltavam as
praças de Ceyta, Tagere, & Ma-taes)co novos Reynos, fogeytā-
zagâm, que fua Alteza de novo
mãdou goarnecer co armas, ca
pitaes,& cavalleyros esforçados

Africa,veyo nella quebrar fuas
forças, & moftrar o valor dos
Portugueses.

Do Ioam

4 Pois fe quizermos por os
òlhos nas emprezas,& conquif- Do muyto
tas da India,acharemos, que el que elRey
Rey D.loâm nam so colervou, fez na In-
& poz em forma de fe poder dia.
perpetuar o q jâ eftava ganha-
do,mas acrefcentou grâdemēte
o eftado(por meyo de feus capi-

do hus a efta coroa,&em outros
eftedendo a cõquista,& dilatãdo
o comercio. Nem fe póde ne-

gar,

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