Não canses, que me cansas: e se queres Fugir-me, porque não possa tocar-te, Minha ventura he tal, que inda que esperes, Ella fará que nao possa alcançar-te.
Espera quero ver, se tu quizeres,
Que subtil modo busca de escapar-te, E notarás no fim deste successo,
« Tra la spiga e la man qual muro è messo. »
O' não me fujas! Assi nunca o breve Tempo fuja de tua formosura! Que só com refrear o passo leve Vencerás da fortuna a força dura. Que Imperador, que exercito se atreve, A quebrantar a furia da ventura? Que em quanto desejei me vai seguindo; O que tu só farás não me fugindo.
Poens-te da parte da desdita minha? Fraqueza he dar ajuda ao mais potente. Levas-me hum coração, que livre tinha? Solta-mo, e correrás mais levemente. Não te carrega essa alma tão mesquinha, Que nesses fios de ouro reluzente Atada levas? Ou despois de presa Lhe mudaste a ventura, e menos pesa?
Nesta esperança só te vou seguindo; Que ou tu não soffrerás o pezo della, Ou na virtude de teu gesto lindo, Lhe mudarás a triste e dura estrella: E se se lhe mudar, não vás fugindo, Que amor te ferirá, gentil donzella ; E tu me esperarás, se amor te fere; E se me esperas, não ha mais que espere.
Já não fugia a bella nympha, tanto Por se dar cara ao triste que a seguia, Como por ir ouvindo o doce canto, As namoradas magoas que dizia. Volvendo o rosto já sereno e santo, Toda banhada em riso, e alegria, Cahir se deixa aos pés do vencedor, Que todo se desfaz em puro amor.
que famintos beijos na floresta! que mimoso choro que soava!
Que affagos tão suaves! Que ira honesta,
Que em risinhos alegres se tornava!
mais passam na manhaa, e na sesta, Que Venus com prazeres inflammava, Melhor he exprimenta-lo que julga-lo, Mas julgue-o quem não pode exprimenta-lo.
Desta arte em fim conformes já as formosas Nymphas, co'os seus amados navegantes, Os ornam de capellas deleitosas,
De louro, e de ouro, e flores abundantes; As mãos alvas lhe davam como esposas : Com palavras formaes, e estipulantes Se promettem eterna companhia Em vida e morte, de honra e alegria.
Huma dellas maior, a quem se humilha Todo o coro das nymphas, e obedece, Que dizem ser de Cælo e Vesta filha, O que no gesto bello se parece, Enchendo a terra, e o mar de maravilha, O Capitão illustre, que o merece, Recebe alli com pompa honesta e regia, Mostrando-se senhora grande e egregia.
Que despois de lhe ter dito quem era, C'hum alto exordio de alta graça ornado, Dando-lhe a entender, que alli viera Por alta influição do immobil fado; Para lhe descobrir da unida esphera, Da terra immensa, e mar não navegado, Os segredos, por alta prophecia, O que esta sua nação só merecia :
Tomando-o pela mão o leva, e guia, Para o cume d'hum monte alto e divino, No qual hu'a rica fabrica se erguia De crystal toda, e de ouro puro, e fino. A maior parte aqui passam do dia Em doces jogos, e em prazer contino: Ella nos paços logra seus amores, As outras pelas sombras entre as flores.
Assi a formosa, e a forte companhia, O dia quasi todo estão passando, N'huma alma, doce, incognita alegria, Os trabalhos tão longos compensando. Porque dos feitos grandes, da ousadia Forte e famosa, o mundo está guardando O premio lá no fim bem merecido, Com fama grande, e nome alto e subido.
Que as nymphas do Oceano tão formosas, Tethys, e a ilha angelica pintada,
Outra cousa não he, que as deleitosas Honras, que a vida fazem sublimada : Aquellas preeminencias gloriosas, Os triumphos, a fronte coroada De palma e louro, a gloria e maravilha, Estes são os deleites desta ilha.
Que as immortalidades que fingia A antiguidade, que os illustres ama, Lá no estellante Olympo, a quem subia Sobre as azas inclytas da fama; Por obras valerosas que fazia, Pelo trabalho immenso, que se chama Caminho da virtude alto e fragoso, Mas no fim doce, alegre, e deleitoso :
Não eram senão premios, que reparte Por feitos immortaes e soberanos
O mundo co'os barões, que esforço e arte Divinos os fizeram, sendo humanos: Que Jupiter, Mercurio, Phebo, e Marte, Eneas, e Quirino, e os dous Thebanos, Ceres, Pallas, e Juno, com Diana, Todos foram de fraca carne humana.
Mas a fama, trombeta de obras tais, Lhe deo no mundo nomes tão estranhos, De Deoses, Semideoses immortais, Indigetes, Heroicos, e de Magnos.
Por isso, ó vós que as famas estimais, Se quizerdes no mundo ser tamanhos, Despertai já do somno do ocio ignavo, Que o animo de livre faz escravo.
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