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Marca, em seguida, os limites da sciência que faz objecto da sua dissertação. Dum lado a fisica e os matemáticos, no polo oposto as sciências sociais e morais. Depois refere-se em especial à Fisiologia humana, ramo que se professa nas Escolas Médicas.

Ocupando-se do método, outro ponto do tema que lhe foi dado, defende a necessidade de:

«Um mesmo método para todos os ramos da sciência fisiológica; um mesmo espírito os deve inspirar a todos.

«Vejamos, pois, qual seja êste método e qual seja esta filosofia, duas faces de uma mesma questão».

«O método é, segundo uma definição de L... (1), o instrumento do espírito; o complexo dos processos intelectuais por meio dos quais nos é dado descobrir e demonstrar a verdade».

E, prosseguindo nesta orientação, discute se há

...

«muitos métodos, se o espírito conhece mais do que um caminho que o conduza ao descobrimento da verdade.»

(1) Palavra ininteligível.

Disserta sôbre métodos indutivos e dedutivos sôbre que assenta uma classificação de sciências.

Não seguimos o autor nestes considerandos, que, sendo interessantes na época em que os escreveu, estão neste momento fora das nossas preocupações scientíficas, especialmente no campo médico.

Gomes Coelho, dominado pela influência de Augusto Comte, que passou do domínio filosófico para o campo de todas as sciências, termina com estas palavras:

«A Fisiologia é assim uma sciència que tem tudo a esperar da filosofia positiva».

O autor quis fundamentalmente dizer que a Fisiologia só poderia progredir sob o impulso da observação e da experiência.

Aos leitores ávidos de inéditos de Júlio Denis, mesmo quando eles são, pelo assunto, diferentes dos admiráveis contos, poesias e romances que The deram o grande renome, e que desejariam ver aqui transcrita, na integra, a sua dissertação, diremos que Gomes Coelho escreveu apenas uns apontamentos que o haviam de guiar na sua exposição oral. Havia antigamente o costume de se lerem algumas palavras da dissertação antes de se iniciar a lição. Estamos em crer que era êsse também o hábito, em provas

de concurso, da Escola Médico-Cirúrgica do Pôrto. O resto eram notas para guiarem o candidato. Por isso tem lacunas o trabalho. Do que êle contém de fundamental deixamos o sentido, fazendo apenas as citações indispensáveis. O assunto é árido. Gomes Coelho aborda-o dentro da orientação scientifica da época; mas seria inadmissível na hora presente. Para os próprios médicos perdeu a actualidade. Para os outros, mesmo para os maiores admiradores do grande romancista, de pouco pode servir a publicação integral do manuscrito que o autor se viu forçado a escrever no prazo imprerrogável de 24 horas, c, ainda assim, apenas como guia de uma lição oral.

Há uma nota curiosa neste manuscrito que não queremos deixar no esquecimento,

Gomes Coelho, na primeira página do seu trabalho, que aparece em duplicado, e por certo naquela página que foi o primeiro rascunho, pois a outra é escrita em caligrafia mais cuidada, entreteve-se a colocar por baixo de duas séries de 44 (aprovo) e N N (não aprovo) abreviaturas várias.. Pude identificá-las. Eram dos nomes dos professores da Escola. F. (Luís Pereira Fonseca), M. P. (António F. de Macedo Pinto), Alm. (António Bernardino de Almeida), Gr. (José de Andrade Gramacho), etc. Escreveu ainda outras carreiras de AA e NN sem

as abreviaturas. Êsses sinais cabalísticos eram o prognóstico das votações finais. Não pudemos averiguar se êle foi ou não bem feito. O que sabemos é que o seu competidor, Pedro Augusto Dias, de quem mais tarde Gomes Coelho foi amigo intimo, conseguiu a primeira classificação. Ambos foram aprovados em mérito absoluto, mas em mérito relativo o júri inclinou-se para o seu competidor, que foi nomeado, por decreto de 14 de Março de 1864, demonstrador da secção médica. Gomes Coelho não desanimou com o insucesso e continuou a trabalhar.

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Ao tempo, diga-se de passagem, já o seu nome literário começava a ser conhecido. Em 21 de Novembro de 1864 publicou, assinando, pela primeira vez, com o seu nome: -Gomes Coelho no Jornal do Porto, o interessante conto Uma flor de entre o gélo (1). Esta circunstância fêz com que se denunciasse o autor das Cartas acerca de várias coisas, que assinou com o pseudónimo de Diana de Aveleda e que saíram em dois folhetins dedicados, em grande parte, à memória de Rodrigo Paganino, o autor dos Contos do tio Joaquim. As cartas a Cecília, Impressões do Campo, e

(1) Júlio Denis, Serões da Provincia, 24. ed., Lisboa, 1922, pág. 321.

que eram assinadas pelo mesmo pseudónimo, são também dessa época.

Só mais tarde foram publicadas as Pupilas do sr. Reitor, mas já em 1864 o seu nome ecoava pelos centros de reünião do Pôrto, então muito orgulhoso dos seus literatos, como uma das suas melhores esperanças.

Em 1865 abre-se outro concurso para a secção médica. Gomes Coelho apresenta-se de novo. Teve como competidores Jerónimo António de Faria, que foi excluido, e António Maria Pinheiro Tôrres, médico pela Faculdade de Medicina de Coimbra, onde obteve altas classificações, e que foi um temível competidor.

Desta vez Gomes Coelho saíu vencedor.

Talvez lhe valesse o ser a terceira vez que se apresentava na liça, um pouco a sua doença, o ser filho da Escola, e ainda o começar a ser conhecido como escritor de raça.

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Prestou provas em 29 de Maio e em 2, 12 de Junho, tendo tido por ponto da primeira lição: «Contractilidade muscular. Rigidez cadavérica. Influência dos sistemas nervoso e sanguíneo».

Há cerca de trinta anos, quando, pela primeira vez, em Coimbra, ouvimos falar Pinheiro Tôrres no «Congresso Nacional de Tuberculose», que a teimosia e o talento do professor Augusto Rocha conseguiu levar a bom têrmo, ficamos com a impressão de que se perdêra no

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