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V

O PROFESSOR

dr. Gomes Coelho teve uma grande satisfação ao saber que estava nomeado demonstrador da secção médica da Escola Médico-Cirúrgica do Pôrto. Recebeu em Felgueiras a notícia do seu despacho, que tem a data de 20 de Julho de 1865...

A primeira pessoa a quem se dirigiu, logo que soube a notícia, foi a seu pai. A carta tem a data de 24 de Julho e é um modelo de estilo epistolar e de correcção filial:

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«A estas horas é provável que já saiba que estou despachado. Não tinha informado inexactamente o amigo do Teixeira Pinto, quando

disse que na quinta-feira se assinava o decreto da minha nomeação. É com a data de 20 que êle vem no Diário de 22.

«Êsse mesmo rapaz escreveu de Lisboa e eu

acabo de ver o Diário. O amanuense da Escola escreveu-me também. Finalmente está decidido; acabaram-se todas as dúvidas e inquietações.

«Nesta ocasião em que o meu futuro se fixou, não posso deixar de me recordar do muito que devo ao Papá pelos sacrifícios feitos por mim.

«Alegra-me duplamente o resultado dêste meu empenho porque, com o prazer que me causa, sei que não menos intenso havia de produzir no Papá, que até agora tão improficuos tinha visto ficarem os seus grandes esforços para a felicidade dos filhos.

«Meus irmãos foram privados, não sei por que vistas providenciais, de colherem neste mundo os frutos da esmerada educação que lhes dera. Êsse mesmo poder, que os sacrificou tão novos, parece ter-me reservado, como que para realizar em mim a recompensa que lhe merecia a resignação do Papá.

«Alegra-me esta idea e anima-me a acreditar que não me faltará a vida e a saúde para cumprir essa missão talvez providencial. !

<«<Creia que tenho sentimentos para avaliar todos os seus sacrificios e para compreender o alcance da delicadeza com que procurava não mos fazer sentir.

«Neste dia, um dos mais solenes de tôda a minha vida, permita-me que cumpra com o meu primeiro dever beijando-lhe respeitosamente a mão.

«Seu filho grato e afectuoso>

Felgueiras, 24 de Julho de 1865.

Joaquim.»

A seu primo José Joaquim Pinto Coelho, que foi, durante toda a sua vida, um amigo dedicadíssimo, dirigiu Gomes Coelho uma carta escrita no mesmo dia, carta que não foi ainda publicada e que, devido à penhorante amabilidade da sua possuidora (1), vamos transcrever na integra.

Gomes Coelho tinha ganho a batalha em que consumira energias que iam além das suas fôr

(1) A sr. D. Isabel Ayala Gomes Coelho, viúva do almirante Guilherme Gomes Coelho, quis honrar-nos com a cedência de alguns inéditos do brilhante romancista para o nosso trabalho. Á sua generosa amabilidade rendemos aqui os melhores agradecimentos. A êstes preciosos subsídios deverá êste modesto estudo o pouco que venha a valer,

Também nos prestou s. ex." interessantes informações e apreciações orais que as suas reminiscências e o seu profundo conhecimento da obra de Júlio Denis tornaram preciosíssimas.

ças físicas. Era natural que trasbordasse de contentamento ao saber que alcançára o ambicionado têrmo da sua carreira académica. É assim a carta:

«Felgueiras, 24 de Julho de 1865.

«Meu José

«Agora não terás que dizer. Eis-me outra vez à tua porta. É que temos novidade. É de crer que o não seja para ti já a estas horas. Em todo o caso nem por isso fico dispensado de ta comunicar. O decreto apareceu. Desde o dia 20 de Junho do ano do Senhor de 1865 estou demonstrador da Escola Médico-Cirúrgica do Pôrto. Tão habituado estava a desconfiar, que ainda me parece impossível. Mas é certo.. O nome de Júlio Gomes da Silva Sanches ficará gravado na minha memória. Deixar falar a política; eu simpatizo com o homem. Só no seu Ministério se quebrou o maldito encantamento que transtornava êste negócio. Até que emfim!

«Esta manhã, ainda meio estremunhado, recebi o correio. No sobrescrito de uma das cartas vinha, após o meu nome:-Dm.° demonstrador da Escola Med. Cirurg. do Pôrto.

<«<Foi a primeira comunicação. Era do amanuense da Escola. Depois seguiu-se uma nova

que também me foi agradável. Foi a da aprovação do Zagalo em todos os exames que fêz. Saüdei, pois, o dia 24 de Julho dêste ano com a gratidão devida.

«Agora estou só. O Teixeira Pinto partiu a cavalo para proceder a um exame de corpo de delito e autópsia de um indivíduo que assassinaram em uma freguesia próxima. Por pouco que estive para ser nomeado perito, por falta de facultativos.

«Fiz por me isentar, porque palpitando-me que a minha opinião seria desfavorável ao indigitado A. do crime, não queria que, nem por sombras, se imaginasse que ia feito com o delegado para aumentar a criminalidade do homem. O Teixeira Pinto concordou e partiu só com dois facultativos da localidade.

«Tencionava passear, mas está tanto calor que não sei o que farei. Tenho ainda de escrever algumas cartas e depois verei.

«Por emquanto não houve mudança de tenção emquanto ao nosso projectado passeio às Caldas, Eu espero ainda estar no Pôrto segunda ou terça-feira. Preciso de tomar posse para ir recebendo.

«O amanuense da Escola deu-me o conselho cheio de bom senso de que procurasse habilitar-me quanto antes para ganhar, que é o essencial. Antes de terminar a semana, porém, não vou.

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