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filhos do mesmo Apolo. Franco Rodrigues dizia outro dia num conhecido jornal madrileno que personalidades ilustres do mundo scientífico espanhol enaltecem diariamente a arte médica com subtilezas literárias. E cita os recentes trabalhos amenos de Cortezo, Ramon y Cajal, Amalio Gimeno, Gregorio Marañon, e outros. Quantos exemplos poderiamos apontar de celebridades de faculdade, a cultivarem o jardim onde florescem letras e artes, na França, na Inglaterra e na Itália. A cultura humanista é hoje lá fora, no mundo médico, um predicado de realce. Do Brasil o prof. Afranio Peixoto, higienista, letrado e presidente da Academia Brasileira, quando me manda os seus excelentes livros, inscreve sempre sobre a oferta a divisa do Ferreira Não fazem dano as musas aos doutores. Sim, mas há que distinguir o lugar onde. Uma revista técnica em Espanha censura aos médicos espanhóis as suas sortidas para fora da clausura obri

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gada dos hospitais e laboratórios. Em certo calcanhar do mundo que v. e eu bem conhecemos, disse-o já no exórdio do Rodrigues Lobo, ai daquele que põe pègada nas faldas de Helicon. Se atirou ao mesmo tempo a borla doutoral às ortigas e desertou da profissão, se vem a ser um evadido da medicina, bem está. Se porém se mantém no sacerdócio do templo de Cós, a boa gente dos oficiais do mesmo oficio abocanha-o; às duas por três vê-se desbalizado dos seus foros legitimos, por comprovados que estejam, de trabalhador da sciência médica. E se ainda por cima alinha períodos de prosa regular, então está perdido, passando a ser um simples ôdre de palavras. Acertada a frase do Beaudelaire a respeito do Poe: «Il avait le malheur de bien écrire ce qui a le don de éffaroucher les sots de tous les pays du monde».

Meu amigo, estes fados não perseguirão o advento da sua afortunada obra, afortu

nada em tudo, na forma, no teor, no contexto. Teve sorte Júlio Diniz. Está aí uma pleiade gloriosa de escritores nossos do século passado a pedir mãos que lhes erijam um monumento assim. Até a escolha do tema foi feliz, porque Gomes Coelho tem, como os santos, um resplandor de ternura e doçura, que são afinal o mel da vida. Aos quinze anos ofertava o livro póstumo, acabado de sair, das poesias de Júlio Diniz, precedido dumas quadras infantis a lápis, àquela sob cujo signo celestial vivi. Com essa recordação saudosa fecho esta pobre epístola. Dirá v. desconsolado - afinal, deixou-me sem prólogo. É verdade. Guarde em troca estas páginas simples como tributo da consideração e estima que lhe voto, e que mais se vincularam agora, graças ao encantamento do seu livro de eleição.

Do seu ex-corde

Ricardo Jorge.

I

UNIV. OF CALIFORNIA

UMA CONVERSA

A

S Pupilas do sr. Reitor, de Júlio De-
nis, andam presas à vila de Ovar
pelas personagens que, apenas o

romance apareceu, ali foram reconhecidas. De há muito ouvíamos dizer que o grande romancista ali as copiára do natural e citavam-se nomes e aduziam-se razões. O assunto que nos prendia por considerações de vária ordem, e principalmente por vivermos paredes meias da laboriosa vila, levou-nos a inquirições junto de alguns amigos que colheram da tradição e de investigações próprias subsídios valiosos para o estudo do romance e da obra literária de Júlio Denis.

O aparecimento do livro de Maximiano Lemos - Gomes Coelho e os Médicos — e ainda o ter lido num jornal do Pôrto, a propósito do

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