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José Leite de Vasconcelos

EXTENSÃO GEOGRÁFICA DO PORTUGUÊS

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PORTUGUÊS é falado em grande área: no Continente e ilhas adjacentes, em algumas partes da raia espanhola, no Brasil, nas nossas colónias, e em várias outras regiões da Ásia, da África, etc. Também outrora foi falado em cidades da Itália, da França, da Inglaterra, da Alemanha, da Holanda, pelos Judeus de origem portuguesa.

Em tão grande extensão territorial não pode esperar-se que exista uniformidade idiomática. De facto, no Continente há variações dialectais do Norte para Sul: o Minhoto, o Trasmontano, o Beirão, falam de um modo, ou de muitos modos; os Meridionais (Extremenhos, Alentejanos, Algarvios) falam de outro, ou outros. Nas ilhas (Açores e Madeira), para onde o português foi levado pelos marinheiros e

colonizadores do século xv, notam-se variações análogas. Com a propagação da nossa língua nas longínquas regiões de além-mar, ela scindiu-se muito desvairadamente: aqui ouvimos o falar brasileiro; ali os romances crioulos da costa e arquipélagos de África; mais além os de Ceilão, da Índia e do Extremo-Oriente.

¡ Grande povo, que assim deixou sua alma por o mundo em pedaços repartida! (Camões, Canção X). ¡ Vigorosa língua, que no decurso de cinco séculos tem resistido, mais ou menos, ao embate de outras, e servido para exprimir as crenças, as paixões, as ideias, das mais desencontradas nações da terra!

(Lições de Filologia Portuguesa, Lisboa, 1911, pág. 19.)

A CRISE DA LINGUAGEM

A língua portuguesa acha-se na actualidade em grave crise: combatida pela francesa, e sem arrimo clássico, perde gradualmente a correcção e riqueza ori

ginárias. Os escritores esquecem-se de ordinário que escrever para o público é uma arte, que precisa de aprendizagem. O talento cria-o a natureza, mas se êle não se cultivar, produzirá obras informes. O instrumento de uma literatura é a língua; sabê-la bem, constitui por conseguinte a primeira condição para bem

escrever.

Alcança-se na mor parte o conhecimento da língua portuguesa com a lição circunspecta dos bons livros dos séculos XVI e XVII, os quais, por seu turno, devem no campo estético à literatura da Antiguidade o prestígio de que gozam, pois que, além de nos sons, fórmulas, vocábulos, sintaxe, ser o português uma das transformações populares do latim, recebeu, desde muito cedo, e paralelamente, influência dêle por intermédio dos livros, e continuou a recebê-la até agora. Esta influência modificou muito o léxico, o estilo, e um tanto a gramática: daí depende a diferença que notamos, por exemplo, entre uma cantiga aldea e uma oitava de António Ferreira; entre um adágio ouvido a uma velha e uma sentença de Amador Arráiz; entre um recado que um servo

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nos transmite e um discurso de Garrett. A primeira vista parecerá estranho que em pleno século xx, na prelecção inaugural de uma cadeira da Universidade de Lisboa, eu aconselhe a rapazes, possuídos de todo o nervosismo da vida moderna, a consulta de autores a quem os que menos os freqüentam põem fàcilmente e sem pejo a alcunha de cediços, mofentos, embolorecidos. Longe de ir contra a corrente, acompanho-a; o que pretendo é que se não estrague a nossa língua, que forma um dos mais vigorosos vínculos da nacionalidade. Compulsar os quinhentistas e os seiscentistas, para nêles colher o que tiver valor, e o que não contrariar, e pelo contrário dirigir, a evolução actual da língua, não é de modo algum andar para trás, é progredir: a civilização de cada época resulta sempre da das anteriores; utilizando-se os bens desta, amplia-se aquela...

(Da importância do latim, Lisboa, 1911, pág. XII.)

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José Maria da Costa e Silva

(1810-1854)

DA LÍNGUA PORTUGUESA, E SUA ÍNDOLE

ORTUGAL e Galiza falaram a mesma

Plíngua; é a história quem testifica

esta asserção. Todos os antigos escritores espanhóis chamam língua galega, ou língua portuguesa, ao idioma das duas nações; daqui vem que Macias el enamorado é contado por uns entre Poetas Galegos, e por outros entre Poetas Portugueses; daqui vem dizerem uns que El-Rei D. Afonso, o Sábio, escrevera grande número de cantigas para música em Galego, ao passo que outros dizem que foram escritas em Português; mas a

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