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tação, se a tanto chegar a falta que lhes prometta lucros; e isto nenhuns regulamentos pódem fazer.

Seja-me a final licito illustrar ainda mais estas minhas reflexões com o já citado Smith, o oraculo, o grande classico da Economia Politica. Na sua admiravel obra, cujo titulo he em Portuguez, Exame sobre a natureza, e causas das riquezas das Nações. diz Liv. Liv. 1.o Cap. 11. As terras de nenhum paiz, he evidente, jamais pódem ser completamente cultivadas e me'horadas, em quanto o preço de todas as producções, que a industria do homem he obrigada a levantar nellas, não chega ao ponto de pagar a despeza de completo melhoramento e culSe o completo melhoramento e cultura do paiz for, como certissimamente he, a maior de todas as vantagens públicas, este augmento no preço de todas aquellas differentes sortes de producção rustica. em lugar de se considerar como huma calamidade pública, deve olhar-se como o necessario precursor e companheiro da maior de todas as vantagens públicas.

tura

No Liv. 4. Cap. 5.o diz: Impedir o lavrador de levar os seus generos em toda a occasião ao melhor mercado, he evidentemente sacrificar as leis ordinarias da justiça a huma idéa de utilidade pública, a huma especie de razões de estado; acto este de authoridade legislativa, que só se deveria exercitar, e que só se póde perdoar em casos da mais urgente necessidade.

Mais diz aquelle famigerado author em outra parte do mesmo Capitulo: Quem examinar com attenção a historia das carestias e fomes que tem affligido alguma parte da Europa, ou durante o curso do presente seculo, ou dos dois precedentes, de muitas das quaes temos noticias sofrivelmente exactas, achará, me prece. que huma carestia nunca sẽ originou de combinação alguma dos mercadores internos de trigo, nem de outra alguma causa se não de huma verdadeira falla, occasionada, póde ser. algumas vezes, e em alguns lugares particulares, pelos estragos da guerra; porém em muito maior número de casos, por culpa das estações; e que huma fome nunca se originou doutra alguma causa se não da violencia do governo em pertender, por meios improprios, remediar os inconvenientes de huma carestia.

Eis-aqui, Ill.mo e Ex.mo Senhor, a minha opinião sobre huma materia que tão espinhosa tem sido. Quando ella se não julgue digna de seguir-se, poderei ao menos lisonjear-me, que algumas luzes offereço, que possão conduzir ao desejado fim. Angra 25 de Junho de 1817.

João da Rocha Ribeiro.

P

A

Nos primitivos cabedaes que produzem a lavoura, e a industria dos habitantes destes Reinos, cousiste a sustentação, e as riquezas essenciaes de todos os povos: deve animar-se a primeira e favorecer-se a segunda. Lei de 4 de Fevereiro 1773.

Os fructos naturaes, e industriaes, sobejando em huns lugares. constituem nelles hum cabedal innutil, e morto: devem renascer, e fazer-se lucrosos pela exportação para outros lugares, que delles necessitão. A mesma Lei.

Edital do General das Ilhas dos Açores do 1.° de Julho de 1817, em que declara livre a exportação do grão e legumes de humas para outras Ilhas, e de todas para o Reino de Portugal e Ilha da Madeira.

Francisco Antonio d'Araujo d'Azevedo, do Conselho de Sua Magestade Fidelissima, Governador e Capitão General das Ilhas dos Açores, &c. Faço saber que de hoje em diante fica livre na fórma das Leis, e Cartas Regias dos nossos Soberanos a exportação de trigo, milho, cevada, fava, e centeio para o Reino de Portugal, Ilha da Madeira, e as mais Ilhas dos Açores, com a declaração porém, que em anno de escacez, ou que os preços destes generos subão ao excessivo. será prohibida absolutamente a exportação de qualquer dos sobreditos grãos. Tenho julgado do meu dever determinar o referido para felicitar esta bella Ilha, na persuasão de que sem commercio livre não póde haver agricultura, e sem esta não pode haver abundancia. Persuadido pois desta verdade me admirei, quando tomei posse deste Governo, haver a prática de conceder licenças arbitrarias com o onus de metter no Terreiro público a terça parte do genero, que se concedia licença de exportar. Procurando saber se havia alguma Lei, Carta Regia, ou Aviso, que authorisasse continuar na mesma prática, e não achando mais que Leis positivas que ordenão a livre exportação, ainda receoso que houvesse alguma cousa particular digna de attenção ao bem publico, mandei pelo meu Edital de 16 de Junho proximo passado publicar, que quem quizesse escrevesse sobre este assumpto, e pozesse o seu parecer por escrito na Secretaria para melhor acertar : (não desejando mais que a felicidade dos povos que tenho a honra de governar) até hoje não tem apparecido se não sábias Memorias, que se conformão com o meu parecer, e com o Alvará de 26 de Fevereiro de 1771, e Avisos Regios de 5 de Novembro de 1785, de 20 de Agosto, e 13 de Novembro de 1789, e outros mais, que com o dito

Alvará concordão. Declaro com tudo que terei o maior cuidado em que se observem as Leis contra os monopolistas, e atravessadores, que comprão o grão para revender no mesmo Termo, porque a ninguem he permittido comprar para tornar a vender no mesmo Termo, ainda que seja no Terreiro público, pois que isto só o devem fazer os proprietarios, não lhes sendo permittido vender ao público em suas casas, como determinão os $$ 65, e 66 da Carta Regia de 2 d'Agosto de 1766. Quando porém aconteça que alguma pessoa tenha comprado algum genero de pão com o fim de exportar, e o não queira depois fazer, o não poderá vender no mesmo Termo sem licença, a qual só lhe será concedida, vendendo-o pelo mesmo preço porque o comprou. E este Edital se affixará nos lugares mais públicos desta Ilha, tanto na Cidade, como nas villas para chegar ao conhecimento de todos. Angra o 1.o de Julho de 1847.

(L. S.)

Francisco Antonio d'Araujo d'Azevedo.

Extracto da Obra do Desembargador José Accursio das Neves, intitula da: Variedades sobre objectos relativos ás Artes, Commercio, e Manufacturas, consideradas segundo os Principios da Economia Política, Pag. 168.

Os calculos que se praticão em algumas terras da quantidade da producção, e número dos habitantes para se reservar o que se julga necessario para o sustento destes, e se deixar sahir sómente o excesso, além de serem quasi sempre inexactos, (*) não poderião ser applicaveis senão a hum paiz perfeitamente isolado. Onde ha commercio, e communicações abertas, estes calculos pódem servir para cobrir við

() Tive occasião de me confirmar nesta persuasão por experiencia propria, sendo membro do Governo interino das Ilhas dos Açores. Calculava-se a povoação da Ilha Terceira em pouco menos de 30:000 almas, e contando a 20 alqueires de grão (trigo, ou milho) por cabeça, o que não era muito, as sementes e o preciso para os animaes de differente especie, suppunhão-se indispensaveis 11:000 moios para o consumo da Ilha: com tudo houve anno em que a producção não chegou a tanto, segundo as listas que se tirárão, e exportando-se 2:000 moios dessa mesma colheita, não se experimentou falta. Estas listas pedem-se aos dizimeiros, e em 1.o lugar he possivel que estes para occultarem o verdadeiro interesse que lhes resulta das suas rendas, as não dêem verdadeiras, o que com tudo não supponho dos que conheci, pois os tenho em boa conta: 2. Os mesmos dizimeiros são de ordinario enganados, porque a malicia está muito propagada, e nem todos se dizimão como devem: 3. Não se havia respeito á batata, e ao inhame que fazem huma grande parte do sustento do povo. Muitas outras cousas pódem influir na exactidão de semelhantes documentos.

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lencias, mas nunca para as authorizar o commercio he providente, deixemo-lo respirar, e confiemos nelle.

Tudo pois concorre a persuadir a conveniencia de se estabelecer a livre circulação por todo o Reino, do pão, e dos outros viveres, a que as mesmas razões são applicaveis, removidos todos, e quaesquer embaraços, que se oppõem ás transacções deste commercio de termo a termo, e de provincia a provincia; e esta franqueza seria mais capaz de destruir o monopolio, de que sem razão se suppõem fautora, do que todas as devassas, e procedimentos contra os atravessadores. A Ordenação Liv. 5.° tit. 76, e 77 offerece ainda hum importante objecto de meditações ao Soberano, e ao seu illustrado ministerio, que em gráo mui alto se tem já destinguido pelos seus principios liberaes em materias de commercio, e de industria.

Aviso da Secretaria d'Estado ao Governo Interino das Ilhas dos Açores em 2 de Setembro de 1797.

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Havendo chegado à Real presença de Sua Magestade algumas Representações sobre as duvidas em que se entrava se aquellas Leis, e Alvarás que expressamente não fallão das Ilhas dos Açores comprehendião, ou não nas suas disposições as mesmas Ilhas. He a mesma Senhora servida mandar declarar que todas as Leis, e Alvarás que não forem circunscriptas especialmente a certa porção da sua Monarquia, se devem cumulativamente entender obrigatorias para todas as partes dos seus Dominios, e para os seus Vassallos todos indistinctamente sem differença qualquer, logo que nas mesmas Leis e Alvarás não houver huma disposição particular, applicavel pela mente das referidas Leis a esta, où áquella porção dos seus Estados, e Vassallos. O que S. Magestade manda intimar a V. Ex. e Mercès para que nesta conformidade fiquem cessando aquellas dúvidas, em beneficio dos seus Vassallos que habitão essas Ilhas; por ser da sua Real intenção que todos elles participem igualmente das acertadas disposições das sabias Leis, que dimanão do seu real Throno. Deos guarde a V. Ex. e Mercès. Palacio de Queluz em 2 de Setembro de 1797.

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OBSERVAÇÕES

SOBRE TODO O PRECEDENTE

O bem público he o unico objecto desta obra, e o zelo com que ella he escrita, he o seu unico ornato.

Filangieri:

Depois de tantas oscillações, de tantos Avisos contrarios huns aos outros, e todos à Lei, esperava-se pela experiencia para resolução do Problema: Se deveria ser inteiramente livre, ou dependente d'alguma condição a exportação do grão nesta Пtha? A casualidade veio a favor da verdade, e hum anno de huma colheita escassa faz ver o que deverá acontecer em hum anno abundante.

Neste anno pois de huma colheita escassa exportou-se livremente o grão que se quiz exportar (1) em consequencia do Edital do 1. de Julho, (2) até que finalmente sobio o preço a ponto de se preferir conservar o resto para se vender na terra, do que embarcallo. Já sahirão navios em lastro; estão outros sem destino por não acharem carga. Tão longe de se experimentar falta, he tanta a abundancia, que o Terreiro não dá sahida ao que nelle entra. (3) Ha huma marcha mais regular do que esta? Foi preciso alguma força, ou violencia do Governo, ou dos Magistrados para estabelecella? Que funestas consequencias tem resultado? Aonde existe essa miseria, e fome que se prognosti cava? Por ventura clama, ou queixa-se alguem? Sim, alguem se queixa: queixão-se huns poucos d'ociosos, que contando sómente comsigo, nada lhes importa o bem público. São estes individuos huma escoria da sociedade, na qual não se distinguem, senão pela perversidade da sua lingua: são humas nullidades que não devem entrar em contemplação.

Se pois em huma colheita escassa o andamento he regular, que

(1) Não passou, até o presente, de 1:410 moios 16 alqueires, a saber: 902 moios 14 alqueires de trigo, 321 moios 48 alqueires de milho; 138 moios 18 alqueires de sevada; 47 moios 50 alqueires de fava.

(2) Veja-se a Pag. 327 d'este Archivo.

(3) Como paiz productivo de pão, a maior parte dos habitantes desta Illia recolhem o seu provimento logo no principio da colheita; de maneira que no Terreiro público não chega a vender-se annualmente 600 moios, tomado hum termo medio. Em 1814 vendeo-se alli 331 moios 13 alqueires; em 1815, 685 moios 57 alqueires; em 1846, 588 moios 47 alqueires.

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