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DOMINIO HESPANHOL NOS AÇORES

E

D. ANTONIO PRIOR DO CRATO

Carta da defesa e ley contra os moradores da Ilha Terceira e das Ilhas dos Açores.

Dom Felipe per graça de Deos Rey de Portugal e dos Algarves daquem e dalem mar em Africa, senhor de Guiné e da conquista, navegação e commercio de Ethiopia, Arabia, Persia e da India &.a Faço saber aos que esta minha carta virem que vendo eu a mui grande obstinação e contumacia em que ainda hoje em dia estão os moradores e povo da Ilha Terceira e de outras algumas ilhas dos Açores, que abaiXo serão declaradas, continuando em sua rebellião e desobediencia com tão grande escandalo destes meus reinos e senhorios como he no torio, e como por isso são dignos de todo o castigo que por tão graves culpas merecem, ey por bem, defendo e mando que daqui em deante todos os navios que partirem dos portos de mar das cidades, villas e logares de meus reinos e senhorios para as ditas ilhas dos Açores, ou per qualquer outra via se acharem na paragem dellas não vão à dita Ilha Terceira nem tomem porto algum della nem outrosi vão as Ilhas de São Jorge, do Faial, do Pico e Graciosa, nem tomem porto algum nas ditas ilhas, e os mestres e marinheiros, passageiros e quaesquer outras pessoas de qualquer calidade que sejam que forem nos taes navios não communiquem, commerceiem nem tratem com a gente da dita Ilha Terceira, nem das outras ilhas acima declaradas na terra, nem no mar per via alguma que seja e as caravellas e barcos da Ilha de S. Miguel e da Ilha de Santa Maria, que estão obedientes a meu serviço que costumam andar de umas ilhas pera as outras, não vão às ditas Ilhas, Terceira, de Sam Jorge, do Fayal, do Pico e Graciosa, nem communiquem na terra nem

no mar com a gente dellas, sob pena de huns e outros perderem os taes navios, caravellas e barcos ou sua justa valia não sendo seus, e todas as mercadorias e fazendas que nelles levarem, e encorrerão alem disso em perdimento de todos seus bens e fazendas e nas penas crimes que eu houver por bem segundo as merecem os que tratam com alevantados e rebeis e lhe dão ajuda e favor, das quaes penas civeis em que assi encorrerem pela dita culpa, aplico as duas partes pera o meu fisco Real e a terceira pera quem os accusar. E mando ao doctor Symão G. Preto do meu conselho, e chanceller mor de meus Reinos que faça publicar esta minha defensa em minha chancellaria, e fixar o treslado della sob meu sello e seu sinal em alguns lugares publicos desta cidade de Lisboa, e envie logo com toda brevidade outros taes treslados aos corregedores das comarcas onde houver portos de mar e aos corregedores e ouvidores e justiças das Ilhas da Madeira, Porto Santo, Sam Miguel e Santa Maria aos quaes todos mando que tanto que lhe for dada a fação logo publicar nos lugares maritimos de suas comarcas e ouvidorias e tresladar nos livros das camaras e dos taes logares para vir à noticia de todos e se saber como assi o tenho mandado e defeso e não se poder alegar ignorancia; e outrosy lhes mando que cada hum delles- tenha particular cuidado de nos lugares, portos de mar de sua comarca e jurisdição tirar cada dous mezes devassa se são algumas pessoas culpadas neste caso e procedão contra ellas conforme a esta defesa, e assy mando ao douctor Paulo Coelho do meu desembargo, corregedor do civel em minha corte ou a quem o dito cargo servir que tire nesta cidade cada dous mezes a dita devasa e que huns e outros cumprão e guardem esta minha carta assy e tam inteiramente como nella se contem. Sebastião de Alfaro a fez em Lixboa a iij (3) de novembro de jbe Lxxxj (1581).

Foy publicada esta carta atraz escrita dEl Rey Nosso Senhor per mim Antonio d Aguiar que ora sirvo descrivão da chancelaria mor estandoa fazendo perante os mais officiaes della e outra muita gente que estava esperando por seus despachos em Lisboa a iiij (4) dias de novembro debe (1581).

GASPAR MALDONADO.

(Arch. nac. da T. do T., Liv. 1.° Leis e Reg. f. 71).

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Viagem do Sr. de Landreau ás ilhas dos Açores, a favor do Rei de Portugal no anno de 1582, com a derrota da armada do Snr. de Strosse, pelos hespanhoes.

(Traducção do francez)

D. Antonio Rei de Portugal, tendo enviado a França Francisco de Portugal, conde de Vimioso, seu condestavel para pedir soccorro ao Rei, fim de entrar no seu reino, occupado pelo Rei de Hespanha Philippe II, chegou ali ao mesmo tempo, que o Snr. Duque d'Anjou, Francisco de França, irmão unico de S. Magestade, organisava um exercito. para ir levantar o sitio de Cambraia posto pelo exercito hespanhol sob o commando do Duque de Parma, Alexandre Farnese, pelo que o dito conde de Vimioso se dirigio para Cambraia, movido não só peto desejo de combater o inimigo cominum. bem como obrigar deste modo Sua Alteza a tomar mais a peito a guerra que seu amo promovia. D. Antonio ignorando a causa de tanta demora do seu condestavel resolveo se a partir para França, e tendo ali visto S. M. e reclamado ajuda a favor da sua infeliz causa, perdeo as esperanças de realizar os seus desejos, em vista da alliança e amisade que ha muito existia entre os Reis de França e de Hespanha. Porem a Rainha Mãe cheia de commiseração, achando o Snr. de Strosse, então coronel de infanteria franceza, assaz disposto para emprehender a luta, usando do poder da sua authoridade, o fez de prompto resolver. Tendo-se concluido a empreza de Cambraia com gloria para S. A. e para a França, o Sur. Duque d'Anjou passou a Inglaterra deixando por governador de Cambraia o Snr. de Boligny. (?) No entretanto muitas companhias se dirigiam para embarcar em Bordeos, aonde o dito Snr. de Strosse as esperava, como general nomeado para commandar esta armada. Como porem houve demora em partir, isto deu logar ao Rei de Hespanha se precaver.

Tantas delougas desgostaram o Rei de Portugal e os seus parti darios das ilhas dos Açores, que esperavam ser atacados se não fossem soccorridos a tempo, como advertio ao Snr. de Strosse, o conde de Torres Vedras, (Manoel da Silva) logar tenente e governador por D. Antonio, na Ilha Terceira. capital dos Açores, por via do Snr. de Carlos que ali commandava quatro companhias francezas havia dezoito

mezes.

Porem a Rainha Mãe, avisada das grandes frotas que se preparavam em Sevilha e Lisboa, para ir tomar as ditas ilhas, vendo que as suas forças só tarde poderiam dar á vela, enviou ordem ao Sr. de Landereau, para a toda a pressa embarcar o seu regimento de 800 arca buzeiros. e dirigir-se na primeira monção favoravel, para a Ilha Terceira, com ordem de quando ali chegasse, obedecer em tudo ao dito

conde de Torres Vedras. Tendo o dito Landereau combinado com o Rei de Portugal o soccorro que lhe devia prestar, obteve do Snr. de Strosse a promessa de o nomear seu vice-almirante quando se reunissem, como premio da sua diligencia e de ser o primeiro a correr o risco de passar ás ilhas e de ali combater.

(não diz mais. o manuscripto.)

(Bibliot. Nac. de Paris-Fonds Français-Colbert-29-fol. 576.)

Relação da armada franceza, que foi em soccorro de D. Antonio, Rei de Portugal, e que com elle partio de Bellisle no dia 16 de junho de 1582.

(Traducção do francez)

O Senhor Philippe Strosse, general da dita armada.

O Conde de Brissac, commandante na ausencia do dito Sr. de Strosse.
O Senhor de Sainte-Soline, mestre de campo. Duas companhias.
Os capitães Dannat, Baret, Dauget, Du Rinau, cada um uma compa-
nhia, e Favelles que é capitão das companhias de Scalin.

O Senhor de Bus, mestre de Campo de nove companhias, Capitão Mon

temore.

La Broge, Dudresnay, Dumesnil, Armand Duplessis, cada um com uma companhia.

São cincoenta velas francezas, a saber: trinta nãos e vinte patachos.

Vão muitos voluntarios. Entre elles o Snr. de Fumée, com cinco nãos e quatro centos soldados, sendo uma companhia sob o seu commando, e as outras pelos capitães Touinville, Lahalle, Thomas (?) e Hurtauf.

Calcula-se que vão na dita armada mais de mil e duzentos fidalgos, por que ha companhia com trinta e quarenta, alem dos voluntarios, e de Don Antonio, do seu condestavel e d'outros senhores e fidalgos da sua comitiva.

Na totalidade de 37 companhias e 55 velas.

Mais sete navios inglezes carregados de soldados francezes, commandados pelo capitão Pardin, e um outro navio de guerra por nome Lafargue com seu patacho e canòa ás ordens do capitão Antoine Scalin, que nas Sables-d'Olonne, esperam a passagem da armada, para se reunir a ella, com os seus sete centos ou oito centos homens.

Tudo reunido, calcula-se a sua força em cinco mil homens de com

bate alem dos marinheiros, pois tem companhias de duzentos homens e as restantes de cento e tantos, alem de muitos senhores e fidalgos. que expontaneamente e fora das companhias, acompanham o dito senhor.

(Bibliot. Nac. de Paris, Fonds Français-Colbert., cod. 29, f. 578.)

Relação dos successos da armada franceza de M. de Strossy, desembarque em S. Miguel de D. Antonio, e batalha naval com o Marquez de S.a Cruz.

(Traducção do francez)

Tendo ha pouco ido á corte, ali ouvi fallar tão diversamente da viagem do Senhor de Strossy em execução da ordem de S. M. e em serviço do Sr. D. Antonio, Rei eleito de Portugal, tanto com relação á direcção da armada e desembarque na Ilha de S. Miguel, como da batalha que deu ao Marquez de Santa Cruz, general da armada hespanhola, asseverando uns que repetiam o que tinham ouvido áquelles que la estiveram, outros que eram noticias correntes, e segundo o costume geral, ultrapassavam os limites, transformando a verdade em mentira. Pensei então em escrever esta historia com toda a possivel verdade afim de fazer callar os maldizentes, e para que todos tendo conhecimento exacto dos factos, possão ajuizar se merecem louvor.

ou censura.

Aos 11 de junho de 1582, veio o Rei de Portugal encontrar a armada do Sr. de Strosse, fundeada na bahia de Belle-Isle, (4) e embarcando-se na galera, por nome a Reale, aprisionada em Nantes, foi sem demora ancorar junto ao almirante, sendo logo saudado, com repetidos tiros de canhão e d'arquabuzeria, em signal de regozijo geral pela sua chegada. Estavam todos anciosos de partir, pouco satisfeitos de consumir as comedorias inutilmente, principalmente os particulares que se tinham armado á propria custa.

Era agradavel ver como a armada estava bem disposta e dicidida a praticar algum feito brilhante, se uma occasião propicia se tivesse então offerecido. Nós esperamos ainda mais dois ou tres dias, até haver a revista pelo Sr. de Brissac, depois da qual o Rei de Portugal, com o Conde de Vimioso, seu Condestavel, embarcaram n'uma grande urca em que estava o Sr. d'Estrossi, donde no mesmo dia fizeram si

(1) E' digna de reparo a notavel coincidencia de ser de Belleisle que tem partido as duas armadas que em 1582 e em 1832 vieram aos Açores favorecer a causa dos pretendentes á coroa de Portugal.

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