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Cavado e Ancora (1), apresenta como elementos concorrentes na composição do minhoto actual uma raça brachycephala, de que abaixo fallaremos, e duas dolichocephalas (2). Destas, uma, «de estatura baixa, morena, mesopsida e mesorrhinica», é referida ao typo de Baumes-Chaudes ou Cro-Magnon, a que já Paula e Oliveira (3) referira alguns cranios prehistoricos dolichocephalos da Extremadura, e é considerada como o fundo autochtone da nossa população; outra, «de alta estatura dolichocephala, mesaticephala, dolichopsida e de nariz longo e fino, leptorrhinio, normalmente convexo, olhos claros e cabellos louros ou ruivos», é denominada nordica, identificada com o typo proto-historico gaulez, de que Paula e Oliveira (4) falla a proposito das necropoles de Alcoutão e Abujarda, nos arredores de Cascaes, e referida, por ultimo, ao typo dos Reihengraber, de Hallslatt (5).

Poder-se-hão referir a estes os dois typos dolichocephalos, que descobrimos, pelo estudo da capacidade? Vamos vêl-o.

A exiguidade craniana do dolichocephalo transmontano é testimunhada pelo pequeno valor da sua capacidade média, 1507.27-segundo observações feitas pelo dr. Ferraz de Macedo em 34 cranios de Traz-os-Montes. Quando mais não houvesse, esta simples observação, tomada á vista de considerações, que acima expendemos, faria logo suppôr que o transmontano era um typo em que a massa organica tinha um valor muito baixo, por consequencia um representante, provavelmente, dum elemento ethnico de baixa estatura, referivel talvez ao typo autochtone (Cro-Magnon, Baumes-Chaudes). Felizmente, porém, ha muitos mais elementos a que recorrer para a demonstração desta these.

Severino Marques determinou o valor da estatura média, do indice nasal medio e do indice cephalico medio, tambem, da provincia de Traz-os-Montes em 200 casos, e achou que aquella provincia era não só a provincia de Portugal que tem o indice nasal mais elevado (66.92) e um dos indices cephalicos mais baixos (75.65), como tambem a que tem a menor esta

(1) Portugalia, n.o 1, pag. 23.

(2) Portugalia, n.o 1, pag 50.

(3) Notes sur les ossements humains existants dans le musée de la commission des travaux géologiques. (Communicações da commissão dos trabalhos geologicos de Portugal, tom. n, fasc. 1, pag. 10).

(4) Antiquités préhistoriques et romaines des environs de Cascaes. (Communicações da commíssão dos trabalhos geologicos de Portugal, tom. II, fasc. 1, pag. 99).

(5) Portugalia, n.o 1, pag. 27.

tura (1633mm) do paiz. O dr. Alvaro Basto chegou, estudando as observações do dr. Ferraz de Macedo, á conclusão de que o minimo do indice cephalico se encontra na provincia de que fallamos (72.49), e de que a dolichocephalia que se manifesta nella se continúa com a das provincias hespanholas de Zamora e Leão, onde Olóriz suppõe encontrar-se mais bem conservados os elementos da antiga população peninsular (1). Finalmente, comparando a estatura, o indice cephalico e o indice nasal do transmontano, com a estatura, o indice cephalico e o indice nasal dos habitantes do cantão de Laforce (Bergerac), do districto de Riberac e do tunisiano de Ellez e Medjerdah, onde o dr. Collignon suppõe existir os representantes mais puros da raça de Cro-Mognon (2); e além destes, com o do minhoto do concelho de Ponte do Lima, em cujos valles Fonseca Cardoso encontrou menos misturado o typo dolichocephalo baixo com o typo de Cro-Magnon (Baumes-Chaudes) (3), vê-se como se póde referir a este o typo baixo dolichocephalo, mesorrhinico, de cabeça pequena do transmontano actual.

Quadro comparativo dalgumas medidas anthropometricas
do transmontano actual

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Riberac

1622 78.7

68.6

72.0

Dordogne (dr. Colli-Laforce (Bergerac)..

gnon)

Tunisia. Ellez e Medjerdah (dr. Collignon). 1634 74.

O typo dolichocephalo de cabeça pequena identifica-se, portanto, com o dolichocephalo, moreno, de baixa estatura, existente no Minho.

Identificar-se-ha, porém, o typo dolichocephalo de cabeça grande, que encontramos na Beira-Alta, com o dolichocephalo

e 232.

(1) Distribución geográfica del índice cefálico en España, pagg. 166 (2) Anthropologie de France Dordogne, 1891, pag. 57; Étude sur l'Ethnographie générale de la Tunisie, 1887. (3) Loc. cit., pag 43.

alto e loiro, que Fonseca Cardoso encontra tambem no Minho? Parece-nos que não.

A capacidade média da Beira-Alta, segundo observações feitas em 16 cranios do districto de Vizeu pelo dr. Ferraz de Macedo, é de 1596.62, a maior capacidade de Portugal. Esta conclusão, embora deduzida duma série insufficiente, conduznos a resultados perfeitamente confirmados por trabalhos anthropologicos mais completos. Attendendo, na verdade, ás considerações que utilisámos logo no principio da interpretação da pequena capacidade do transmontano, lembrando-nos de que as causas principaes das variações do volume cerebral são as variações da massa organica, deve attribuir-se o grande volume do cerebro viziense a uma grande superioridade na massa do organismo, e muito provavelmente na' estatura. O dolichocephalo da Beira-Alta tem um cranio muito maior do que o de Traz-os-Montes, naturalmente porque é muito mais alto do que este. E a razão, na verdade, parece ser esta, visto que a estatura do beirão de Vizeu é a mais alta do paiz (1674TM, segundo 100 observações de Severino Marques), emquanto que a de Traz-os-Montes é a mais pequena.

Confirmada, assim, a conclusão que deduzimos no nosso estudo da capacidade, póde-se affirmar que o dolichocephalo da Beira se distingue bem do de Traz-os-Montes pela sua estatura e pelo seu volume cerebral. Não só porém, são, estes dois caracteres aquelles a que podemos recorrer para destrinçar estes dois typos provinciaes. O indice nasal presta-se tambem a esse destrinçamento. O beirão é mais leptorrhinio do que o transmontano; tem um indice nasal medio duas unidades superiores ao daquelle (64.63, segundo 100 observações de Severino Marques).

Em uma palavra, embora o beirão tenha um indice cephalico quasi egual ao do transmontano-72.59 no cranio (dr. Ferraz de Macedo), 75.19 no vivo (Severino Marques)- é muito mais alto do que elle, tem um cranio muito mais volumoso e um indice nasal um pouco inferior.

O dolichocephalo alto de Vizeu, não parece, porém, poder identificar-se com o dolichocephalo alto efeptorrhínio do Minho, typo nordico de Fonseca Cardoso. A estatura do viziense coincide, é verdade, com a estatura média do typo proto-historico das necropoles de Alcoutão e Abujarda (gaulez de Paula e Oliveira, nordico de Fonseca Cardoso)); mas o indice ce

(1) Fonseca Cardoso, reconstituindo com as medidas de Paula e Oli

phalico daquelle é bastante inferior ao indice 79, privativo da raça dolichocephala do norte, e o seu indice nasal é, pelo contrario, muito superior ao indice nasal medio da villa de Ponte do Lima, onde Fonseca Cardoso encontra mais livre de mixtura o typo nordico-dolichocephalo, hyperleptorrhinio e loiro. Demais, não se podem attribuir estes afastamentos a um cruzamento da raça dolichocephala alta do norte com a raça dolichocephala baixa do sul, visto que é muito para notar a coincidencia do indice cephalico medio da Beira-Alta com o de Traz-os-Montes, não obstante a differença grande que existe entre a estatura, a capacidade, e, até certo ponto, o indice. nasal medio das duas provincias.

Todos estes factos nos levam á convicção de que o typo dolichocephalo alto da Beira-Alta é differente do typo nordico do Minho. Sendo assim, não deveremos antes suppôr que o beirão representa «um certo typo moreno de elevada estatura, mesorrhinio, com o mento saliente, lembrando muito o typo grande de Cro-Magnon» que Fonseca Cardoso encontrou no seio da população minhota, sem localisação definida (1)?

veira a estatura dos habitantes proto-historicos de Alcoutão e Abujarda, encontrou para estes a média 1,67, que coincide com a determinada por Severino Marques, na população actual da Beira.

(1) Oito medidas do indice facial (Diam. long. Ophryon-mento) feitas pelo sr. João Varella em cranios de Vizeu, e quatro medidas daquelle indice, feitas pelo mesmo, em quatro cranios de Traz-os-Montes, levam ao indice facial medio 108.06 para a primeira provincia e 106.64 para a segunda.

Dezesete medidas do indice orbitario feitas pelo sr. Vasco d'Oliveira em dezesete cranios de Vizeu, e quatro medidas do mesmo indice, feitas tambem por aquelle senhor em quatro cranios de Traz-os-Montes, levam aos indices medios, 85.7 para a Beira-Alta e 81.5 para Traz-os-Montes. Estas medidas mostram, além d'isso, uma grande frequencia de orbitas megasemas, na primeira destas provincias.

Estes factos, deduzidos de séries muito insufficientes, parecem mostrar uma certa desegualdade entre a forma da face e a das orbitas do transmontano e do beirão.

Poder-se-ha approximar este facto da observação de Quatrefages, que formulou a hypothese de que para a composição ethnica do nosso povo haviam concorrido dois elementos prehistoricos dolichocephalos?

O typo beirão approximar-se-ha do dolichocephalo, dolichopsida, de orbitas redondas que Quatrefages encontrou na collecção dos cranios dos nossos kjækenmoddings do Tejo e que afastou do typo de CroMagnon, a que Paula e Oliveira referia todos aquelles cranios?

Não poderia, até, esta suspeita firmar-se numa observação que Henri Martin apresentou no Congresso de Lisboa (Compte rendu, 1880, pag. 305), a proposito e logo em seguida á discussão do cranio n.o 1 de Mugem, feita por Quatrefages, dizendo: «Notei em Castella a presença de homens grandes, fortes, musculosos, ossudos, de nariz muitas vezes aquilino, tendo

Talvez. A coincidencia do indice cephalico e a approximação do indice nasal do beirão e do transmontano, inclina-nos muito para essa hypothese; mas, todavia, não queremos agora, por cautela, avançar mais.

Se, ao menos, tivessemos alguns dados sufficientes sobre a côr dos olhos e dos cabellos, ou sobre o indice facial da BeiraAlta......!

Quadro comparativo dalgumas medidas anthropometricas do transmontano actual

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Mas seja o que fôr, o que fica demonstrado, repetimos, é que existem no seio da nossa população dois elementos ethnicos dolichocephalos muito differentes na estatura e na capacidade. (Continúa).

ANTONIO AURELIO DA COSTA FERREIRA.

alguma analogia com um typo semitico exagerado, mas sem relação nenhuma com os arabes. Talvez seja representante duma raça antiga prehistorica»?

(1) Este é o valor do indice cephalico medio do concelho de Ponte do Lima, e não propria mente o da villa de Ponte do Lima. Empregamos um pelo outro, por Fonseca Cardoso só ter publicado o indice cephalico medio de todo o concelho. Notaremos, porém, que este anthropologista dá como muito frequen te no concelho referido, o indice 79, caracteristico das raças dolicho cephalas do Norte.

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