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E o rimance segue nesta suavidade de ritmo e rimas em demanda do Castelo em que Luísa vivia e na convicção de

«Que um amor contrariado

Pela ausência mais se apura...

O diálogo final entre os dois amantes tem um acentuado sabor popular e todo o poemeto mostra que a sua autora versejava com facilidade.

Transcrevemos um pequeno trecho:

LUÍSA

a Vive nobre cavaleiro,
Vive tu, que eu já vivi!
E sê tu fiel herdeiro
Dêste amor porque eu morri.
De ser freira num mosteiro
Juramento proferi.

Adeus, nobre cavaleiro,
Vive tu, que eu já vivi!

ALFERES

«Não pode o céu usurpar-me
Os direitos que adquiri,

No momento de ausentar-me
A tua fé recebi!

Nem pode êle disputar-me
O amor que tenho por ti!
Se êle quis vida guardar-me
E trazer-me agora aqui,
Foi para recompensar-me
Das penas que já sofri!

LUÍSA

«Vive, nobre cavaleiro,
Vive tu, que eu já vivi!
Adeus, nobre cavaleiro,
Vive tu... e pensa em mi.
O meu dia derradeiro
Bemdigo, porque te vi!
Adeus, caro cavaleiro,
Vive tu... que eu já morri.>>

D. Rita de Cássia Pinto Coelho consegue dar-nos a impressão de uma dessas xácaras populares que andam na tradição das povoações do norte e com que as avós encanecidas fazem o regalo das crianças nos serões, à lareira, ao crepitar da lenha e ao som monótono do rodar das dobadoiras, por essas intermináveis noites de inverno...

Não ousaremos ir mais longe em transcrições. A madrinha dedicada, a amiga queridissima e confidente sentimental de Júlio Dinis, foi também uma poetisa com notáveis qualidades, que provavelmente desaproveitou, pois tôdas estas produções devem ser dos primeiros anos da sua adolescência.

De sua irmã D. Ernesta Guilhermina Pinto Coelho também conhecemos uma pequena poesia dedicada a seu irmão, primeiro ensaio para maiores vôos que a morte em breve veio aniquilar.

De seu irmão José Joaquim Pinto Coelho, o primo e amigo dedicado de Júlio Dinis, conseguimos haver às mãos algumas poesias inéditas em que faísca o temperamento artístico da família. Produções acentuadamente românticas, mas em que se reconhecem qualidades literárias.

Entre elas há uma poesia, A pobre Marta, em que descreve a dor de uma infeliz mãe junto da filhita morta:

«Ó Deus que és protector de quem a ti se humilha

Senhor alanceado em veneranda cruz!

Não leves já êste anjo! Ai! Deixa-me esta filha!
Meu Deus, tem piedade! Escuta-me, Jesus!

«Ó! Vê nos gestos seus como ela quer, dizer-me
Que nunca a deixe só, que a ampare, grande Deus!
Pequena como é, não pode compreender-me!
Por tua Mãe bemdita, escuta os rogos meus!

«Senhor! Esta criança, a quem eu tanto quero, É tudo para mim! É luz, é vida, é fé !

Se a abraço, se a contemplo e a beijo... Emfim, venero O teu poder supremo ! Em ti minh'alma crê !»

Tem vibração, êste clamor de mãe!

Devemos ainda acrescentar que José Joaquim Pinto Coelho tem, entre as poesias que compulsamos, traduções de poetas da época, como Mamier (Chants du Nord) e outros. Entre elas há uma tradução apropriada a uma melodia de Schubert, tirada da poesia de Goethe Margarida ao tear (1) que deu título à composição musical. Era destinada a ser cantada por pessoa de família, o que mostra quanto era artístico o meio íntimo de Júlio Dinis.

Fechemos aqui esta digressão por inéditos que, não sendo pròpriamente do romancista, nos vêm mostrar como foram cultivadas e amparadas as tendências naturais do seu raro

(1) É a Margarida do Fausto. O título da poesia de Goethe é: Gretchen am Spinnerade.

temperamento artístico. Sem êsse meio familiar, não sabemos se tão alto e tão ràpidamente subiria o seu vôo!

Entre as poesias inéditas de Júlio Denis há um grupo de cartas em verso dirigidas a seu primo José Joaquim Pinto Coelho, por ocasião dos seus aniversários, que, embora íntimas, oferecem grande interêsse.

A primeira tem a data de 1859 e seguem-se ininterruptamente até 1866. Poemas ligeiros, escritos sem grandes preocupações literárias, ao correr da pena, constituem subsídios preciosos para o estudo da evolução artística e sentimental de Júlio Denis. Cartas reservadas ao convívio mútuo dos dois primos e das duas famílias Pinto Coelho e Gomes Coelho, pois todos os que lhes pertenciam e andavam naquela roda se dedicavam à poesia, não foram destinadas à publicidade. Páginas sôltas que deixam, ano a ano, as diversas modalidades do seu espírito, os vestígios das suas preocupações e das suas torturas físicas morais.

A primeira epístola (1), como êle a denomina, é escrita quando Júlio Denis ainda não tinha vinte anos. E' em verso sôlto, talvez na

(1) «Epístola a meu primo José Joaquim Pinto Júnior, no dia dos seus anos, 20 de Outubro de 1859» manuscritas.

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