Imagens das páginas
PDF
ePub

XVII

Joaquim Nabuco

(Da Academia Brasileira)

(1849-1910)

DESTINOS LITERÁRIOS DE PORTUGAL
E BRASIL

A

PRINCIPAL questão, ao fundar-se a Academia de Letras brasileira, é se vamos tender à unidade literária com Portugal. Julguei sempre estéril a tentativa de criarmos uma literatura sôbre as tradições de raças que não tiveram nenhuma; sempre pensei que a literatura brasileira tinha que sair principalmente do nosso fundo europeu. Julgo outra utopia pensarmos em que nos havemos de desenvolver literàriamente no mesmo sentido que Portugal, ou conjuntamente com êle, em tudo que não depende do génio da língua. O facto é que, falando

a mesma língua, Portugal e Brasil teem de futuro destinos literários tão profundamente divididos como são os seus destinos nacionais. Querer a unidade em tais condições seria um esforço perdido. Portugal, de-certo, nunca tomaria nada essencial ao Brasil, e a verdade é que êle tem muito pouco, de primeira mão, que lhe queiramos tomar. Uns e outros nos fornecemos de ideias, de estilo, de erudição e pontos de vista, nos fabricantes de Paris, Londres ou Berlim... A raça portuguesa, entretanto, como raça pura, tem maior resistência e guarda assim melhor o seu idioma; para essa uniformidade de língua escrita devemos tender. Devemos pôr um embaraço à deformação que é mais rápida entre nós; devemos reconhecer que êles são os donos das fontes, que as nossas empobrecem mais de-pressa, e que é preciso renová-las indo a êles. A língua é um instrumento de ideias, que pode e deve ter uma fixidez relativa; nesse ponto tudo precisamos empenhar para secundar o esforço e acompanhar os trabalhos dos que se consagram em Portugal à pureza do nosso idioma, a conservar as formas genuínas, características,

lapidárias, da sua grande época... Nesse sentido nunca virá o dia em que Herculano, Garrett e os seus sucessores, deixem de ter tôda a vassalagem brasileira. A língua há-de ficar perpètuamente pro-indiviso entre nós; a literatura, essa, tem de seguir lentamente a evolução diversa dos dois países, dos dois hemisférios. A formação da Academia de Letras é a afirmação de que, literária como politicamente, somos uma nação que tem o seu destino, seu carácter distinto, e só pode ser dirigida por si mesma, desenvolvendo a sua originalidade com os seus recursos próprios, só querendo, só aspirando à glória que possa vir de seu génio.

(Do Discurso proferido na sessão de aber

tura da Academia Brasileira de Letras, em 20 de Julho de 1897, e inserto no n. 1 da respectiva Revista, Rio, Julho de 1910, pág. 177.)

XVIII

Joaquim de Santa Rosa
de Viterbo

(1744-1822)

DIFICULDADE DO PORTUGUÊS ARCAICO

AVIA sido útil a Portugal o casamento
do Infante D. Afonso em França

H

com a Condessa de Bolonha. A larga residência, que naquele reino fizera, o instruiu a fundo na política dos Franceses, e não menos no bom gôsto das artes. Voltando dali a ser Regente ou Visitador de êste Reino, em-quanto por morte de D. Sancho II não empunhou o scetro, em tudo procurou dar provas do quanto havia adiantado na sciência de reinar, e tanto que seu filho D. Denis, primogénito e herdeiro da coroa, foi capaz de instru

.

ção, êle o proveu dos mestres mais hábeis daquele tempo.

Não eram os Portugueses desprezadores das letras. Nas Catedrais e Colegiadas mais insignes havia Mestres-escolas, a quem pertencia dar providência sôbre a instrução da mocidade: em alguns Mosteiros e Conventos se ensinavam as artes liberais, e talvez a Medicina: a Lógica de Pedro Julião, natural de Lisboa, que depois foi o Papa João XXI, é um monumento bem plausível desta verdade. Porém os que aspiravam a maior cultura saíam de Portugal e procuravam nas Universidades da Europa, alguns a liberdade, outros a sciência, que ordinàriamente se escondia aos que a invejosa pobreza acabrunhava. Concordou, pois, o Rei e a Nação em fundarem uma Universidade que, principiando em Lisboa no de 1290, depois de revoluções não pequenas, faz hoje em Coimbra a justa admiração de tôda a Europa.

Esta sem dúvida foi a época mais feliz da literatura portuguesa, pois nela se lançaram os fundamentos sólidos a tudo o que havia de ser erudição sagrada ou profana. Então foi que o dialecto por

« AnteriorContinuar »