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em virando vio que sayão daquela ilha sete ou oyto barcos á vela, & aueria deles ao nauio de Niculao coelho hua grade legoa: & os nossos que yão co Niculao coeJho derão hûa grâde grita co prazer de ver aqles barcos, & fora saluar Vasco da gama dizědo Niculao coelho. Que vos parece senhor ja esta he outra gente. E ele lhe respondeo muyto ledo, que se deixassem ir na volta do mar, pera que podessem aferrar aquela ilha donde sayrão os barcos, & que surgirião ali pera saberê que terra era, ou se acharião entre aquela gente nouas da India. E com tudo os barcos os seguião sempre capeandolhes a gête deles os esperassem. E nisto surgio Vasco da gama com os outros capitães: & tato que forão surtos chegarão os barcos a eles: & quâto mais se chegaua soauão neles atabales como q hião de festa. A gente vinha dentro era homes baços & de bos corpos, vestidos de panos dalgodão listrados & de muytas córes, hus cingidos ate o giolho, & outros sobraçados como capas: & nas cabeças fotas co viuos de seda laurados de fio douro, & trazião terçados mouriscos & adagas. Estes homes como chegarão aos nauios entrarà detro muy seguramête como q conhecerão os Portugueses, & assi couersarão logo coeles, & falauão arauia: no q se conheceo q erão mouros. Vasco da gama lhes mandou logo dar de comer : & eles comerão & bebera: & pregûtados per hu Fernão martinz q sabia arauia, que terra era ağla disserão que era hua ilha do senhorio dû grade rey q estaua a diate: & chamauase a ilha Moçãbique, pouoada de mercadores q tratauão com mouros da India, que lhe trazião prata, panos, crauo, pimenta, gengibre, aneys de prata, com muytas perlas, aljofar, & rubis. E q doutra terra qficaua atras lhe trazião ouro: & q se ele quisesse entrar pera dentro do porto q eles ho meterião, & lá veria mais largamente o lhe dezião. Ouuido isto por Vasco da gama, ouue conselho co os outros capitães q seria bo que entrassem : assi pera vere se era verdade o q aqueles mouros dizião,

como pera tomare pilotos q os guiassem dali por diante, pois os não tinhão: & q Niculao coelho fosse sondar a barra: & assi se fez. E indo ele pera êtrar foy dar na ponta da ilha, & quebrou ho leme: & quis nosso señor q assi como deu na ponta, assi tornou a sair pera o alto & não perigou: & achando que a barra era boa pera entrar foy surgir dous tiros de bésta da pouoação da ilha: que como digo se chama Moçabiq & está em quinze graos da banda do sul, & tem muy bo porto: & he abastada dos mantimêtos da terra. A pouoação he de casas palhaças, pouoada de mouros, que trataua dali pera cofala em grandes naos, & sem cuberta në pregadura, cosidas co cayro: & as velas erão desteiras de palma: & alguas trazião agulhas genuiscas, porque se região por quadrates & cartas de marear. Coestes mouros vinhão tratar mouros da India & do mar roxo, por amor do ouro q ali achauão. E quando eles virão os nossos cuydarão que erão turcos por a noticia que tinhão de Turquia pelos mouros do mar roxo: & aqueles que forão primeiro á nossa frota ho forão dizer ao çoltão, que assi chamauão ao gouernador do lugar, que ho gouernaua por el rey de Quiloa, de cujo senhorio era esta ilha.

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CAPITOLO VI.

De como ho coltão de Moçambique fez paz co Vasco da gama cuydando que fosse Turco.

Sabido pelo coltă a vida dos nossos: & como Niculao

coelho estaua surto no porto, credo q fossem turcos ou mouros doutra parte, ho foy logo ver ao nauio acõpanhado de muyta gente, & ele atauiado de panos de seda. E Niculao coelho ho recebeo cô grade hõrra: & como não auia lingoa por cujo meo se podessem falar, não fez ho çoltão muyta detença no nauio. Pore bem entedeo Niculao coelho que cuydaua ele q os nossos erão

mouros, & deulhe hû capuz vermelho de q ho çoltão não fez muyta còta, & ele deu a Niculao coelho huas cotas pretas q leuaua na mão: & isto por seguro. E quando se ouue de ir pediolhe ho seu batel pera ir nele: & ele lho deu, & mandou coele algûs dos nossos q ho çoltão leuou a sua casa, & os couidou co tamaras & outras cousas, & mâdou a Niculao coelho hùa jarra de tamaras em conserua, com a despois côuidou Vasco da gama, & seu irmão, a que ho çoltão madou logo visitar credo fossem turcos, & lhe mandou muyto refresco, & pedir liceça pera ho ir ver. E Vasco da gama lhe mandou hû presente de chapeos, marlotas vermelhas, corays, bacias de latão, cascaueis & outras cousas muytas, q segûdo disse o que lhas leuou nào teue em conta dizedo, que pera q era aquilo boỡ, que porq lhe não mandaua ezcarlata, que isso era o q queria. E co tudo foy ver Vasco da gama, que sabedo que ele auia de ir, mandou embadeirar & toldar a frota & escoder os doentes q leuaua, & passar á sua nao todos os sãos: & todos armados secretamete pera estare prestes se os mouros quisessem fazer algua treição. E estado assi chegou ho çoltão acopanhado de muyta gente & toda be atauiada de panos de seda: & tangianlhe muytas trõbetas de marfim & assi outros instromêtos. Ele era home de bo corpo & magro, leuaua vestida hûa cabaya de pano dalgodão branco, que he hûa roupa apertada no corpo: & coprida ate ho artelho: & em cima desta outra de veludo de Meca: & na cabeça hûa fota de seda de veludo de muytas cores & douro, & cingido hủ terçado rico & hua adaga: & nos pes hüas alparcas de seda. Vasco da gama ho recebeo ao portaló da nao, & dali ho leuou pera a tolda: onde se lhe desculpou de lhe não mandar ezcarlata, porq a não trazia: se não cousas q desse por matimentos quando delles teuesse necessidade. E disselhe q ya descobrir a India por mandado de hû grade rey, cujo vassalo era. E isto lhe dezia pelo lingoa Fernão martinz: & apos isto lhe mandou dar

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muy be de comer dessas conseruas & leuaua: & do vinho: & ele comeo & bebeo de boa võtade: & assi os q hião coele, q todos forão cõuidados: & mostrauão grade amor aos nossos. Ho çoltão preguntou a Vasco da gama se vinha de Turquia, porq ouuira dizer q erão bracos assi como os nossos & dizialhe que lhe mostrasse os arcos de sua terra, & os liuros de sua ley. Ele lhe disse q não era de Turquia se não dû grande reyno q confinaua coela: & q os seus arcos & armas lhe mostraria, & os liuros de sua ley não os trazia, porq no mar não tinhão necessidade deles, & mostroulhe alguas béstas com a mandou tirar. De & ho çoltão ficou espätado, assi dalguas couraças q lhe forão mostradas. E nesta vista soube Vasco da gama q dali a Calicut auia noue cetas legoas, & q lhe era necessario piloto da terra: porq auia dachar muytos baixos, & q ao logo da costa auia muytas cidades. E mais soube q ho Preste loão estaua dali löge pelo sertão: & sabedo q tinha necessidade de piloto pedio ao çoltão q lhe desse dous, porq se hû morresse ficasse outro: & ele lhos prometeo, cô condição os contêtasse. E outra vez à ho çoltão ho tornou a ver lhe leuou os dous pilotos q lhe prometeo, & éle deu a cada hủ trîta miticaes, q he hu peso douro q na terra serue por moeda, & pesa vinte hù vintes: & marlotas. E isto co condição q dağlle dia por diâte auião destar coele na nao, & quãdo quisessem ir a terra sempre ficasse hů na nao, porq auia aîda de fazer algua detença naquele porto.

CAPITOLO VII.

De como o çoltão de Moçambique quis fazer treição a Vasco da gama: & do que sucedeo sobrisso.

Feyto

eyto este concerto: auendo muyla communicação antre os nossos & os mouros vierão eles a entender que os nossos erão Christãos, pelo qual toda a amizade que tinhão coeles se lhe tornou em odio & desejo de os matarem, & de lhes tomarem as naos. E isto concertaua ho çoltão de fazer, o q quis nosso senhor que hum dos pilotos mouros descobrio a Vasco da gama sendo ho outro em terra. E sabendo ele isto, & receandose q ho posessem os mouros em afronta por sere muytos & ele ter pouca gête, não se quis mais deter, & partiose logo hu sabado dez de Março, auedo sete dias que chegara. E partido foy surgir co toda a frota junto co hua ilha q estaua em mar hua legoa da de Moçabique. E isto pera q ao domingo se dissesse missa em terra, & se confessassem & comugassem os nossos, porq despois q partira de Lisboa nuca o mais fizerão. E despois de surta a frota, vedo Vasco da gama q a tinha segura de lha não queimare os mouros q era o q tambem receaua: determinou de tornar a Moçambiq nos bateys a pedir ho piloto mouro q lhe ficaua em terra: & deixando na frota seu irmão com recado pera lhe acodir se disso teuesse necessidade, partiose leuãdo Nicolao coelho no seu batel & leuaua tabe ho outro piloto mouro. E indo assi vio vir côtrele seys barcos com muytos mouros armados darcos, frechas muyto copridas, & escudos & läças, q como virão os nossos começarão de lhes capear q se tornassem pera ho porto da vila. E ho piloto mouro dizia a Vasco da gama q querião dizer os acenos os mouros fazião. & conselhaualhe q se tornasse: porq doutra maneyra nã The auia ho çoltão de dar ho piloto que ficaua è terra: do q ele ouue grande menêcoria, parecedolhe a ho pilo

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